18/03/2019
Centelha por Viriato Caetano Dias (viriatocaetanodias@gmail.com)
Da boca que chora não sai boas palavras. Makuta Nkondo, jornalista e político angolano
Na véspera da minha despedida do Zóbuè, onde permaneci durante duas semanas, conversei com o velho Zumbulani (tradução livre de: “revelai-vos”). O cerne do debate era a situação geral do país que, no entender do meu interlocutor, não está saudável.
Para o velho Zumbulani, uma pessoa pode até suportar o peso da pobreza, mas nunca engolir as pílulas amargas da injustiça. É a injustiça que fermenta a “massa” das manifestações, causadoras da instabilidade e dos conflitos sociais marcantes. Para ele, o modelo de desenvolvimento do país é injusto, porque não promove o crescimento abrangente nem a diversificação económica.
Acutilante e por vezes irónico nas suas abordagens, o velho Zumbulani diz que a ideia da criação de riqueza foi mal “encaixada” e precipitada, porque muitas pessoas apressaram-se (e ainda se apressam) em desenvolver e requintar habilidades da corrupção. O “cabritismo de conveniência” criou teias de corrupção difíceis de combater feroz e energicamente.
O perigo disso não é a institucionalização da corrupção que pode ser varrida através de um conjunto de leis, mas sim a enraização da mesma. Que ninguém se deixe enganar: a desraização da corrupção leva sempre o dobro dos anos que a corrupção levou. Não há tempo que apague as sequelas da corrupção. A corrupção enraizada não acaba com a prisão nem a morte do corrupto.
Uma das injustiças que mais orbitam na cabeça do velho Zumbulani é a de ter dirigentes que não percebem nada de desenvolvimento, o que faz com que o povo carregue o fardo das suas incapacidades de formular políticas coerentes. De olhar fixo para os céus do Zóbuè, em busca de qualquer resposta, o velho Zumbulani colou-me às seguintes questões:
- Como criar riquezas sem fábricas e sem indústrias transformadoras (as únicas que temos são de bebidas alcoólicas)?
- Como é que um país pobre como Moçambique almeja o desenvolvimento quando baixa os preços de bebidas alcoólicas e sobe vertiginosamente os preços dos serviços básicos (água e electricidade)?
- Como desenvolver um país onde as crianças conhecem melhor as funcionalidades dos telemóveis que a importância de plantio de uma árvore.
- Como desenvolver um país sem escolas e educação de qualidade?
- Como desenvolver um país de reuniões (não confunda com debates) intermináveis e sem soluções à vista?
- Como desenvolver um país onde a qualidade de alunos da escola primária e da universidade é a mesma? Aliás, ambos usam a mesma sala, a mesma carteira, o mesmo curriculum e têm o mesmo professor!
- Como desenvolver um país onde as igrejas, que nascem como cogumelos em tempo chuvoso, transformaram-se em bazares da fé?
- Como desenvolver um país com insurgentes que aterrorizam, roubam, matam e destroem?
- Como desenvolver um país com um Parlamento disfuncional e letárgico? Sabe, amigo Viriato “o Parlamento não debate Moçambique e parece, enfim, uma sinagoga para uns, uma cabana à beira mar para fazer a sesta, para outros).
- Como desenvolver um país onde as pessoas perderam o espírito solidário? Os músicos, por exemplo, já não cantam gratuitamente a favor das vítimas dos desastres naturais e dos direitos humanos. O vil metal tomou conta da sociedade, meu amigo Dias.
Para encerrar, resta dizer que o velho Zumbulani prometeu, em breve, lançar suas memórias.
Zicomo (obrigado) e um abraço nhúngue aos camponeses do Zóbuè, pelos quilos que ganhei.
WAMPHULA FAX – 18.03.2019
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