1 - Sobre o crédito para a Base Logística de Pemba: a
estranha "acomodação" de Chipande
2 - Sou contra o bota-abaixo
3 - O Porto de Maputo remando contra o marasmo
4 - E ainda encerramos o nosso espaço aéreo atrasando o
turismo e adiando negócios, ao mesmo tempo que se apela ao aumento da produção e
se exige mais contribuição fiscal
5 - Consta que há mais uma dívida
6 - Um retrato limitado da crise que nos bate a porta
7 - Uma omissão e um dilema do Primeiro-ministro
8 - Jornal de parede
9 - O Presidente entre a pompa do poder e o seu exercício
10 - E os responsáveis pela omissão e pelo
silêncio?
11 - A crise fiscal já bateu a
porta!
12 - Sobre prestar contas lá fora e descurar cá dentro
13 - Estas agências de rating (classificação de risco)
tiram-me do sério
14 - A corrupção não acontece apenas no sector público,
caros magistrados!
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1 - Sobre
o crédito para a Base Logística de Pemba: a estranha
"acomodação" de Chipande
O
mais recente crédito dessa leva frenética dos créditos ocultos foi para a Base
Logística de Pemba. Para mim estranhamente. Minhas contas não batem certo. A
Base foi sub-concessionada pelos Portos de Cabo Delgado (PCD), que detém uma
concessão da faixa costeira da Tanzânia até 330 milhas a sul do Porto de Pemba,
a ENHILS. Este é um consórcio que junta a ENH, a angolana SONILs e a Orlean
Investiments, do nigeriano de origem italiana Gabrielle Volpi. Quando recebeu a
concessão, assumiu-se que esta malta tinha dinheiro.
Um
pouco de enquadramento: a concessão da base à ENIHLS foi a contra-gosto de
Chipande. Ele, através da Associação Cabo Delgado em Moçambique com o apoio da
Norconsult, equipou-se para concorrer num concurso que nunca acabou sendo
lançado. Porque o Governo de Guebuza, com o seu Ministro Gabriel Muthisse,
atribuiu a base a ENIHLS. Sem concurso, repito. Isto originou uma zanga entre
Chipande e Guebuza. Ou uma ira de Chipabde relativamente a
Guebuza...
Entretanto,
nos últimos meses foi noticiado que Valentina Guebuza tinha relações comerciais
com a ENILHS. Entretanto, mesmo com a zanga, quando a bronca da EMATUM rebentou,
Chipande apareceu em público defendendo o interesse empresarial da empreitada.
Como? Se, como se diz, o principal mentor da EMATUM é Guebuza, o que fez com que
Chipande batesse palmas?
O
certo é que a ENILHS revela no entanto que não tinha dinheiro para avançar com
as infra-estruturas. Afinal, a aliança com a SONILS (da Sonangol) e a Orlean era
um bluff. A solução era ir buscar dinheiro lá fora. Onde? China. Então entra em
jogo a China Harbour Engeneering Company (CHEC). Ofereceu-se para avaliar o
projecto. O custo era de pouco mais de 200 milhões de USD. Mas o projecto não
passou no due diligence que a CHEC realizou. O consórcio não tinha
credibilidade.
Mas…
mas depois aparece o banco VBT russo a conceder esse crédito para a Base. 550
Milhões de USD, em vez de 200. Que o África Confidencial diz que foi concedido
para “acomodar” Chipande. Será isso que explica a diferença entre os 200 milhões
que se pretendia para investimento e os 500 milhões que foram contratados? Será
isso? Por estas e outras razões exige-se uma auditoria urgente à dívida
pública.
2 - Sou contra o bota-abaixo
Todos
dos dias lemos nos jornais e nas redes sociais que o ex-presidente Armando
Guebuza e o ex-ministro das Finanças Manuel Chang já deviam estar presos pelo
seu papel na contratação de uma dívida cujo processo não obedeceu aos trâmites
estabelecidos na Lei Orçamental e na Lei da Probidade Pública e cuja
sustentabilidade era duvidosa. Boa parte desta dívida serviu para a compra de
armamento de guerra. Sempre fui contra esse investimento na Defesa em vez de um
investimento nas áreas sociais.
