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quinta-feira, 26 de maio de 2016

O que ganham o FMI e o Banco Mundial em emprestar o seu dinheiro a Moçambique?

 
 
 
Tema de Fundo - Tema de Fundo
Escrito por Adérito Caldeira  em 26 Maio 2016
Foto de Adérito CaldeiraUma missão do Fundo Monetário Internacional(FMI) está a caminho de Moçambique em Junho, após suspender no mês passado o seu apoio financeiro devido aos empréstimos da Proindicus e da MAM que o Governo tentou esconder. Mas o que parece ser uma notícia menos má é problematizada por João José Uthui, afinal o que é que as chamadas instituições de Bretton Woods, o FMI e o Banco Mundial(BM), ganham em emprestar-nos o seu dinheiro? De onde vem esse dinheiro? “Retiram daqui”, através de “modelos económicos desenhados para perpetuar a dependência”, esclarece o professor universitário.
“O pensamento lógico é que não há investimento para não se ganhar nada” começa por explanar o nosso entrevistado, que é Conselheiro do Grupo Moçambicano da Dívida, quando questionado sobre que benefícios obtêm o FMI e o BM quando colocam os seus fundos, muitos deles a título de doação ou empréstimos com juros bonificados, à disposição de vários Países do globo.
Sem querer dar uma resposta cabal João Uthui faz uma analogia a relação entre um pai e os seus filhos, “para o meu filho não olho a quantidade de dinheiro, tempo e esforço mental que eu invisto, nem interessa o lucro, basta que eu tenha garantia que ele vai crescer e desenvolver posso morrer”.
Porém Uthui clarifica que o “FMI não é o nosso pai”, e explica que a partida estas instituições, chamadas de Bretton Woods – em alusão ao local onde em 1944 decorreu a conferência onde foram estabelecidas as directrizes para uma nova ordem económica internacional sob a hegemonia do dólar norte-americano e que culminou com a criação de duas instituições voltadas para tentar alcançar esse propósito, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento ou Banco Mundial -, são financiadas pelos seus membros, que são vários Estados existentes no globo. Contudo estas instituições financeiras assumiram “um outro nível, um nível de hegemonia política”.
“Onde elas (FMI e BM) se implantam têm força de impor inclusivamente o tipo de Presidente que está lá, mas não é porque esse governante vai favorece-los, há-de abrir caminhos para eles explorarem o lado financeiro que eles querem. Então é melhor pormos ali aquele Presidente, dar-mos mordomias que ele próprio não porque sabemos que quando ele abrir o mercado para nós entrarmos renderemos três vezes mais, é um investimento. É igual a um investimento de uma pai para o filho”, afirma o docente de Filosofia.
FMI e Banco Mundial “têm economistas bem pagos para estudarem os mercados todos os dias”
Foto de Adérito CaldeiraNo entanto João Uthui acrescenta que quando num desses Países surge um líder que é visionário mas essa visão barra o mercado financeiro que interessa ao Fundo Monetário ou ao Banco Mundial implantar, “se por via negocial não lhe convencem então criam um tumulto para ele sair, um golpe de Estado vão financiar, metem no povo um ópio (vício) pegando uma verdade, porque o ópio tem que ser verdadeiro, alastra-se e o povo levanta-se para aquele senhor sair e fazem tudo para outro entrar porque o novo vai abrir o mercado, e eles entram e ganham o mercado financeiro”, esclarece o académico enfatizando que estas instituições financeiras não só ditam as regras da economia mas influenciam em tudo afinal “eles têm economistas bem pagos para estudarem os mercados todos os dias. Para criarem modelos de desenvolvimento todos os dias, para proibirem onde eles acham que está a ser feito investimento de graça”.
Solicitado a clarificar com exemplos mais práticos a sua tese João José Uthui socorre-se de alguma retórica afirmando que tanto o Fundo Monetário Internacional assim como o Banco Mundial “não são as paredes, são pessoas, que têm salários, têm todas as mordomias. Acha que vem de onde esse dinheiro para eles terem tudo isso, se não ganham nada e só dão dinheiro? Eles estão a emprestar dinheiro, de onde vem esse dinheiro, é de quem?
