"Deus criou as pessoas para amarmos e as coisas para usarmos, porque então amamos as coisas e usamos as pessoas?"



sábado, 5 de dezembro de 2020

 

Trump tramou-se!

Por Edwin Hounnou 

Os governos africanos e o governo do partido Frelimo deveriam aprender como se deve conduzir um processo eleitoral sem mácula – sem violência policial, sem manipulação dos resultados pelos órgãos eleitorais e, sobretudo, sem a intromissão da polícia secreta para intimidar eleitores. 

A democracia norte-americana ensina-nos que o presidente não é o proprietário das instituições públicas nem dos órgãos que tutelam os processos eleitorais. Não manda nos tribunais nem no conselho constitucional, como acontece entre nós. Nos Estados Unidos não há GD's nem grupos de vigilância que  vão de casa em casa  registar os números dos cartões de eleitor para infundir medo em quem pensar votar na oposição. Nem há aqueles mentiroso que andam a dizer que na cabine de voto há câmara de vigilância para denunciar quem não vota  no partido governamental.

O presidente norte-americano não tem poderes para enviar polícias a fim de esmagar os manifestantes dos partidos concorrentes nem de mandar introduzir urnas com votos assinalados a seu favor. Não se  socorre dos professores do estado para vigiar o seu voto nem das autoridades locais com o aviso de que “se não desempenharem bem a vossa missão, correm o risco de perder o emprego ou serem transferidos para terras longínquas", ameaçam frelimistas aos funcionários do Estado, dando a entender que o Estado é Frelimo. 

Nos Estados Unidos, não se faz trocas de urnas votos reais com outras que contêm votos falsos para facilitar vitória retumbante e sufocante de uns. Donald Trump sabe que isso não fez. Ninguém se sente intimidado pelas ameaças do presidente Trump porque, nos Estados Unidos, as instituições são mais fortes que os seus líderes. 

A lei prevalece sobre todos os cidadãos norte-americanos. Ninguém está acima nem sobre a lei. É isso que faz em qualquer democracia consolidada que deixa os cidadãos orgulhosos do seu país. A lei é igual para todos os norte-americanos, enquanto entre nós,  todos os cidadãos são iguais perante a lei e isso permite que alguns sejam sejam mais importantes que as instituições. As instituições norte-americanas são fortes e não se deixam abalar por um conto de fada de quem quer que seja e a derrota de Trump é irreversível. Vai para a cova que ele abriu com suas políticas de hostilidade. O voto do povo norte-americano conta para decidir quem vence uma eleição enquanto o voto do moçambicano é de faz-de-conta. Quem faz ganhar ou perder são os órgãos eleitorais.

Trump descaracterizou o sistema norte-americano e finalizou os Estados Unidos com uma arrogância desmedida e o povo lhe deu o devido troco : empurrando-o para fora da Casa Branca. Não respeitou os convênios internacionais e com as suas políticas abalou a União Europeia, mandou retirar os Estados Unidos da Organização Mundial da Saúde e afastou a candidata nigeriana, Ngozi Okonjo-Iweala na liderança da Organização Mundial do Comércio, debilitado as Nações Unidas. Trump incendiou as relações comerciais com a República Popular da China, sem motivos que o justifique.

Os ditadores de vários países viam em Trump um aliado para os seus atropelos à boa convivência política. Muitos ditadores africanos forçaram os parlamentos dos seus países a introduzir emendas constitucionais que lhes pudessem permitir a um terceiro mandato presidencial, por contarem, em caso de necessidade, de apoios da administração de Trump. Ele era a fonte de inspiração dos desordeiros e zargateiros do mundo inteiro. Trump comprou inimigos por todos os cantos da terra. Marchava contra a História da Humanidade, por isso, caiu no precipício que, com as suas acções, abriu.