Mas
cada vez mais acredito nos princípios que nortearam a criação da Ematum e da
Pro-indicus, nomeadamente o princípio da protecção costeira. Esta costa de 3 mil
quilómetros que Moçambique tem, sem mesmo contar com sua riqueza em produtos do
mar e hidrocarbonetos, é hoje, se calhar, o principal activo do país.
O
escândalo da dívida está aí. Tudo o que sabemos decorre de informação gerada
fora do país. Para já sabemos muito pouco. Só uma auditoria geral à dívida pode
trazer elementos que apontem para indícios de violação de procedimentos
administrativos ou indícios de prática de qualquer crime. Refiro-me a auditoria
porque espero que ela venha a ser feita no quadro do possível resgate do
FMI.
O
normal seria que o Ministério Publico tivesse agido logo que se constatou que o
Governo contratou a dívida para a EMATUM sem passar pela Assembleia da
República. Essa violação podia ter suscitado uma reacção da Procuradoria-geral
da República. Mas ela não fez nada.
Estamos
habituadas a que não faça nada. Os pareceres do Tribunal Administrativos sobre a
Conta Geral do Estado trazem todos os anos indícios de violação e crimes mas a
PGR não faz nada. E tem um representante no TA (esta direcção do Ministério
Público deve ser demitida em bloco). Triste cenário.
O
assunto da dívida pública oculta é um assunto delicado. Por isso, ele não deve
ser tratado de ânimo leve, com essas caricaturas e xingamentos insultuosos na
praça pública. Quer se queira quer não, Guebuza e Chang são inocentes até que se
prove o contrário. E ninguém ainda provou isso, incluindo os comentadores mais
vibrantes de nossas tvs e os caricaturistas mais talentoso das redes
sociais.
A
presunção de inocência é um princípio fundamental do nosso direito penal e faz
parte dos direitos constitucionais mais básicos. Por isso de nada adianta
estarmos a condenar por antecipação essas duas figuras. Este assunto é demasiado
sério para ser tratado com tamanha leviandade.
3 - O Porto de Maputo remando contra o marasmo
No
meio do marasmo em que vivemos e ante um desânimo quase geral por causa da crise
da dívida e toda a conjuntura ruim para o investimento privado, há quem não
desarma… e arregaça as mãos para mostrar que ainda há esperança e…futuro. Ao
anunciar um investimento de 100 milhões de USD em dragagem, contratada a um
consórcio bancário local (que venceu um concurso publico internacional), o Porto
de Maputo, liderado pelo jurista Osório Lucas, quer melhorar sua
competitividade.
A
dragagem vai permitir que navios de 80 mil toneladas escalem o Porto.
Pretende-se aumentar a profundidade do canal de acesso para 14 metros e expandir
a sua largura. Isso vai permitir que Maputo possa arrancar algum mercado a
Richards Bay e a Durban. São estes tipos de iniciativas empresariais que animam
no meio de uma terrível cacofonia de desalento. A crise ninguém a esconde e o
sector imobiliário, incluindo novos empreendimentos hoteleiros, já se ressente
de uma forma drástica. Mas ao partir para esta empreitada, o Porto de Maputo
está a cumprir o seu papel, aumentando a capacidade instalada da
infra-estrutura. E aposta na economia do mar, que em Moçambique ainda se
descura, mas que, no caso concreto tem um potencial multiplicador de 1 bilião de
USD anuais, dado o impacto positivo em negócios afins como agenciamento, frete,
transporte e estiva, E operadores que vem a Maputo carregar no porto
essencialmente minerais que da RAS e do Zimbabwe, vão poupar 8 USD por tonelada.
É boa fruta. A competitividade do Porto de Maputo seria melhorar não fossem
essas rendas fictícias que os operadores pagam em serviços de racionalidade
duvidosa, que não vale a pena mencionar.
4 - E ainda encerram nosso espaço aéreo atrasando o turismo
e adiando negócios, ao mesmo tempo que se apela ao aumento da produção e se
exige mais contribuição fiscal
O voo 142 da SAA
que devia ter partido de Joanesburgo para Maputo há cerca de meia hora, teve de
retornar a placa porquê? De repente, o espaço aéreo de Maputo está encerrado.