“Tem que haver fonte para vir dinheiro para eles, tem que haver dinheiro para pagar toda a gente que faz com que aquele dinheiro entre ali e tem que haver fontes para continuar a vir mais dinheiro. Essas fontes são quais”, questiona ainda o académico que responde com outras questões, “Porque o FMI e o Banco Mundial não saem para vender sacos de arroz, não é dos impostos naturalmente, de onde é que vem?”
“Modelos económicos desenhados para perpetuar a dependência”
Diante da sugestão do @Verdade, de que os fundos talvez possam vir dos Estados membros mais ricos, Uthui responde problematizando. “Mesmo os Estados Unidos da América(EUA) não têm sacos de dinheiro para darem sempre sem querer nenhuma troca”.
Foto de Adérito Caldeira“Para sua informação os EUA é um dos países que tem as embaixadas mais caras no mundo em termos de segurança, edifício, pessoal, qualidade e quantidade, não vão fazer isso enquanto não tem nada para comer. Os EUA são um país que quando faz um ataque não utiliza cinco aviões, usa dezenas, centenas, milhares de onde vem o combustível, o dinheiro para pagar esses pilotos esse material é fabricado, é verdade que é fabricado lá, mas a matéria prima vem de onde, aqueles indivíduos todos são pagos. Um F-16 com quatro mísseis custa o hospital de Maputo, de onde vem o dinheiro para terem mil aviões desses”, questiona também João Uthui.
O professor universitário deixa claro que não está contra os Estados Unidos da América ou outros países ricos do Ocidente, “mas é preciso perceber como eles vivem. Eles gastam muito dinheiro e eu volto a fazer a pergunta de onde é que os americanos tiram o dinheiro? Será que eles são os super produtores e super vendedores do mundo para terem tanta quantidade de dinheiro que investem nas bases militares, navais, embaixadas e toda presença que têm pelo mundo?”
“É este dinheiro que retiram daqui. De que maneira, os tais modelos económicos desenhados para perpetuar a dependência e retirar sob forma de recurso, sob forma até de massa cerebral, pensadores, tudo. Quando um cientista moçambicanos diz eu casei com uma norte-americana e vai-se embora e fica lá nós até achamos normal, mas aquele cérebro vai trabalhar para eles. Quem investiu para ele estar formado, foi o dinheiro moçambicano mas ele vai trabalhar para eles”, esclarece Uthui.
EMATUM, Proindicus e MAM fazem “sentido em todas as perspectivas menos numa”
Nesta ordem de ideias o @Verdade perguntou se então fazia sentido que Moçambique, na base de um desses modelos económicos das instituições de Bretton Woods, se endividasse da forma como tem estado a acontecer e que tem nos empréstimos secretos das empresas Proindicus, Mozambique Asset Management e Empresa Moçambicana de Atum o seu apogeu.
Foto de Adérito Caldeira“Faz sentido em todas as perspectivas menos numa. Pensando num país que precisa se defender, faz sentido. Mas a pergunta é defender o quê? Faz sentido para os fabricantes dos barcos porque têm que ter mercado e os engenheiros de lá não teriam recebido salários todo este ano. E para eles terem um cliente tem que existir um indivíduo que mobiliza o cliente, cria necessidade do cliente para comprar, então faz sentido”, disse o académico.
“Só não faz sentido para nós porque ainda estamos a lutar pelo prato (de comida), não temos dinheiro. Então a nossa prioridade é o prato na mesa, então não faz sentido por causa disso. Porque se tivéssemos prato até quereríamos mais, ir para o alto mar vedar afinal aquele peixe é nosso”, clarifica João Uthui.
Relativamente a aparente facilidade com que os bancos suíço e russo emprestaram os mais de 2 biliões de dólares norte-americanos, às três empresas que não existiam nem têm grande credibilidade no mercado, o professor Uthui é lacónico, “o negócio dos bancos é emprestar dinheiro (…) eles têm que conquistar clientes” e é natural que os banqueiros procurem clientes, afinal até “a mulher que vende peixe no mercado vai a porta e chamar o cliente (…) um banqueiro que não faz isso não está a vender”, conclui.

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