"Deus criou as pessoas para amarmos e as coisas para usarmos, porque então amamos as coisas e usamos as pessoas?"



quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Relações entre tribunais e polícia cada vez mais tensas

 
Guerra entre agentes da administração da justiça?
Os tribunais reclamam de forma sistemática que a polícia não tem acatado as suas decisões. A PRM também anda “zangada” com os tribunais, por entender que mandam soltar criminosos. O Ministério Público aparece sempre como o mediador do conflito...
Embora sejam instituições complementares, no quadro da administração da justiça em Moçambique, há cada vez mais casos conflituosos entre a Polícia da República de Moçambique, os tribunais e a Procuradoria.
O caso mais recente envolveu o Tribunal Judicial da Cidade de Maputo e a PRM ao nível do Comando Geral, quando a instância judiciária teria ordenado a devolução de um número considerável de viaturas apreendidas pela polícia na sua operação contra a onda da raptos que se verificam na capital do país, tendo a PRM se escusado a executar tal decisão do tribunal.
Aliás, a PRM só aceitou devolver as viaturas depois da intervenção da procuradoria ao nível da cidade, por esta ter ameaçado processar a corporação pelo crime de desobediência.
Como é que a história começa?
A história começa nos meados do presente ano, quando a onda dos crimes de raptos se agudiza na cidade de Maputo. No quadro das suas operações, a Polícia da República de Moçambique apreendeu, nessa altura, um número considerável de viaturas, pertencentes ao grupo REMIX Property, da família Nini Satar.
Na ocasião, o grupo de Nini, inclusive, foi transferido da Brigada Operativa, vulgo B.O, para as celas do Comando da Cidade de Maputo, também para ser investigado no quadro da operação policial.
O caso de apreensão de viaturas deu entrada no Tribunal Judicial da Cidade de Maputo, na Secção de Instrução Criminal. Porém, ainda na instrução preparatória, o tribunal não viu elementos probatórios convincentes para a apreensão dos referidos carros, tendo, portanto, ajuizado a favor da família Nini, ordenado desta feita a sua devolução imediata.
O tribunal diz que “não encontrou elementos probatórios do envolvimento do principal indiciado, Carlos Covane, e outros comparsas seus no crime de rapto, sendo que o motivo fundamental da apreensão das viaturas é o envolvimento de Covane nestes crimes, já que os carros estavam em seu nome”, lê-se no despacho exarado pelo tribunal. Ou seja, as viaturas foram apreendidas pela polícia simplesmente porque estavam em nome de um indivíduo suspeito de crime de rapto. Não havendo provas do seu envolvimento, obviamente, o tribunal tinha que ordenar a devolução das viaturas, decisão não acatada pelos agentes da Lei e Ordem.
No entender do tribunal, as viaturas só podiam ser apreendidas se, efectivamente, houvesse provas factuais de que foram usadas para a prática de crimes de rapto e não o suposto envolvimento do seu dono. Aliás, o Código do Processo Penal do nosso país diz que só se pode apreender os instrumentos do crime na fase de instrução do processo e não os bens que se supõe - sem provas - que tenham sido usados como tal. Para além disso, não se pode apreender bens que, sem provas, se suponha resultem de actividades ilícitas, mesmo que o seu proprietário se tenha envolvido em actos criminais com provas evidentes.
Ainda de acordo com o CPP, os bens de um criminoso podem ser apreendidos caso haja uma sentença transitada em julgado,  e que a mesma condenação requeira uma indemnização e tais bens serem necessários para o efeito, e não foi o que aconteceu desta vez.
Diante destes factos, o Tribunal da Cidade de Maputo ordenou, através de despachos datados de 13 e 22 de Agosto, a devolução das viaturas aos seus legítimos proprietários, sendo que a polícia não o fez dentro do prazo que se estabelecia.
No dia 14 de Setembro, a Procuradoria Geral da República emitiu um despacho no qual exigia à polícia que respeitasse a decisão judicial. O despacho, assinado pela procuradora-chefe, Maria Machava, recorda a Polícia sobre o conteúdo do artigo 215 da Constituição da República, segundo o qual “as decisões dos tribunais são de cumprimento obrigatório para todos os cidadãos e demais pessoas jurídicas, e prevalecem sobre as outras autoridades”.

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