"Deus criou as pessoas para amarmos e as coisas para usarmos, porque então amamos as coisas e usamos as pessoas?"



sexta-feira, 13 de maio de 2016

“Estamos em pânico e com medo”, passageira das LAM; BP corta combustíveis devido a dívidas da transportadora estatal

 
 
 
Tema de Fundo - Tema de Fundo
Escrito por Adérito Caldeira  em 13 Maio 2016
Foto de Cidadão Repórter“Estamos em pânico e com medo”, relata ao @Verdade uma passageira após o avião das Linhas Aéreas de Moçambique (LAM) em que viajava ter registado problemas técnicos que forçaram uma longa paragem para manutenção no aeroporto de Quelimane. A jornada entre Maputo e Nacala, que deveria ter sido de 3 horas, foi realizada em 22 horas sem direito a informação, alimentação digna e nem mesmo acomodação. De permeio o Boeing 737-500 teve que fazer uma escala não prevista na cidade da Beira, para reabastecimento, pois a petrolífera BP cortou o fornecimento de combustíveis às LAM devido a dívida acumulada. Diante destas situações que não são novas, e colocam em risco a segurança dos passageiros, o Instituto de Aviação Civil de Moçambique (IACM) mantém-se em silêncio cúmplice.
O receio da nossa entrevistada devia-se ao facto de ela, assim como pelo menos cinco dezenas de outros passageiros, estarem a “ser obrigados a subir no mesmo voo”, o TM1166 que na passada segunda-feira(09) fazia a ligação entre a cidade de Maputo e de Nacala, na província de Nampula, quando teve um problema eléctrico.
Inicialmente o voo estava previsto partir do aeroporto de Mavalane às 12h10, fazer uma escala em Quelimane e depois seguir para o novo aeroporto da cidade portuária do Norte, “mas só partimos 14h40”, relatou-nos.
Com cerca de 2 horas de viagem “sentimos algo estranho, quando estávamos a aproximar-nos do aeroporto de Quelimane, as luzes todas apagaram e escutamos um barulho estranho, parecia que o piloto ia aterrar mas não aterrou”, contou-nos a passageira acrescentando que o avião ficou mais alguns minutos no ar e só depois se fez à pista, eram já 16 horas.
Como estava prevista uma escala na capital da Zambézia os passageiros deixaram a aeronave aguardaram na zona de trânsito. Esperaram e começaram a desesperar, particularmente porque nenhum funcionário da companhia aérea estatal se dignou a informar sobre o que se estava a passar. Após muita pressão os passageiros souberam que a aeronave tinha tido problemas técnicos.
Ao @Verdade as Linhas Aéreas de Moçambique explicaram que foi registado um problema eléctrico quando a aeronave já estava em terra. Devido a natureza da avaria, que as LAM não quiseram precisar, foram enviados técnicos da capital do país para irem reparar o Boeing estacionado Quelimane.
Instituto de Aviação Civil de Moçambique acoberta mau serviço e insegurança nas LAM
À essa altura, cerca de 10 horas após o início da viagem, as Linhas Aéreas de Moçambique já sabiam com que avaria estavam a lidar e que mesmo apesar de poder ser reparada a tripulação não poderia voar, precisaria de descansar antes de retomar o voo, porém não disponibilizaram acomodação para os seus passageiros. “Só disseram que iríamos jantar num sítio onde cada um teria de consumir até 500 meticais, enquanto esperávamos o avião que viria de Maputo para transportar-nos”, declarou a nossa entrevistada assegurando-nos que em nenhum momento as LAM mencionaram que os passageiros teriam direito à alojamento na cidade de Quelimane.
O @Verdade perguntou às Linhas Aéreas de Moçambique quais são as suas normas de tratamento dos seus passageiros em casos de atraso, uma informação que na generalidade das companhias é de domínio público. O gabinete de comunicação da “nossa” companhia, é participada pelo Estado em 91,15%, esclareceu que após mais de 3 horas de atraso é servida uma refeição ligeira e, caso esse período decorra nas horas habituais de almoço ou jantar essas refeições são fornecidas. Já a acomodação dos passageiros só acontece quando o voo tem um atraso superior a 8 horas, há muito ultrapassadas na jornada do voo TM1166.
