28/05/2020
"Gustavo Mavie não reúne qualquer qualificação para integrar Comissão de Ética"
Sociedade civil e oposição defendem que o jornalista não pode ocupar um cargo público devido à associação do seu nome a casos de corrupção. Para a ONG CCD, a proposta mostra que a FRELIMO não leva a sério a Comissão.
Em Moçambique, o partido no poder, a FRELIMO, indicou para compor o Comité Central de Ética Pública o jornalista Gustavo Mavie. O facto desencadeou revolta e incredulidade no seio, por exemplo, da sociedade civil e formações políticas, levando a RENAMO a fazer adiar no Parlamento a sua indicação. O motivo: acusações de corrupção contra Mavie.
Arnaldo Chalaua, porta-voz da bancada parlamentar do maior partido da oposição, entende que "Mavie tem uma culpa no cartório, é uma pessoa que falcatruou o Estado, esteve na AIM, e nesse sentido criou várias atrocidades, aquilo que chamamos enriquecimento ilícito. Não faz sentido que essas personalidade seja eleita pela Assembleia da República para fazer parte de um órgão extremamente importante, como a Comissão de Ética."
Aceitação parcial de culpa?
O nome de Gustavo Mavie esteve associado a má gestão dos fundos e bens da Agência de Informação de Moçambique (AIM), instituição que foi gerida pelo jornalista durante 14 anos. Contudo, não foi dado como culpado pelos ilícitos que tiveram lugar na AIM.
Mas há outras interpretações sobre o processo que não retiram Mavie da "névoa da desconfiança" em que aparentemente se encontra. E o diretor do Centro para Democracia e Desenvolvimento (CDD), Adriano Nuvunga, diz que "a indicação de Gustavo Mavie para membro da Comissão Central de Ética Pública por parte do partido FRELIMO tem duas leituras.
"A primeira é de que o senhor Gustavo não reúne qualquer qualificação pela sua postura pública. Por um lado, tem processos-crime de corrupção contra ele e [por isso] não pode ser apontado para um cargo público. Note que o Mavie foi acusado e foi dado provimento ao processo, basta que isso aconteça, ser pronunciado pelo juiz de pronúncia significa, de alguma maneira, a aceitação de metade da culpa, significando que essa pessoa não pode ser apontada para um cargo público", argumenta.
Faltou ética na gestão da coisa pública ou na pena?
A questão que os moçambicanos colocam agora é: "como pode um indivíduo alegadamente sem ética ser indicado justamente para um órgão que vela por tão nobre valor?" Mavie nega ter feito uma gestão pouco transparente ou danosa na AIM, argumentando, pelo contrário, que ela foi rigorosa.
Mas o jornalista não está somente a ser "apedrejado" por causa de uma suposta má gestão. As suas posições afincadamente pró-FRELIMO, ou anti-RENAMO, também são usadas como argumentos pelos seus contestatários para que não integre o Comité de Ética.
Por exemplo, Adriano Nuvunga, do CDD, diz que "a postura dele é de uma pessoa muito hostil ao pensamento crítico e independente sobre a governação. Ele tem se portado como o defensor do Governo da forma mais vil, o que aqui se chama de 'escovismo'. E até chega a ser jocosa a forma como o faz, nesse sentido não é uma pessoa integra."
Os seus detratores vem a proposta de indicação como uma espécie de prémio pelos "bons" serviços prestados ao regime. Mas Mavie está certo que se trata de meritocracia e defende-se: "Não é nenhum prémio, não é nada que tenha haver com isso, é o reconhecimento de um dos cidadãos, de que deve ser valorizado porque se espera dele um desempenho eficaz e transparente, um desempenho que seja a favor daquilo que se deseja que esta organização seja, de facto."
Entretanto, o desfecho da composição da Comissão Central de Ética Pública foi adiado para a próxima semana. Até lá, a polémica vai desencadeando acesos debates entre os seus defensores e opositores, como se de uma campanha política se tratasse.
Mas, no final, a vontade da maioria, a FRELIMO, vence sempre. Os protestos da oposição de nada valerão, mas a RENAMO diz, através do seu porta-voz de bancada, que "fica claro e é inequívoco que praticamente este partido [FRELIMO] está a usar a sua maioria para perpetuar atos nocivos a convivência democrática - e nocivos a princípios da ética e moral. E ficará escrito nos anais da história desta República."
DW – 28.05.2020
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