"Deus criou as pessoas para amarmos e as coisas para usarmos, porque então amamos as coisas e usamos as pessoas?"



sábado, 7 de abril de 2018

URIAS SIMANGO, HERÓI NACIONAL



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Este é meu desejo, como historiador, cidadão.
CONTEXTO
Uria Timóteo Simango (15 de Março de 1926 - 1977 ?) foi um pastor presbiteriano moçambicano e líder proeminente da Frente de Libertação de Moçambique, FRELIMO, durante a luta de libertação contra o regime colonial português. A data exacta da sua morte é desconhecida, uma vez que foi extra-judicialmente executado (juntamente com vários outros dissidentes da FRELIMO e sua esposa, Celina) pelo governo pós-independência de Samora Machel. A sua biografia foi publicada em 2004.
Simango foi membro fundador da FRELIMO, com estatuto de Vice-Presidente desde a formação desta frente até à data do assassinato do seu primeiro líder, Eduardo Mondlane, em Fevereiro de 1969. Simango sucedeu a Mondlane na liderança da FRELIMO mas, na luta pelo poder após a morte de Mondlane, a sua presidência foi contestada e, em Abril de 1969, acabou por ser substituída pelo triunvirato composto pelo próprio Simango e pelos marxistas de linha dura Samora Machel e Marcelino dos Santos. Nos finais da década de 1960, registaram-se lutas fratricidas no seio da FRELIMO, com vários membros a morrerem por causas não naturais
Depois da Revolução dos Cravos em Portugal, em 1974, Simango retornou a Moçambique e criou um novo partido político, o "Partido da Coligação Nacional" (PCN), na esperança de disputar eleições com a FRELIMO. Ao PCN aderiram várias outras figuras proeminentes do movimento de libertação e dos dissidentes da FRELIMO: Paulo Gumane e Adelino Gwambe (também membro fundador da FRELIMO), o Padre Mateus Gwengere e Joana Simeão.
A FRELIMO recusou eleições multipartidárias. O governo português pós-1974 entregou-lhe o poder exclusivo, e Moçambique tornou-se independente em 25 de Junho de 1975. Samora Machel e Marcelino dos Santos assumiram os cargos, respectivamente, de Presidente e Vice-Presidente. Graça Machel foi nomeada Ministra da Educação e Joaquim Chissano Ministro dos Negócios Estrangeiros. Uria Simango foi preso e forçado a fazer uma confissão pública de 20 páginas em 12 de Maio de 1975, no Centro de Reabilitação e Reeducação de Nachingwea (Tanzânia), onde se retractava e solicitava reeducação. A sua confissão forçada pode ser ouvida online. Ele e os restantes líderes do PCN nunca mais foram libertados. Simango, Gumane, Joana Simeão, Gwambe, Gwengere e outros foram secretamente liquidados numa data indeterminada entre 1977 e 1980.
MOTIVAÇÕES
Simango foi morto em Mtelela, Niassa, no campo de reeducação, em circunstâncias estranhas.
Até agora, as declarações sobre de quem foi a ordem contradizem-se.
Uns dizem que Samora até chorou quando Urias foi morto pois a sua ideia era de leva-lo a passear pelo Moçambique socialista para ele Urias apreciar a vitória socialista assim que ela triunfasse. Outros, dizem que a ordem partiu de um tal "entusiasta", que quis mostrar serviço. Numa entrevista concedida o Savana a 4 de Setembro de 2009, Mariano Matsinhe afirmou categoricamente que na Frelimo era normal fuzilar. A MELHOR PARTE desta entrevista não foi necessariamente ai mas sim o reconhecimento que o então SNASP cometeu exageros e desmandos. Torturou gente sem mandato e inclusive matou pessoas.
Portanto, pelo que se vê, não há consenso sobre o consenso da necessidade de matar Uria Siamngo. Ao que tudo indica e de acordo com as informações disponíveis, FOI TUDO UM EQUÍVOCO, precipitado por um maníaco que quis mostrar serviço.
Por outro lado, vemos agora os mesmos dirigentes, colegas de Uria a darem entrevistas em que glorificam a então Frelimo como tendo sido espaço onde todos tinham oportunidade de expor as suas ideias. Pois bem, à semelhança de Cistac, Uria Simango foi morto por divergir de opinião e pior, por expor esta opinião publicamente para o debate…de ideias.
Assim, podemos concluir que:
• A morte de Uria Simango foi um grave equívoco político, da mesma forma que o foram os outros como Joana Simeão, Gwenjere e Nkavandame, movido por alguma irresponsabilidade e imaturidade política dos então dirigentes máximos do partido e principalmente pelos serviços de segurança de então.
o Se o debate de ideias era e continua a ser apanágio da Frelimo actual, logo, faz sentido que (a) se reescreva a história neste sentido e