Em nenhum outro momento na história dos Estados Unidos, depois da abolição formal da segregação racial e da  escravatura, as tensões raciais atingiram níveis tão alarmantes e preocupantes quanto ao que está a acontecer. As vergonhosas ataques racistas, em particular, levados a cabo por agentes policiais contra os cidadãos afro-americanos fizeram levantar a voz não só dos americanos sensatos como cidadãos de todos os países do mundo.

As práticas racistas abraçadas por Trump são intoleráveis venham elas de onde vierem. Os seus protagonistas ou mentores acabam sendo punidos pela sociedade e pelo mundo inteiro. Com Trump na chefia da administração norte-americana, a civilização humana parecia ter regredido em vários séculos. O intensificar de agressões e de assassinatos brutais de cidadãos afro-americanos pelo simples facto da cor da sua pele era arrepiante. 

O presidente da nação mais forte do mundo não teve apoio de ninguém nem mesmo do seu secretário de Defesa, Mark Esper, que se recusou cumprir as ordens que recebeu do seu chefe de estado, para que destacasse forças a fim de irem esmagar as manifestações. Andava tão errado que havia perdido autoridade dos seus colaboradores directos que já não viam nele uma autoridade respeitável. Não há maior vergonha que se compare com a recusa do ministro da Defesa de cumprir ordens ilegais do seu presidente. 

Trump caiu na cova da humilhação que ele, ao longo dos quatro anos, abriu. De modo geral, os presidentes norte-americanos fazem dois mandatos de quatro anos cada mas  Trump  “desconseguiu” fazer o segundo porque a maioria dos cidadãos norte-americanos já não o queria como  seu líder . É assim como as coisas funcionam em democracia real : só  fica no poder quem tiver o maior número de votos e não o esperto que solta a polícia para achincalhar o opositor.

Endereçados as nossas felicitações ao povo dos Estados Unidos por terem construído uma nação democrática e forte que escolhe os seus dirigentes sem medo nem coacção. O povo moçambicano não tem a mesma sorte, fundamentalmente,  nem coragem de agir de igual modo. Os moçambicanos assistem, impávidos e serenos, a dança de governantes corruptos e fraudulentos de eleição em eleição. Na nossa terra, os corruptos se rendem no poder, sinal de que o voto não têm nenhum significado. Nos Estados Unidos, o voto maioritário serve para confirmar quem prossegue no comando.

Em Moçambique, todos os votos servem para legitimar a quem esteja no poder. Somos dos poucos países do mundo onde o voto não tem significado. Os actos eleitorais servem para mostrar ao Ocidente que  somos democráticos e assim recebemos ajudas do mundo “civilizado", que mantém os nossos gatunos nno poder, tenham sido votados ou não.  As eleições, em democracia, são uma importante arma para o  povo combater os corruptos e indignos na gestão da coisa pública e um instrumento na promoção da paz.

No nosso país, a polícia, os tribunais, os órgãos eleitorais, os professores, os enfermeiros e todo o funcionário público é obrigado a apoiar o partido no poder. Os empresários, os que “vencem” os concursos públicos para prestação de serviço ao Estado ou fornecimento de bens, são todos partido no poder ou com ele têm afinidade. As minas, os recursos minerais, os grandes negócios pertencem aos militantes s do partido no poder. Eis a razão dos conflitos por que temos passado. 

Entre nós, perder uma eleição é perder tudo. Ganhar  uma eleição é ficar com o  Estado. É ficar com os órgãos eleitorais, com a FIR/UIR e com os tribunais. É ficar com a possibilidades de ser rico de noite para dia. Perder uma eleição é tramar-se. O “vencedor” não apela aos “vencidos” que somos todos moçambicanos, vamos construir o país. Porem, só ouvimos dizer que “Chegou a nossa vez, portanto, vamos comer!". O que conta é roubar, comer e encher o bandulho e a . agenda do país fica para um dia qualquer. Para eles, agora é tempo de fazer dinheiro e muito dinheiro porque ser poder é o mesmo que ter o direito de comer de graça.

CANAL DE MOÇAMBIQUE – 02.12.2020

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