"Deus criou as pessoas para amarmos e as coisas para usarmos, porque então amamos as coisas e usamos as pessoas?"



quinta-feira, 28 de janeiro de 2021

 

Mondlane não foi o nacionalista como a Frelimo conta (2)

Eduardo MondlanePor Francisco Nota Moisés

"E no dia 11 de Março de 1968, enquanto eu e outros jovens estávamos ainda em Dar Es Salaam, um grupo de macondes incluindo uma mulher com um bebé no colo e armados de catanas, paus e cornos, aproveitaram-se da ausência do Gwenjere que tinha indo em serviço pastoral a cidade de Morogoro para o noroeste de Dar Es Salaam e os desencorajava a não recorrer a violência contra os dirigentes da Frelimo, assaltaram o escritório da

 Frelimo No Nkrumah Street. Agarraram no Chissano, mas o treinado da KGB, conseguiu sair das mãos dos assaltantes  que tentavam o catanar quando o casaco que usava perdeu os seus botões e ele o retirou do seu corpo antes de correr pelas escadas abaixo para entrar e correr na rua somente de camisola.  Sérgio Vieira meteu-se e fechou-se na latrina e os assaltantes não tiveram o tempo de quebrar a porta para cataná-lo e dar cabo dele antes de se retirarem e se dispersarem para não serem apanhados pela policia tanzaniana.  Infelizmente, Sansão Mutemba, que dizem ter sido o pai da Josinha Mutemba, a namorada de Felipe Magaia, que Samora Machel veio a forçar a ser a sua esposa depois de organizar o assassínio do outro, foi agarrado e catanado na cabeça e veio a morrer no Muhimbili Hospital, hospital central de Dar Es Salaam, das feridas infligidas."  

Ninguém pode dizer se o objetivo dos assaltantes macondes foi o de matar qualquer pessoa que encontrassem no escritório da Frelimo ou não. O certo é que o seu objetivo principal era o de matar Eduardo Mondlane, se o tivessem encontrado ali. O grupo foi invadir o escritório visto que Gwenjere, o deus deles, não estava em Dar Es Salaam. É como que se dissessem que o padre Ngwenjere, como o chamavam, "não está nos arredores para nos reter. Aproveitemo-nos da sua ausência para fazermos aquilo que ele nos proíbe fazer. Quando ele regressar, encontrara que já fizemos o que vamos fazer e não haverá nada que ele poderá fazer para desfazer o que faremos."

Na verdade, quando Gwenjere regressou, ficou muito triste e chorou por causa daquilo que os seus amigos tinham feito, sem os condenar. Gwenjere queria mudanças na Frelimo sem violência, mas que ele subestimava a natureza da ditadura da Frelimo e a tendência dos seus lideres para se manterem no poder, custasse o que custasse.

Talvez que o grupo dos assaltantes não tinha a intenção de agredir todos os indivíduos que eles iam encontrar no escritório quando atacaram por volta de 11 horas daquele dia de 11 de Março de 1968. Em vez de Sansão Mutemba ficar calmo e não reagir e não tentar lhes opor, ele decidiu resistir-lhes a força.  Dai que se zangaram e catanaram-no e decidiram virar as suas armas, as catanas e outros objetos contundentes, contra Chissano, Mutemba e Sérgio Vieira que se enfiou na latrina do escritório e se barricou lá dentro onde ficou até depois da retirada dos assaltantes.

O grupo não tinha feito nenhum reconhecimento.  Se tivessem feito, talvez teriam sabido que Mondlane não estaria no escritório, mas sem saber que ele se tinha deslocado secretamente como sempre o fazia para fora da Tanzânia. Só viemos a saber da  sua ausência mais tarde sem  jamais sabermos para onde ele tinha ido.

Mutemba era o chefe das transmissões da Frelimo e dizia-se mesmo que ele transmitia aos portugueses, coisa que o malogrado Zeca Caliate confirmou quando disse neste blog que da casa de Mondlane transmitia-se para os portugueses. Toda a gente dizia isto e talvez que o grupo dos atacantes sabiam disto.  O certo era que aquele tempo os portugueses tinham infiltrado fortemente a Frelimo e sabiam quase tudo sobre nós e tinham os nossos nomes. 

