"Deus criou as pessoas para amarmos e as coisas para usarmos, porque então amamos as coisas e usamos as pessoas?"



terça-feira, 12 de junho de 2018

DE ONDE VEIO O EXTREMISMO ISLÂMICO QUE AMEAÇA MOÇAMBIQUE


part II

 

Moçambique, um país em stand-by.

O grupo dominava duas mesquitas em Mocímboa da Praia. E como notam os analistas Gregory Pirio, Robert Pittelli e Yussuf Adam num artigo publicado pelo think-thank African Center for Strategic Studies, “as crianças que estudaram nestas e noutras mesquitas fundamentalistas surgidas nos últimos anos, chegaram à idade de participação nas milícias”.

No ano passado, as autoridades encerraram estas mesquitas, mas pode ter sido demasiado tarde. Segundo o estudo dos três investigadores, o recrutamento é feito directamente nas zonas rurais desta região Moçambicana. Há porém relatos de vários jovens se  juntarem à organização voluntariamente. Muitos partem para países como a Tanzânia, o Quénia ou Somália, através de recursos próprios ou de bolsas de estudo fictícias, para aí serem treinados.

Objectivos ocultos
Apesar de objectivos mais gerais que se inspiram na jihad internacional, os autores do estudo dizem que a verdadeira meta é outra:

“O objectivo último não é ocupar Cabo Delgado ou criar um estado islâmico no Norte do país. O objectivo é criar oportunidades de negócio para as elites informais da região de Cabo Delgado. Pelo menos, os dados assim o mostram. De acordo com os interesses regionais e internacionais destes negócios ilícitos, estes são os objectivos imediatos”.

O estudo toca em vários pontos que podem explicar a presença e expansão do Ahlu Sunnah Wa-Jammá em Moçambique.

A província de Cabo Delgado é um caldeirão onde estão praticamente todos os ingredientes necessários à proliferação do radicalismo: tem a maior taxa de iliteracia de Moçambique, atingindo em média os 64.8%, sendo que em cidades como Palma chega aos 90%; a taxa de desemprego, principalmente jovem, é muito elevada, tal como no resto do país; há forte presença do crime organizado (e da corrupção), especialmente o tráfico de droga, de armas e de outros produtos como os rubis, a madeira ou o marfim, materiais em abundância na região; há conflitos étnicos, nomeadamente entre os mwani, os makonde e os makua.

Recentemente foram descobertas algumas das maiores reservas de gás do mundo nesta região. Alguns analistas dizem que  esta descoberta pode tornar Moçambique o terceiro maior exportador mundial de gás natural liquefeito.

A província de Cabo Delgado transformou-se imediatamente no alvo de planos de avultados investimentos para a extracção não só de gás mas também de petróleo, safiras e rubis.

Com a perspectiva da entrada de milhões, a esperança na resolução dos problemas de região aumentou. No entanto, a chegada das empresas internacionais não gerou grande compensação para os cidadãos, nem fez reduzir a taxa de emprego, apesar das construções que estão planeadas.

Alex Vines, analista da Chatham House, diz à Al-Jazeera que este boom só aumentou a percepção da desigualdade em Cabo Delgado o que, em última análise, “tem sido uma das causas para o crescimento da militância jovem”.

Para piorar o clima, têm aumentado as acusações de violações dos direitos humanos por parte das empresas que ali se estabeleceram, incluindo suspeitas de expropriação ilegal de terras.

Os negócios e as desigualdades podem ajudar a explicar  o alastrar do radicalismo no Norte de Moçambique. Ao mesmo tempo, os ataques do grupo radical islâmico estão a pôr esses negócios em risco. O que pode não ser uma boa notícia para o país.

Segundo a Bloomberg, estão em risco cerca de 30 mil milhões de dólares em investimento.

Mocímboa da Praia e Palma, locais onde se iniciou a vaga de violência, estão a apenas 80 quilómetros das reservas de gás que estão a começar a ser exploradas por empresas como a Eni, ExxonMobil e a Anadarko. Algumas destas organizações começaram já a retirar trabalhadores, temendo mais ataques.

“Este problema não vai desaparecer e está a tornar-se cada vez mais um problema regional”, diz à Bloomberg Nigel Morgan, director da Rhula Intelligent Solutions, empresa sediada em Maputo.

*** contínua ...

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