06/10/2019
Desde o início dos ataques armados no norte do país, os responsáveis ainda não foram identificados. Um estudo do IESE investiga as motivações para a violência. O sheik Saide Habibe falou à DW África sobre a pesquisa.
Este sábado (05.10), marca precisamente dois anos desde o início dos ataques armados na província de Cabo Delgado, norte de Moçambique. Ainda não se sabe quem são os responsáveis.
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Entretanto, pesquisadores do Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE) de Moçambique investigam o que estaria por trás destes atos de violência naquela região. Um trabalho de campo desenvolvido entre os meses de novembro de 2017 e fevereiro de 2018 em conjunto com a Fundação Mecanismo de Apoio à Sociedade Civil (Fundação MASC), explora a complexidade das dinâmicas do grupo Al-Shabaab, que estará ligado à estrutura da violência em Cabo Delgado.
Segundo os autores, o fenómeno exige uma pesquisa multidisciplinar aprofundada. Em entrevista à DW África, o sheik Saide Habibe, que participou na pesquisa do IESE, aponta várias motivações.
DW África: Como celebrar a paz num ambiente de ataques e insegurança em algumas regiões de Moçambique?
Saide Habibe (SH): Celebrar a paz num momento em que há ataques esporádicos aqui e acolá acaba manchando a própria alegria da festa sobre a paz. Mas, ao mesmo tempo, também é preocupante, porque o processo de paz ainda continua. O grande desafio é mesmo trazer uma paz efetiva para o país, em que não há mais esses ataques. Então, nós temos ataques em Cabo Delgado e temos acompanhado aqui ataques esporádicos. Mas parece-me que até a "Junta Militar" da RENAMO já veio dizer que não tem nada a ver com aqueles ataques. Então, realmente, preocupa-nos sabermos o que realmente está a acontecer.
Por que Cabo Delgado, em especial Mocímboa da Praia, foi o local escolhido para ser palco de grande parte dos ataques armados desde 2017 em Moçambique?
SH: Pode dar-se o caso de existirem vários fatores que concorrem para a escolha de Cabo Delgado para servir de palco para esses ataques. Pode também tratar-se daquela experiência que outros países conhecem, como é o caso da Nigéria e da República Democrática do Congo.
Qual seria então o objetivo do grupo instalado em Moçambique se tivesse os mesmos moldes desses outros grupos instalados em outros países?
SH: O modus operandi é o mesmo. Hoje em dia, através das redes sociais, é fácil haver, digamos, essa imitação. O objetivo no fundo é mesmo infundir esse terror para tirar dividendos.
Uma das principais constatações do estudo é sobre o radicalismo islâmico na região, mas, para o Governo, os ataques são realizados por um grupo inimigo do desenvolvimento. O Estado estaria a tentar minimizar o assunto para a opinião pública?
SH: De forma alguma. Eu penso que o Estado moçambicano está a ser coerente consigo mesmo, olhando para a coisa de forma fria. Se é que se trata de um radicalismo, então só pode ser uma coisa que vem de fora, porque a natureza da própria sociedade moçambicana, incluindo os muçulmanos também, está muito longe de adotar um radicalismo como a sua forma de manifestar a sua religiosidade.
Qual deveria ser a posição do Governo diante de todos estes atos de violência? É preciso uma nova política de segurança?
SH: Neste momento, o Governo está a fazer a sua parte. Mas a parte boa que o Governo fez e que nós, como sociedade, também estamos a fazer é de tentar unirmos as forças e fazer uma plataforma interreligiosa, que também engloba as confissões religiosas de Moçambique, para fazerem face ao conflito que está a acontecer em Cabo Delgado. Portanto, isso já é positivo. Agora, naturalmente, o Governo tem uma maior responsabilidade e acredito que se seguir essa linha, com a ajuda também da comunidade internacional, poderemos encontrar soluções.
Vê alguma relação dos ataques armados das últimas semanas no centro do país com os de Cabo Delgado ou as motivações no centro seriam outras?
SH: Os ataques no centro do país teriam uma motivação puramente política. São completamente diferentes dos ataques de Cabo Delgado.
DW – 05.10.2019
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