O @Verdade contactou o Instituto de Aviação Civil de Moçambique, Órgão Regulador do sector, para apurar que direitos têm os passageiros em Moçambique caso o voo que os tenha transportado tenha sofrido vários, e sucessivos, atrasos até chegar ao destino? A instituição dirigida por João de Abreu, antigo piloto e comandante das LAM, prontificou-se a responder as questões enviadas por escrito pelo @Verdade porém, até ao fecho desta edição, não o tinha efectuado.
Recorde-se que as companhias áreas moçambicanas estão banidas de voar para a Europa, desde Abril de 2011, devido incapacidade do Instituto de Aviação Civil de Moçambique aplicar e provar a eficácia nos mecanismos de segurança internacionalmente exigidos.
Não é preciso ser viajante frequente para provar os maus tratos da transportadora aérea nacional porém, apesar disso, não há memória do IACM ter-se pronunciado alguma vez relativamente às condições que os passageiros são submetidos ou sobre os problemas de segurança das aeronaves operadas pelas LAM.
Legislação da Aviação é vaga sobre os direitos dos passageiros
Mouzinho Nichols, presidente da Associação Moçambicana de defesa do consumidor, referiu-nos num breve contacto telefónico que a legislação que regula os direitos dos passageiros no nosso país é a Lei da Aviação Civil.
Verificamos, entretanto, que a Lei em apreço, 21/2009, é vaga sobre os direitos dos passageiros em casos de anomalias. A alínea a) do número 1 do artigo 49 estabelece apenas que “a não realização do voo ou a interrupção do voo conferem ao passageiro o direiro ao reembolso da passagem aérea na medida do percurso não realizado e ao pagamento das despesas ordinárias de deslocação, alimentação, alojamento e comunicação”.
Importa referir que o direito ao reembolso da passagem aérea será de pouco interesse para os passageiros pois as LAM detêm o monopólio do transporte aéreo em Moçambique, não existe alternativa.
Chefe de escala das LAM chamou a polícia
Cansados de ficar no restaurante, “porque era um local ao ar livre”, os passageiros pediram para voltar ao aeroporto de Quelimane, eram cerca das 23 horas, “ficamos a saber que o avião só chegaria a 1h09”, madrugada do dia seguinte.
Foto de Cidadão Repórter“Ficamos no aeroporto a espera” contou-nos a passageira que falou com o @Verdade, “mas para o nosso espanto uma vez o avião já no aeroporto eles simplesmente só recolheram os passageiros com destino a Maputo e a nós com destino à Nacala disseram que deveríamos esperar o avião avariado ser consertado para depois prosseguir a viagem”.
“Foi quando começamos a exaltarmo-no e então o chefe de escala(das LAM) resolve chamar a polícia. Mas nós continuamos em direcção ao avião que estava na pista e iria partir para Maputo. Preferíamos voltar a Maputo do que permanecer em Quelimane, um aeroporto que nem sanitários condignos tem e onde nem água saía”, desabafou a nossa entrevistada.
“Foi quando eles de imediato tiraram a escada e nós decidimos permanecer na pista” afirmou ainda a nossa entrevista que disse que apesar da presença da polícia os passageiros não se amedrontaram, mas acabaram por deixar a porque entretanto começou a chover.
Regressaram às precárias instalações do aeroporto de Quelimane onde cada um à sua maneira acomodou-se, nem cadeiras existiam para todos, até cerca das 5h30 de terça-feira (10) quando enfim os passageiros foram embarcados no Boeing mas, “segundo o comandante não tinha combustível suficiente para ir a Nacala”, tivemos de ir a Beira abastecer relatou-nos a passageira que prefere não se identificar.
Foi outra hora de viagem para a capital da província de Sofala e depois do avião reabastecido enfim voou para Nacala onde aterrou alguns minutos após as 8 horas.