Não sei como é que isso funciona. Já viajei para dezenas e dezenas de destinos
por esse mundo fora e nunca um voo foi atrasado por encerramento do espaço
aéreo. O máximo que vivi foi dar voltas e voltas a espera de uma brecha para o
avião aterrar, por congestão. Ou lançar vitupérios na placa a espera de uma
brecha para o avião levantar, por congestão.
No nosso caso, a
congestão está na pobreza das nossas mentes. Um país paupérrimo que se dá ao
luxo de atrasar voos comerciais por razões que não são sobejamente públicas.
Bom... eu sei que só pode ser em virtude do Presidente Nyusi estar
regressando.
Mas não acredito
que esta orientação seja dele, embora eu não compreenda porquê não se está a
usar a gare da Base Aérea, que foi reabilitada com cunho presidencial. Nyusi que
já apelou para o aumento da produção para podermos sair da crise. Um
contra-senso. Porque esse fecho afecta o turismo e adia negócios.
5 - Consta que há mais uma
dívida
Consta
que há mais uma dívida, esta ligada ao Ministério do Interior.
A
notícia está a ser veiculada pela RDP-África. Cerca de 250 milhões de USD. Só
estou a ver esse "investimento" nas Forças de Intervenção Rápida. É provável que
surjam mais revelações, assim às pinguinhas.
Para
a credibilidade do actual governo, é necessário que o PM Carlos Agostinho do
Rosário promova uma Conferência de Imprensa tendo ao lado de si o Ministro da
Economia e Finanças, Adriano Maleiene. Do Rosário chega dos EUA amanhã. Em
condições normais, ele seria cercado no Aeroporto de Mavalane por jornalistas
sedentos de informar a opinião pública. Mas o PM também podia tomar iniciativa
própria de convidar os jornalistas a irem ao Aeroporto. Recuperava uma aura
samoriana. Vezes sem conta, Machel fez de Mavalane um palco da sua comunicação
com o povo.
A
dimensão da armadilha em que caímos é enorme. A teia era ferozmente mortal. O
VTB russo andou intermediando créditos of budget de montantes menores mas não
necessariamente irrelevantes. É, pois, provável que nos próximos haja mais
relevações.
O
problema comum de todos estes créditos é que eles apresentam valores empolados.
Cinco vezes mais que o valor necessário para implantar um negócio. E isso não se
aplica apenas a Ematuns e Pro-indicus. Os Aeroportos de Nacala e Maputo viram os
seus orçamentos aumentando vertiginosamente. A Ponte da Catembe tem um custo
superior ao seu preço se ela fosse construída na China.
Isso
mostra que boa parte da dívida pública serviu para pagar comissões de
intermediários lá fora e governantes cá dentro. O papel dos Credit Suisse e VTB
também tem algo de criminoso. Estes bancos intermediaram parte das operações e
ficaram com milhões de USD nos seus bolsos. Foram eles que atraíram investidores
para bancarem no nosso país em função das possibilidades da industria
extractiva.
Quando
Moçambique começou a encaixar com receitas de tributação de mais valias no
carvao e alguma no gás do Rovuma, os apetites dessa gente de lá e da nossa gente
de cá ficaram mais aguçados.
E
pronto! Moçambique passou a ser uma presa fácil sobretudo porque as suas elites
políticas estavam ávidas de encaixar milhões sem trabalhar e à custa da maioria.
Quando chegou ao Ministério da Economia e Finanças, Maleiane descobriu que havia
lá uma espécie de mercado de garantias soberanas. A facilidade com que o Estado
avalizou negócios de viabilidade duvidosa era diabólica. Maleiane decidiu que
isso tinha de acabar mas começou a sentir que havia reservas já bem
sedimentadas.
Nesse
aspecto particular, ele ainda não venceu. Mas com a iminência de isto ser
entregue ao FMI as coisas vão mudar de feição.