Na sua autobiografia, Youweri Museveni, o actual ditador ugandês,  que era estudante nos anos de 1960, foi dito em Dar Es Salaam quando queria ir as zonas onde a Frelimo operava no Norte que ele devia ter cautela visto que Mondlane era um agente da CIA. Tal era o que muitos tanzanianos diziam e ouvi-o de tanzanianos que não conheciam que me disseram que Mondlane are um homem perigoso e um agente dos americanos. Diziam que Mondlane e a sua esposa americana eram agentes da CIA.

Depois da morte de Mutemba, Mondlane e os líderes da Frelimo organizaram o seu enterro e Mondlane trouxe pessoalmente o programa para as cerimonias fúnebres com o nome da igreja onde as rezas seriam feitas e o cemitério onde o malogrado seria enterrado e colocou-o num quadro no edifício do Instituto moçambicano.

Como se a tragédia de Mutemba não constituísse suficiente magoa para ele, Mondlane sofreu ainda mais um duro golpe. Dos cerca duma centena de estudantes, rapazes e raparigas, ninguém foi ao enterro do Mutemba.  Ninguém queria honrar o seu inimigo. Um dia, ou menos dum dia, depois do enterro, Mondlane chegou no Instituto e ouvi-o a lamentar-se que nenhum estudante foi para o enterro do "camarada Mutemba" e não percebia a nossa atitude. Quase que estava a chorar, magoado pela nossa indiferença altamente cruel.

Mas para nós, os líderes da Frelimo eram os nossos inimigos. Daí que quando na tarde do dia 11 de Março de 1968 ouvimos da Radio Tanzânia em Swahili que o escritório da Frelimo tinha sido assaltado por um grupo de indivíduos, ficamos contentes, regretando somente que Mondlane e alguns da sua camarilha tinham escapado e ficamos contentes quando, por volta  dum ano mais tarde enquanto em Rutamba no sul da Tanzânia ouvimos que o próprio Mondlane tinha morrido no dia 3 de Fevereiro de 1969. A nossa alegria sobre a morte de Mondlane não agradou ao chefe tanzaniano do campo de refugiados da ONU que convocou uma reunião com alguns de nós, incluindo eu, para nos reprender e criticar severamente.

Mondlane era o nosso inimigo que nos queria o mal, mas quando o mal lhe aconteceu, rimo-nos.  Não tínhamos nada a regretar sobre um homem que queria nos matar.

O assalto ao escritório da Frelimo fez estremecer a cidade de Dar Es Salaam que quase não respirou naquele dia visto que toda a gente na urbe soube da Radio Tanzânia o que tinha acontecido no escritório da Frelimo.

No dia seguinte fui à baixa para reconhecer a situação e observar de perto por mim mesmo o que tinha acontecido.  Andei no outro da rua oposto ao escritório da Frelimo que estava intacto e que teria sido destruído, se o explosivo que matou Mondlane tivesse acontecido lá.  O explosivo que matou Mondlane destruiu por  completo a residência da Betty King. Era um engenho muito forte. Viu um soldado ou um polícia de uniforme com um capacete de aço armado com uma Patchett, uma arma de fabrico britânico dentro do cordão que se tinha estabelecido para impedir um novo assalto. não me ri visto que atmosfera estava muito sombria.  Ri-me mais tarde ao contar aos outros estudantes no Instituto moçambicano.

P.S.: Proximamente uma olhada ainda sobre quem teriam morto Mondlane antes de abordar a questão do Triunvirato que sucedeu à morte de Mondlane: Os portugueses como a Frelimo disse, os tanzanianos como a atitude dos tanzanianos nos faz suspeitá-los ou um complôt dentro da Frelimocom uma manipulação da KGB como muita gente dizia na Tanzânia visto que os soviéticos não gostavam do Mondlane por considera-lo um agente americano.

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