Os passageiros que pagaram pelo menos 15 mil meticais pela passagem aérea nem um pedido de desculpas formal tiveram direito.
Mouzinho Nichols disse ao @Verdade que algum passageiro tem que decidir chatear-se e processar às Linhas Aéreas de Moçambique, é que à falta de especificação sobre os direitos dos passageiros a Lei da Aviação Civil, estabelece que “Aos danos causados ao passageiro, bagagem e carga e aos incidentes no voo que ocorram no decurso de transporte internacional ou nacional, são também aplicadas as regras estabelecidas nas convenções internacionais de que a República de Moçambique é parte e na demais legislação em vigor”, pode-se ler no número 7 do artigo 44.
Ora essas convenções determinam, por exemplo para as companhias que voam para o espaço aéreo europeu (onde as companhias moçambicanas estão banidas), que em casos de atrasos de: “2 horas ou mais, no caso de quaisquer voos até 150 km; 3 horas ou mais, no caso de voos intra comunitários com mais de 1500 km e para todos os outros voos entre 1500 e 3500 km; 4 horas ou mais, no caso de voos não abrangidos pelos casos precedentes, o passageiro tem direito a assistência imediata.
“Esta assistência será a disponibilização de: refeições e bebidas em proporção razoável com o tempo de espera; a possibilidade de efectuar, a título gratuito, duas chamadas telefónicas, telexes, mensagens via fax ou mensagens por correio electrónico. Caso a hora de partida do novo voo seja no dia seguinte à data programada, o passageiro terá, ainda, direito a alojamento em hotel e transporte de ida e volta entre o aeroporto e o local de alojamento. Caso o atraso seja de 5 horas ou mais, o passageiro tem direito ao reembolso do preço total do bilhete no prazo de sete dias (e voo gratuito até ao ponto de partida quando tal se justifique)”, refere um documento do centro europeu do Consumidor.
BP corta fornecimento de combustíveis por dívidas acumuladas
Mas o problemas da “nossa” transportadora aérea não se resumem a atrasos e mau atendimento aos passageiros. O @Verdade teve acesso a um documento onde petrolífera British Petroleum (BP) informa aos seus superintendentes, supervisores e operadores nos aeroportos em Moçambique “que até instrução em contrário não se deverão efectuar reabastecimentos às aeronaves pertencentes à Companhia Linhas Aéreas de Moçambique. A instrução cobre todos os voos – locais e regionais”, indica o boletim comercial a que tivemos acesso.
Contactada pelo @Verdade a BP em Moçambique não quis prestar nenhuma declarações contudo, de acordo com a publicação Africa Energy Intelligence, a decisão de cessar o abastecimento das aeronaves das LAM foi tomada em Abril de 2016 devido a dívidas acumuladas pelas LAM, estimadas em 3 milhões de dólares norte-americanos.
Um fonte ligada a aviação civil moçambicana acrescentou que devido a esta decisão da BP os aviões das LAM que voam para a cidade sul-africana de Johannesburg passaram, nessa altura, a sair da cidade de Maputo com o tanque cheio de combustível para não precisarem de abastecer no aeroporto O.R. Tambo.
Uma situação muito irregular e insegura, disse-nos a fonte que acrescentou que devido a pressão dos tripulantes as Linhas Aéreas de Moçambique passaram a pagar a pronto o abastecimento das suas aeronaves que continuam a efectuar os voos entre a capital moçambicana e a cidade sul-africana.
Desde Fevereiro deste ano que as Linhas Aéreas de Moçambique têm novos órgãos sociais que são ser dirigidos por António Pinto de Abreu, o terceiro Presidente do Conselho de Administração em cinco anos, ao longo dos quais a qualidade dos serviços da transportadora estatal deterioraram-se, os atrasos multiplicaram-se e o custo das passagens encareceram.

Sem comentários:

Enviar um comentário