24/10/2019
O antigo dirigente da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo, oposição) Raúl Domingos disse à Lusa que o partido não devia ter assinado o acordo de paz em agosto sem garantias de que as eleições gerais seriam livres, justas e transparentes.
“Eu penso que a Renamo não devia inclusive avançar com os acordos que assinou, que viabilizaram estas eleições, enquanto não tivesse resolvido o problema da fraude”, declarou.
Raúl Domingos foi considerado durante muitos anos o número dois da Renamo, antes de ser expulso do partido, na sequência de divergências com o falecido líder da organização, Afonso Dhlakama.
Os resultados eleitorais do escrutínio de dia 15 devem ser oficialmente anunciados pela Comissão Nacional de Eleições (CNE) até dia 30, como impõe a lei, mas o apuramento provincial mostra que a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo) venceu as presidenciais, legislativas e provinciais, em todos os círculos, com maiorias absolutas folgadas.
Renamo e Movimento Democrático de Moçambique (MDM), os dois partidos da oposição no parlamento, recusam aceitar os resultados alegando fraude e várias missões de observação levantaram também dúvidas e preocupações acerca da votação.
Para Domingos, a polémica sobre o registo eleitoral na província de Gaza, Sul de Moçambique, que estalou em julho, foi o indício de que as eleições gerais do dia 15 deste mês já estavam viciadas e de que os resultados seriam "fabricados". Naquela província, o recenseamento incluiu mais 300.000 eleitores que a população com idade para votar (18 anos).
"A Renamo tinha a soberana oportunidade de corrigir isso, quando tinha na mão a faca e o queijo: a vontade do Presidente da República, Filipe Nyusi, de ter o acordo de paz e o processo de desmilitarização da Renamo iniciado antes das eleições", declarou o político.
As provas de que o escrutínio foi adulterado a favor da Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), partido no poder, são o surgimento de boletins já preenchidos fora das mesas de votação e de editais dos resultados com um número de votantes inferior ao total dos votos.
"Está claro que estas eleições são as piores da história das eleições em Moçambique", sendo "verdade que, desde 1994, sempre houve ilícitos eleitorais", acusou Raúl Domingos.
A exclusão de observadores eleitorais e de delegados de candidatura da oposição, a morte de um representante da sociedade civil e a indicação de membros das mesas de voto ligados à Frelimo também criaram um ambiente favorável à "fabricação" dos resultados eleitorais, considerou.
De acordo com Raúl Domingos, os problemas que aconteceram nas eleições gerais têm potencial para colocar em causa o Acordo de Paz e Reconciliação Nacional assinado entre o Governo da Frelimo e a Renamo a 06 de agosto.
"Temos aqui um potencial de instabilidade político-militar e é preciso que haja uma ponderação, sobretudo, dos órgãos que têm a competência de validação destes resultados, para evitar que voltemos àquele ciclo de conflito pós-eleitoral", frisou Raúl Domingos.
Apesar de exortar os órgãos de justiça e de gestão eleitoral para agirem com seriedade na análise das irregularidades ocorridas, Domingos manifestou ceticismo, apontando a "partidarização dos órgãos do Estado" a favor da Frelimo.
O risco de uma nova confrontação armada devido à contestação aos resultados eleitorais é adensado pelo facto de o processo de desarmamento, desmobilização e reintegração dos membros da guerrilha da Renamo não ter avançado o suficiente, alerta Raúl Domingos.
LUSA – 24.10.2019
NOTA: O SISE nunca deveria ter ficado de fora. E agora?
Fernando Gil
MACUA DE MOÇAMBIQUE
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