"Deus criou as pessoas para amarmos e as coisas para usarmos, porque então amamos as coisas e usamos as pessoas?"



sexta-feira, 24 de agosto de 2018

Porque a Renamo se lamenta?



Tenho vindo a assistir a pior estupidez humana nestes dias. Por estupidez entendo a irracionalidade total humana, filosoficamente diria ilogicidade de acção. Acção infantil e acéfala. Vemos juristas a desfilarem as suas classes numa hermenêutica jurídica tentando demonstrar cada um quem é o melhor intérprete da lei eleitoral do Estado Civil moçambicano.  

Como pretendem os nossos juristas interpretar a lei se nao existe um  Estado Civil? Moçambique ainda não acedeu  ao estatuto do Estado Civil. Não precisa ser tão inteligente ou estudar filosofia pra se aperceber da ilogicidade do Estado natural (primitivo) que Moçambique ainda é (e vai ser se não for imposto mudança).

Na acepção filosófica da justificação e origem dos Estados modernos John Locke, Jean Jacques Rousseau, Thomas Hobbes  distinguem dois tipos de Estados. O Estado Natural (primitivo) e o Estado Civil. Os Estados modernos que são civis nascem do abandono do Estado Primitivo (selvagem) por impossibilidade de vivência e sobrevivência  dos seres humanos em partilhar os mesmos espaços públicos.
O Estado Selvagem tem suas carateristicas proprias. Aí reina o caos, guerras, egoísmos e interesse próprio.  Cada um impõe a lei do mais forte.  Cada indivíduo no Estado primitivo ou selvagem é juiz da sua propria causa. Prevalece a supremacia da lei da força numa clara lógica de felinos que se impõe e aplicam os seus golpes as vítimas não pela razão mas pela força.

Os Estados Unidos da América quando queriam declarar a sua Independência e entrar no estado moderno recordaram-se do filósofo inglês John Locke, das as suas acepções filosóficas de construção do Estado Civil moderno, livre de guerras, caos próprio de Estado Selvagem.
O terceiro Presidente americano Thomas Jefferson, o mentor da declaração da independência dos Estados Unidos, fez tesouro do famoso livro "Dois Tratado sobre Governo Civil" de Locke quase copiado a letra.
Locke considera que todos os individuos nascem livres e iguais. A condicao de liberdade e de igualdade natural em si importante, mas tras consigo grandes problemas sociais na medida em que nao havendo instituições imparciais que imponham a justica cada indivíduo é levado a ser juiz da propria causa. Nascem as injustiças.
Um Estado que não tenha instituições imparciais deve considerar-se ainda ao nível da Natureza ou seja Estado Primitivo.

Para a passagem do Estado Natural (primitivo) ao Estado Civil (Estado de direito e democrático) recomenda Locke, o primeiro grande acto é impedir que os indivíduos sejam "juízes de suas próprias causas" e instituir uma entidade totalmente independente (Estado Civil), uma entidade impessoal pra servir de médium que imponha a justica.

Em poucas palavras diríamos que as instituições do Estado Civil devem ser independentes e autônomos do partido e dos partidos políticos.
Não deve existir a identidade entre o partido e o Estado. Nenhuma entidade deve apropriar- se do Estado. Um partido no poder é simplesmente um gestor do Estado (como empresa) sem ser por isso o dono do Estado (o dono da empresa). O estado deve continuar a ser impessoal, neutro e totalmente independente de apropriação e hegemonia partidária.

Voltando a teoria lockiana da construcao do estado moderno, vê-se categoricamente a proibição de um implicado seja ele mesmo juiz da sua causa 

A Frelimo julgou a sua própria causa e como óbvio favoreceu a si mesmo.
Porque a CNE é partidarizada? A Frelimo não é irracional. Irracionais são todos mocambicanos que criaram ou deixaram criar instituições do Estado partidarizados.

O que a Renamo ou os moçambicanos em geral podem esperar da deliberação de uma instituição partidarizada?

A Renamo desde 1994 até hoje está a choramingar. Deviam sim chorar aquando da instituição da CNE partidarizada. Recusar a pra juntos e com todas forças está CNE em 1992.

