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terça-feira, 30 de agosto de 2016

“Nunca houve uma política agrária moçambicana”, João Mosca

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Escrito por Adérito Caldeira  em 30 Agosto 2016
Foto de Adérito CaldeiraA crise económica e financeira tem trazido à tona os problemas estruturais do nosso País. Quando o Presidente Filipe Nyusi, e o seu Executivo, repetem que Moçambique importa mais comida do que aquela que produz está a reconhecer que as políticas agrárias que os sucessivos Governos do partido Frelimo puseram em prática não resultaram. “Penso que nunca houve uma política agrária moçambicana” afirmou o economista João Mosca enquanto o Professor Rafael Uaiene declarou ter a “certeza que os apelos ao aumento da produtividade por si não vão resultar”.
A “Produção Alimentar, Transformação Estrutural e Diversificação da Economia” moçambicana foi o tema de uma mesa redonda, organizada pelo Observatório do Meio Rural(OMR) e pela União Nacional de Camponeses(UNAC), que juntou em Maputo no passado dia 24 camponeses, agricultores, académicos e empresários.
“Existe nos últimos tempos tendência para demonstrar que a agricultura vai bem” começou por explanar João Mosca, doutorado em economia agrária e sociologia rural, director e investigador do OMR, que através de alguns slides com estatísticas oficiais mostrou que a produção nacional de milho, arroz, feijão e amendoim não cobre as necessidades alimentares dos moçambicanos.
“Segundo a FAO a produtividade agrícola global moçambicana tem vindo a decrescer” acrescentou Mosca concluindo que “nunca houve uma política agrária moçambicana”.
Cinco Is da agricultura: as Instituições, o Investimento, as Infra-Estrutura, a Inovação e os Incentivos
Por seu turno Rafael Uaiene, Professor em Desenvolvimento Internacional, Agricultura, Alimentação e Recursos Económicos na Universidade de Michigan, disse ter a certeza que os apelos do Governo para o aumento da produtividade só por si “não vão resultar” na produção de mais comida para os moçambicanos.
Foto de Adérito CaldeiraDe acordo com o académico falta inovação na agricultura nacional, as instituições do Estado são extremamente frágeis, os investimentos e os incentivos são poucos e as infra-estruturas quase não existem.
“(...)O nosso sistema de investigação e extensão está no marasmo que nós conhecemos, um dos grandes problemas que temos verificado é a falta de produtores de sementes e tecnologias do sistema público de investigação quer pela quantidade quer pela qualidade” explicou Uaiene.
O Professor clarificou ainda que os incentivos que o Executivo tem dado à agricultura não são destinados aos camponeses, que são os maiores responsáveis pela produção de comida, citando como exemplo o subsídio ao gasóleo que “os pequenos produtores não têm condições para chegar a eles, pois não estão registados formalmente. Quem é que entre os camponeses utiliza electricidade para beneficiar-se da taxa de energia reduzida?”
“Um dos grandes problemas que nós temos neste País é que enquanto as estatísticas indicam que as pequenas produções são aquelas que estão empenhadas na produção de comida muito pouco é feito em termos de apoio a esses produtores. Estamos a tentar imolar as grandes explorações que estão a trazer certamente outros problemas, trazem tecnologia sim mas também os problemas de terra e de desemprego”, constatou Rafael Uaiene.
“Espero que nos tenha passado a febre dos el dorados de Tete e de Palma”
Sem pretender apresentar soluções acabadas o Professor declarou que “(...)nós precisamos por um lado de um crescimento rápido, uma estratégia que gere crescimento rápido e redução da pobreza, e as grandes explorações pela sua natureza não vão fazer isso. Elas não empregando muita gente acabam por não beneficiar a grande maioria”.
Rafael Uaiene diagnosticou a agricultura moçambicana como estando doente, “uma agricultura que não consegue sair dos níveis baixos de produtividade, uma agricultura que não consegue produzir o suficiente para garantir a segurança alimentar, não consegue resolver os problemas da desnutrição crónica(que afecta cerca de metade população moçambicana)”.
O académico moçambicano concluiu que embora a Constituição da República defina a agricultura como a base do desenvolvimento na realidade “é uma base muito frágil” e não só porque o quinhão que lhe é destinado todos os anos no Orçamento de Estado é reduzido mas o também o crédito ao sector reduziu de 20% no ano 2000 para cerca de 3% actualmente. “(...)Quer dizer que a agricultura vai ficando cada vez menos importante, espero que nos tenha passado a febre dos el dorados de Tete e de Palma”.

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