6 - Um retrato limitado da crise que nos bate a porta
Parece
que muita malta ainda não enxergou o que nos espera nos próximos três anos –
período estimado para as coisas voltarem a normalidade – mas o drama que se
segue é tremendo. O meu amigo Teo Nhangumele escreveu uma prosa bastante
elucidativa sobre isso. Ontem liguei-lhe brincando que eu tinha uma notificação
para ele ser ouvido por actividades subversivas. Ele deu uma risada interminável
e concordamos que ele tinha escrito o sentimento de muitos.
Os
mais velhos se recordam do Programa de Ajustamento Económica, o PRE, introduzido
em 1987. Naquele tempo havia dois mercados: um com preços administrados e outro
com preços de mercado, o chamado paralelo. Era mais barato comprar no mercado
oficial porque o Estado subsidiava os preços. Nos mercados paralelos as coisas
eram mais caras. E havia também uma gritante diferença entre ambos.
Uma
das consequências da crise é entregarmos a gestão das finanças públicas ao FMI.
Não há saída. Ou abismo ou FMI. Ou viramos párias nos mercados financeiros
internacionais ou entregamos nossa soberania por uns tempos. E quanto mais cedo,
melhor. Aliás, o Governo já devia estar a escrever uma Carta ao FMI solicitando
o seu apoio. A situação não é como a da Argentina, que optou pelo calote,
recusando pagar.
A
nossa saída é a da reestruturação da dívida. Que não foi a opção de Portugal nem
da Grécia.
Mas
o que significa mesmo a entrada do FMI? Significa que o Estado vai deixar de
subsidiar a economia. Significa que nossa economia se torna uma economia de
mercado, de facto. Sobe a gasolina, sobe a água, a luz e tudo em cascata.
Agrava-se a crise imobiliária em virtude do abrandamento do IDE. O Metical perde
cada vez mais força. E creio que coisas com a LAM e as TDM vai ter que ser
avaliadas. Na verdade, os subsídios ao sector empresarial do Estado serão
cortados.
A
situação de fragilidade negocial do Governo levará a tomada de decisões
difíceis. E se os americanos forçarem a montagem de uma Base Naval em
Moçambique? A crise é há muito tempo sentida nas camadas periféricas. Mas ela já
está a bater as portas das classes médias urbanas. Os atrasos salariais na
função pública serão frequentes.
Haverá
despedimentos no sector privado. A lista é interminável…um legado
difícil.
7 - Uma omissão e um dilema do Primeiro-ministro
Em
vez de uma tendência crescente de redução da dependência, estamos quase a entrar
para um ciclo de perda de soberania.
O
primeiro-ministro é uma pessoa de bom senso. Protocolarmente correcta e afável,
ele fez ontem uma declaração sobre sua jornada em Washington DC. O que se
destaca é a promessa de uma explicação cabal aos moçambicanos sobre o processo
recente de endividamento e sobre como sairmos do buraco em que estamos. Ele
disse que seus encontros correram bem e que continuaria a conversar com o FMI, o
Banco Mundial e o Governo do Estado Unidos da América. Mas esqueceu-se de
mencionar os doadores que financiam o Orçamento do Estado.
Dentro
de dias, estes doadores estavam em vias de desembolsar parte dos 300 milhões de
USD prometidos para este ano, o que ajudaria a tesouraria. Esta omissão
pareceu-me grave e aconteceu no mesmo dia em que a Embaixadora da Suécia, Irina
Nyoni, declarava que os doadores estavam a espera de explicações do Governo. A
ajuda deste grupo de doadores será fundamental para amainar a crise. Seu apoio
ao Orçamento, aliás, sempre foi relevante para Moçambique, se bem que nos
últimos anos da Governação de Guebuza eles tenham sido “combatidos” no contexto
de uma propalada redução da dependência externa, que agora se releva um grande
fracasso. Em vez de uma tendência crescente de redução da dependência, estamos
quase a entrar para um ciclo de perda de soberania.
A
comunicação do Governo sobre a crise, para além das negociações concretas com os
doadores e o FMI, vai ser fundamental para a criação de um ambiente de
esperança. Mas ela deve ser feita com mais cuidado.
Um
desses cuidados foi a demarcação do PM relativamente ao Governo anterior. Ele
disse que as dívidas foram contraídas pelo anterior Governo. Contudo isso não
elimina várias evidências: o Partido no Governo é o mesmo e continua a ser um
centro de poder que determina posturas como aquela da bancada parlamentar,
adiando a prestação de contas sobre a crise.
