quarta-feira, 15 de agosto de 2018
A Anadarko se fecha em copas
A multinacional norte-americana, Anadarko, respondeu ontem às minhas questões relativamente ao facto de ter-se permitido transportar num voo por si fretado um membro do executivo (Max Tonela) e dois altos oficiais do Governo, nomeadamente Carlos Zacarias (PCA do regulador das extractivas INP) e Omar Mithá (PCA da petrolífera estatal ENH). A resposta, recebida por email foi bastante lacônica e não atendia especificamente às questões enviadas entre domingo e segunda-feira para John Christiansen, o Vice-Presidente da Anadarko para Comunicações. Eis o texto ontem recebido, através de um funcionário das operações em Moçambique:
A multinacional norte-americana, Anadarko, respondeu ontem às minhas questões relativamente ao facto de ter-se permitido transportar num voo por si fretado um membro do executivo (Max Tonela) e dois altos oficiais do Governo, nomeadamente Carlos Zacarias (PCA do regulador das extractivas INP) e Omar Mithá (PCA da petrolífera estatal ENH). A resposta, recebida por email foi bastante lacônica e não atendia especificamente às questões enviadas entre domingo e segunda-feira para John Christiansen, o Vice-Presidente da Anadarko para Comunicações. Eis o texto ontem recebido, através de um funcionário das operações em Moçambique:
“We are committed to abiding by our own Code of Conduct as well as the requirements of the FCPA, and all other applicable anti-corruption laws, in the conduct of our business transactions in Mozambique and elsewhere. This was certainly the case in the context of the Local Opportunities Seminar in Pemba last week. We are committed to working with the Government and all relevant stakeholders to deliver a successful project in Mozambique".
Tradução:
“Estamos comprometidos em cumprir nosso próprio Código de Conduta, bem como os requisitos do FCPA e todas as outras leis anticorrupção aplicáveis, na condução de nossas transações comerciais em Moçambique e em outros lugares. Este foi certamente o caso no contexto do Seminário sobre Oportunidades Locais em Pemba na semana passada. Estamos empenhados em trabalhar com o Governo e todas as partes interessadas relevantes para entregar um projeto de sucesso em Moçambique".
Esta é resposta lacónica, a Anadarko se furtando a responder. Eis as perguntas colocadas:
▪ Porquê a Anadarko ofereceu a viagem ao Ministro Tonela e aos CEOs da ENH e INP?
▪ O caso moçambicano não é o de um país em conflito e existe uma linha área nacional que faz ligações seguras de Maputo a Pemba, de tal modo que outros membros do Governo viajaram na companhia local. Ou seja, havia uma alternativa.
▪ Ao viajar em voo pago pela Anadarko. o nosso Ministro terá incorrido na violação da Lei da Probidade Pública. Porquê Anadarko induziu essa violação de ética?
▪ Concorda que, oferecendo tal viagem, a Anadarko estava a violar flagrantemente o seu Código de Conduta e as boas práticas internacionais? Se não concorda, explique porquê.
▪ Concorda que a Anadarko agiu violando o Foreign Corruption Practice Act (FCPA)?
▪ A Anadarko vai continuar a oferecer viagens a governantes e altos oficiais do Governo moçambicano?
▪ Porquê a Anadarko ofereceu a viagem ao Ministro Tonela e aos CEOs da ENH e INP?
▪ O caso moçambicano não é o de um país em conflito e existe uma linha área nacional que faz ligações seguras de Maputo a Pemba, de tal modo que outros membros do Governo viajaram na companhia local. Ou seja, havia uma alternativa.
▪ Ao viajar em voo pago pela Anadarko. o nosso Ministro terá incorrido na violação da Lei da Probidade Pública. Porquê Anadarko induziu essa violação de ética?
▪ Concorda que, oferecendo tal viagem, a Anadarko estava a violar flagrantemente o seu Código de Conduta e as boas práticas internacionais? Se não concorda, explique porquê.
▪ Concorda que a Anadarko agiu violando o Foreign Corruption Practice Act (FCPA)?
▪ A Anadarko vai continuar a oferecer viagens a governantes e altos oficiais do Governo moçambicano?
Na noite de segunda feira, depois de dois emails enviados no domingo sem resposta para o VP para LNG Mitch Ingram, telefonei duas vezes para o sala de Christiansen, na sede da Anadarko em Woodlands, Houston, no Texas. Ele estava ausente da sala mas deixei mensagem no gravador de voz. Enfatizei que suas respostas eram urgentes para eu completar meu artigo. Na madrugada de ontem (horas de Maputo), chegou-me a primeira reacção oficial de Houston: "We have received your inquiry and are currently working to respond to you by close of business, Houston time, tomorrow. Helen Wells. Communications Manager". Esfreguei as mãos de contente porque tinha recebido promessa de uma resposta cabal às minhas questões. Estava enganado! A Anadarko decidira fechar-se em copas. Ontem à noite ainda procurei insistir, mas nada mudou.
É óbvio que a Anardako não iria admitir a um jornalista moçambicano que tinha violado o seu próprio Código de Conduta e eventualmente o FCPA. Qualquer comunicação corporativa a este respeito, com admissão de culpa, deve ser, por regra, repassada também aos accionistas e as repercussões em bolsa seriam desastrosas. Um facto parece, no entanto, incontornável: a Anadarko terá violado seu próprio Código de Conduta.
Em 10 de Abril de 2012, a Anadarko aprovou seu instrumento de auto-regulação em matéria de anti-corrupçâo. Chama-se "Manual de Conformidade para o Combate à Corrupção". O Manual é um conjunto de princípios de ética e boa governação corporativa e procura guiar seus funcionários a todos os níveis para que actuem dentro dos limites permitidos pelo U.S. Foreign Corrupt Practices Act “FCPA” e pelo UK Bribery Act 2010. No extenso Manual tem uma secção dedicada às FAQs (Perguntas Frequentes). O ponto 14 dessa seccao 'e o mais relevante para a situação das viagens ofertadas em Mocambique. Ele pergunta e responde da seguinte forma:
"PERGUNTA>Por vezes, ouve-se dizer que as outras empresas pagam ajudas de custo e viagens a Funcionários Públicos Estrangeiros que não estamos autorizados a pagar. Porque temos de cumprir padrões mais exigentes do que os outros?
RESPOSTA>Anadarko está empenhada em cumprir as Leis de Combate à Corrupção, e espera que os seus funcionários e representantes observem estritamente as suas políticas e procedimentos em matéria de combate à corrupção. Os nossos actos nunca serão ditados por aquilo que os outros fazem. Temos de respeitar sempre os nossos Valores Essenciais, o nosso Código de Ética e Conduta Comercial, as nossas políticas e procedimentos de combate à corrupção e todas as leis aplicáveis, incluindo as Leis de Combate à Corrupção".
Por outras palavras, a Anadarko se atribui a si mesma altos standards de ética que, no caso vertente, terão sido violados em Moçambique. O apuramento desta questão não ficou esgotado com a sua lacônica resposta. Whistleblowers e ativistas do jornalismo investigativo nos EUA como o The Intercept e o Center for Public Integrity, de Nova Iorque, (este último inspirou a idealização do nosso Centro de Integridade Pública) serão contactos para fazerem o follow up na exposição de uma prática anti-ética de uma multinacional em Moçambique e na busca de uma explicação cabal.
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