o (b) se reconheça o verdadeiro lugar dos ora mortos sem culpa formada (leia-se a ordem interna assinada pelo Jacinto Veloso onde clarifica que o fuzilamento destes não teve por base nenhuma culpa formada mas sim foi no âmbito da purificação das fileiras da inteira responsabilidade da Frelimo) não apenas como vitimas inocentes porque não formalmente acusados como heróis nacionais de libertação nacional devido a sua contribuição à causa da independência nacional.
VANTAGENS
• Algumas pessoas podem achar isso como um absurdo. Eu não penso assim. Eu penso que esta seria a melhor forma de a própria Frelimo antecipar-se aos factos e aos eventos; reconciliando-se com a história.
• É também uma boa metodologia para sarar as feridas, apesar de esta medida não nos devolver os finados, como também cimentar a unidade nacional.
• Reconhecer Uria Siamngo como herói da libertação nacional vai igualmente implicar a reabertura dos processos investigativos sobre as circunstâncias da sua morte e, acima de tudo, da reposição da verdade dos factos.
• A Frelimo tem mais 10 anos para fazer isso, se ela quiser continuar a liderar os processos de transição e de mudança. Se não o fizer, o dia que perder, isto acontecerá e saberá a chicotada psicológica que poderá reabrir as feridas e iniciar-se o “ajuste de contas”, desnecessário nesta altura.
• A História de Moçambique é essencialmente uma história gentílica, ancorada em narrativas de um punhado de personalidades e não necessariamente nos processos. Torná-la plural, diversa e compreensiva pode contribuir para o fortalecimento da Unidade Nacional. Na verdade a História é o coração da Frelimo. E como tal, este “coração”, portanto, a história como é conhecida hoje, está a ficar velho, fraco e com muitas recaídas. A única forma de reanimá-lo é trazendo novos factos, novos actores, novos tecidos que o ajude a viver por mais tempo. O fim da Frelimo será o FIM da história e o começo de outra. Muitas vezes, estes tipos de transição foram sangrentos, marcados pelo reavivar da intolerância do tipo novo.
• A Frelimo, o partido, pode desde já iniciar este processo reconciliatório com a História agindo neste sentido. Em inglês chamaríamos PRE-EMPTING (antecipação, tradução literal). Ela não precisa necessariamente que tome a dianteira. Mas pode por exemplo, deixar os investigadores trabalhar em várias linhas de pesquisa e deixar isto publicado. Noutra frente, através da diplomacia pública, a Frelimo poderia aceitar propostas submetidas a Comissão de Títulos Honoríficos e Condecorações onde pontificariam algumas personalidades, incontornáveis para determinados povos.
É que para o Planalto de Mueda, mesmo que se explique em 5000 páginas que Nkavandame foi traidor, não será possível retirar a heroicidade deste entre os macondes.
Aos do centro de Moçambique e principalmente Sofala, Uria Simango, Dhlakama serão sempre os seus ícones, suas principais referências políticas, antes de conceberem Mondlane, Samora ou Chissano.
Esta nação está em construção. Este país é feito de muitas nações e urge construi-lo ao nível da narrativa histórica como tal. E se calhar, aqui é onde reside o maior problema.
A história pode ser um instrumento libertador e pode também ser um instrumento colonizador.
“History may be servitude, History may be freedom”. T . S. Eliot, Little Gidding
PS: Não estou a espera de muitos comentários sobre este tema. A proposta de debate não tem por objectivo reavivar as marcas de guerra, acusações sobre quem matou mais. Como historiador, gostaria com esta proposta chamar atenção à necessidade de reescrever uma História de Moçambique plural, inclusiva e menos excludente, sem olharmos para os responsáveis da actual versão de história. Acredito que esta pode ser uma das formas de reconhecermos não apenas os erros do passado como também corrigi-los, reunificando o povo através de uma narrativa em que todos se revêm, não como servos e acompanhantes, mas como lideres e fazedores.
Na verdade, se for a ver a lista dos principais "traidores"da Frelimo, todos eles são do centro e norte de Moçambique. Será mera coincidência? São eles "essencialmente tribalistas" que os outros? Ou haveria outras formas de explicar a purga interna ou os termos "reacionários e traidores" foram termos genéricos para justificar lutas internas pelo poder?

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