14/04/2020
A primeira batalha contra a insurgência começa quando o Estado perde a confiança com órgãos de comunicação social e o público e cidadãos no geral. Isto acontece quando as instituições de que se espera que digam algo, se fecham em copas.
Existe muita coisa que os moçambicanos comuns não entendem ainda, começando pela natureza dessa insurgência. É normalíssimo.
Sem amanteigar, estamos perante um comportamento estranho por parte do Estado, caracterizado pela falta de comunicação estratégica que há muito lesa a credibilidade do estado e coloca-lhe num risco reputacional muito alto.
E com relação a insurgência, nesta República, a única pessoa que tem comunicado sobre os insurgentes é o Presidente Filipe Nyusi.
- É o presidente que, durante as visitas presidenciais na região nortenha de Moçambique dialoga com as massas e as encoraja a serem vigiantes;
• É o presidente da República que fala com a juventude sobre a necessidade de não serem enganados com promessas falsas;
• É o Presidente que dialoga com as forças da defesa e segurança e lhes encoraja a continuar na sua missão.
Em situações graves, como assalto a sedes distritais por mercenários insurgentes, aparecem os porta-vozes normais a darem um informe normal, como se de mais um acidente de viação tratasse. O estranho está aí e é aí onde deve mudar. Não podemos ter um Presidente da República a assumir papel de porta-voz de seus subalternos. É inadmissível.
Agora que estamos em estado de emergência e com limitações de movimentos, o Presidente da República não pode ir ao teatro operacional norte. E, por conta disso, não temos reportagens sobre o que está a acontecer lá! Até quando as coisas continuarão a ser assim?
O PROBLEMA DAS FONTES E DA CREDIBILIDADE
Em toda comunicação, e principalmente em comunicação de crise, a fonte conta. E a credibilidade da fonte é fundamental. Não pode um general vir ao público dizer “estamos a cortar a linha logística do inimigo” para duas semanas depois, Mocímboa da Praia ser atacado. A próxima vez que disser a verdade, dificilmente será levado a sério.
Ora, este problema não se resolve fechando-se em copas. Resolve-se através da conscientização dos cidadãos sobre quão sério é o assunto e preparando-os para uma guerra de longa duração pois, não se trata de pessoas sem rosto, mas de pessoas cujos objectivos tolhem com cada um de nós como moçambicanos, com a nossa independência e soberania, com o nosso futuro, como moçambicanos e como nação.
E é por isso importante ampliar a compreensão de cada moçambicano sobre o que está a acontecer em Cabo Delgado.
- A insurgência é um tipo de acção armada diferente da de guerras civis como a que a Renamo moveu durante os 16 anos.
2. A insurgência é algo imposto do exterior de Moçambique, apesar de a médio prazo, tomar matizes locais. Não nasceu de dentro. Por isso o seu combate será difícil e de longa duração.
3. A insurgência não se combate apenas com armas. Essa é uma parte da solução. O investimento deverá também incluir a necessidade de tornar as comunidades mais resilientes à radicalização. É papel do Estado assegurar que tal aconteça, mas também da sociedade civil, incluindo as religiões.
4. A par da frente militar, é importante quebrar a logística, comunicações e novos recrutamentos. Aqui, o cidadão tem um papel importante. A sua vigilância pode ajudar na sabotagem do tráfico de armas, víveres ou novos recrutamentos. O sector da educação pode adaptar os curricula nas zonas sob influência dos insurgentes para abordar o problema da radicalização, etc.
DA INTERSECTORIALIDADE
As coisas não irão melhorar no norte de Moçambique se continuarmos com a mesma perspectiva minimalista e departamentalista da insurgência. É chegado o momento de mobilizar todos os sectores do Estado para adaptarem seus planos de acção para 2020 tendo na insurgência, seu foco.
As coisas não irão melhorar no norte de Moçambique se continuarmos com a mesma perspectiva minimalista e departamentalista da insurgência. É chegado o momento de mobilizar todos os sectores do Estado para adaptarem seus planos de acção para 2020 tendo na insurgência, seu foco.
Estou a pensar, por exemplo, em sectores como pescas, educação, saúde, justiça, administração pública, recursos minerais e porque não, economia e finanças trazerem um plano conjunto de apoio ao sector de defesa e segurança no quadro do Plano Economico e Social 2020.
O estado deve agir à SEMELHANÇA de como um corpo humano age quando está sendo agredido. E não como uma aldeia de silos.
PS: Se forem a ver, tratei de vários assuntos, algo desconexos, mas todas versando sobre um assunto. Julgo que devia ser assim também com o nosso Estado. Pensar, por exemplo, como a cultura e turismo podem contribuir para debelar os focos de insurgência. E podem. Mas para tal, a abordagem deve ser ampla, integrada e multissectorial.
GLOSSÁRIO
Intersectorialidade - trata-se de mecanismos de gestão e integração de acções, saberes e esforços de diferentes sectores da política pública, com o objectivo de construir objectos comuns de intervenção entre eles, para o enfrentamento mais articulado dos problemas sociais, económicos ou políticos.
Intersectorialidade - trata-se de mecanismos de gestão e integração de acções, saberes e esforços de diferentes sectores da política pública, com o objectivo de construir objectos comuns de intervenção entre eles, para o enfrentamento mais articulado dos problemas sociais, económicos ou políticos.
NOTA: “Agora que estamos em estado de emergência e com limitações de movimentos, o Presidente da República não pode ir ao teatro operacional norte.” Como assim? Este domingo esteve na Praia das Chocas, via Nacala.
Fernando Gil
MACUA DE MOÇAMBIQUE
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