O
PM vive entretanto um dos seus grandes dilemas. Antes de chegar ao cargo ele
sonhava fundos soberanos, perspectivando uma gestão cuidada dos recursos das
indústrias extractiva, até aqui colectados na forma de tributação de
mais-valias. Hoje ele não está e gerir fundos soberanos; está a gerir pesadelos
de dívida soberana, boa parte da qual serviu para pagar comissões chorudas,
inclusive a bancos como o Credit Suisse e o VBT, cujo papel foi, na verdade, o
de intermediação.
8 - Jornal de parede
Um
amigo de gema diz que estou a escrever demais, que assim ninguém tem fôlego para
ler e eu vou ficar drained de tanto pensar e postar...que eu devia dosear o time
de decalage e fazer no máximo 3 posts por dia. Eu pensava que o pessoal tinha
tempo para ler o que escrevo neste jornal de parede. Afinal não! Tristeza.
Haamm.....por falar em jornal de parede, esse era um dos sonhos do Carlos
Cardoso.
Democratizar
a informação...malta que sobe my love também deve estar informada sobre o país e
sobre...porquê afinal sobe my love.
Jornal
de parede foi também usado pela Frelimo nas zonas libertadas para informar sobre
o curso da revolução...pelo que não é nada de pejorativo. Cabe em nossa floresta
de pasquins.
Mas
essa de eu ficar drained vou dizer ao meu amigo que nem tenho pensado e
reflectido assim tanto para escrever o que escrevo. Na verdade é um exercício
intelectual que me está enraizado até o ultimo pelo das minhas sobrancelhas. E
não me dói. Alimenta-me. Mas talvez repense. Um post por dia e recolho-me para
outros afazeres… ando na verdade a pensar num blog. Quem sabe?
9 - O Presidente entre a pompa do poder e o seu
exercício
No
Brasil, quando o Collor de Melo era presidente ele se preocupava mais com a
pompa do poder e não com o seu exercício. Tinha poder mas não governava. Era um
presidente cosmético. Não digo que Nyusi é também ele assim mas parece que sua
autoridade não anda em alta.
Parece
que ninguém lhe ouve. Porque se fosse ouvido, o Governo já estaria a dar sinais
contra o despesismo em vez se atirar com todas as garras para o bolso do
contribuinte.
Nyusi
disse que era necessário que a despesa pública fosse foi feita de forma mais
saudável. Mas…quem está a pensar nisso? A adjudicação de obras e serviços por
organismos do Estado mostra números completamente empolados. Incluindo em
concursos da própria Autoridade Tributária. E o FIPAG também. Mas a coisa mais
indicativa de que o país está a nadar em dinheiro e o que Nyusi diz não faz
sentido é essa da camarada Verónica Macamo vir anunciar a construção de uma Vila
Parlamentar orçada em 400 milhões de Meticais. Dois dias depois da declaração do
Presidente. Eu já não percebo nada. Juro palavra de honra.
Uma
politica contra o despesismo é urgente. Só isso vai dar conteúdo concreto ao que
o Presidente Nyusi pretende.
10 - E os responsáveis pela omissão e pelo
silêncio?
Uma
das coisas que deverá ser explicada, se houver explicação cabal, sobre esta
corrida a créditos na base de expectativas de receitas futuras, é porque é que
se optou por um crédito mais caro (juros de 8%) quando havia ofertas mais
baratas (juros de 4.5%). Foi o BIP português quem esteve cá a tentar intermediar
o negócio da Ematum e trazia na carteira essa oferta de 4.5, que não foi tomada.
Outra coisa tem a ver com responsabilidades. Todo o mundo pede a cabeça de
Guebuza e Chang. Isso não é o mais prioritário para mim. Vou explicar porquê num
texto que tenciono escrever. Em todo o caso, quando se fala em responsabilização
todo o mundo apenas enxerga a responsabilidade daqueles que decidiram politica e
administrativamente pela contratação destes créditos. Esquecemos os responsáveis
por omissão e pelo silêncio. E nisso cabe o banco central. Que alias até deu um
parecer ao Governo sobre parte destes créditos, não se percebendo porque é que
seus dirigentes máximos dizem agora que não sabiam de nada.