O que pode-se esperar de um Estado partidarizando? Que justiça pode-se esperar se quem julga está interessado na sentença?
O sociólogo alemão Max Webber na análise das dinâmicas dos partidos teve a dizer que o grande objectivo dos partidos políticos é o poder. Os partidos farão de tudo com ou sem razão pra alcançar o poder. Este é objectivo de qualquer e todo tipo de partido político. Nesta acepção a Frelimo tem razão quando pretende o controle total do poder.

Único jurista do ponto de vista hermenêutico tentou interpretar a lei foi Teodoro Waty, teve a dizer que as deliberações da CNE são de carácter partidário.

A pergunta que se faz é porquê a CNE é partidarizada? Ou melhor o que o Estado moçambicano é totalmente partidarizado? O que os moçambicano ganham com isso? Guerras mais guerras, conflitos em incubação...a espera do melhor momento pra explodir.
Único a ganhar num Estado partidarizado é o partido no poder porque mantém o controle total do poder e impõe como num Estado Primitivo a sua lei, a lei da força. Um Estado partidarizado tem a mesma Valencia do Estado-partido onde o Estado se identifica com partido (marxismo-leninismo).

Quanto a sentenca da CNE, irracionalmente dirão que a Renamo pode recorrer mais tarde ao Conselho Constitucional. Se o Estado é partidarizado não existirão instituições do Estado mas da Frelimo. Numa disputa de poder entre a Frelimo e a Renamo não existe o terceiro (Estado) que possa aplicar a justica.

Aqui está a grande irracionalidade. A irracionalidade nasce, exactamente, como referido acima, a Renamo vai  recorrer aos órgãos da Frelimo pra obter a justiça.

Lá no CC quem nomeia o Presidente do Conselho Constitucional é o presidente do  partido frelimo. O que a Renamo vai esperar?

Todos nós somos irracionais porque de uma sentença previsível esperamos a outra imprevisível.

Houve espaço pra mudar o cenário moçambicana ou seja passar do monopartudarusmo ou hegemonia partidária pra um Estado de Direito Democrático e a maior culpa disso é a própria Renamo.

A Renamo teve duas grandes oportunidades de transformar o Estado moçambicano em Estado de direito e democrático. Com Locke diríamos em Estado Civil. Nenhuma das oportunidades ela aproveitou. Talvez não venha a te-las de novo, nunca mais e com a entrega das armas poder-se-a game over.

Os direitos são conquistados e não se dão e nunca de bandeja.

A primeira grande oportunidade que a Renamo teve foi nos Acordos de Roma diante da comunidade internacional. Nas negociações de Roma tal como agora a Renamo insiste no que é menos importante: a descentralização.  A descentralização não transforma nenhum estado em Estado Civil  (Estado de direito e democratico). A descentralização evocada pela Renamo é uma espécie de partilha de poder com indicação dos seus governadores.

A segunda grande oportunidade são os recentes consensos entre o líder da Renamo Afonso Dlhakama e o presidente Nyusi. Tal como em Roma a Renamo volta a insistir em descentralização no lugar de insistir em despartidarização do Estado.
Estas duas oportunidades tiveram lugar porque a Renamo teve em sua posse os meios bélicos (armas). Agora que as vai entregar não pode esperar outro cenário alem do que está a acontecer.
O professor Gilles Sistac, enquanto constitucionalista, deixou por escrito importantes dicas sobre  despartidarização do Estado.
A Renamo nao pode chorar porque quando a CNE se partidarizava e constituia a maioria dos assentos com membro do partido Frelimo estava presente. Desde 1994 a CNE tem esta composição indemocratica ou seja partidarizada.

O Conselho Constitucional também este um órgão partidarizado. O seu presidente como disse acima é nomeado pelo presidente do partido. A recorrência da Renamo só pode ter resultado diferente só e somente só se houver desentendimento ou desavença no seio do partido Frelimo.
Um Estado despartidarizado e democrático, como observa o filósofo jurista Norberto Bobbio, é a condição da Paz duradoura e permanente.
Viva a democracia

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