11 - A crise fiscal já bateu a
porta!
Pois
já está. A Autoridade Tributaria começou a aperta o sector privado das
províncias de uma forma violenta. Fiscalizações e multas às catadupas. Pior, a
crise de Tesouraria no Governo vai ser grave nos próximos dias (ainda não sei se
afectará o pagamento de salários na função pública), com o cancelamento da
tranche de mais de 100 milhões de USD que o Governo esperava receber do FMI. E
então? E então, a AT já está a solicitar que algumas empresas e empresários
paguem impostos ainda não devidos. Ou seja, o Governo já está a cobrar imposto
por antecipação. Até quando?
12 - Sobre prestar contas lá fora e descurar cá
dentro
Ontem
o FMI fez um comunicado a dizer que o PM Carlos Agostinho do Rosário reconhecia
que havia créditos ocultos de mais de 1 bilhão de USD. E essa nota foi enviada
as agências internacionais. Eu soube pela Lusa. Não pela AIM nem pela RM. Se a
relevação sobre as incidências da divida são feitas pelos media estrangeiros,
não se esperava que o Governo as confirmasse lá fora primeiro, descurando a
prestação de contas interna. Creio que logo que teve a reunião com o FMI, a
assessoria de imprensa do PM devia preparar uma nota de imprensa resumindo o
conteúdo das declarações do PM ao FMI. E distribuir para os media nacionais. É
assim como as coisas devem ser feitas. O Governo não pode descurar a importância
da comunicação para as praças internas. A sua ausência só levanta suspeitas e
alimenta desconfianças.
13 - Estas agências de rating (classificação de risco)
tiram-me do sério
No
mesmo dia duas delas tem avaliações diferentes sobre Moçambique.
A
Moddys desce o rating de Moçambique e diz:
"A
principal razão para a descida do 'rating' é a recente troca de dívida da
Ematum, orquestrada pelo Governo de Moçambique, que a Moody's considera ser uma
'troca problemática' e, por isso, um incumprimento ['default', no original em
inglês] na dívida garantida pelo Governo", lê-se na nota distribuída hoje pela
agência de 'rating'
"A
moody's encara este 'default' como um sinal de pouca vontade por parte do
Governo para honrar futuras obrigações com a dívida, e isto suplanta o impacto
positivo que a troca de dívida tem na liquidez externa por via da melhoria, a
média termo, do perfil de amortização de dívida externa pelo Governo",
acrescenta a nota hoje divulgada.
A
S&P sobe o rating de Moçambique e diz:
A
agência de notação financeira Standard & Poor's subiu hoje o 'rating' de
Moçambique para B-/B, na sequência da conclusão do processo de troca de dívida
da Empresa Moçambicana de Atum (Ematum), com Perspectiva de Evolução Estável. "O
Governo de Moçambique completou a troca de dívida da Ematum por títulos de
dívida pública com maturidade em 2023, por isso subimos o 'rating' de Moçambique
para depósitos em moeda estrangeira a curto e longo prazo, de Incumprimento
Seletivo para B-/B, e afirmamos o 'rating' da moeda local em B-/B", lê-se numa
nota da Standard & Poor's (S&P).
"A
Perspectiva de Evolução Estável reflecte a nossa expectativa de que, apesar de o
investimento continuar a pesar nos desequilíbrios orçamentais e externos, vai
apoiar a recuperação económica entre 2016 e 2018", acrescenta a nota, divulgada
hoje em Nova Iorque. "Na nossa opinião, a troca de dívida ajudou o Governo de
Moçambique a melhorar o serviço da dívida a curto prazo, ao reduzir o custo do
montante e dos juros de aproximadamente 200 milhões de dólares por ano para 70
milhões de dólares anuais, com a totalidade do empréstimo a ser diferida para
2023", escreve a S&P.
Em
que é que ficamos?
14 - A corrupção não acontece apenas no sector público,
caros magistrados!
Agora
que o ex-Embaixador de Moçambique em Angola. António Matonse, está a ser seguido
pela Justiça, nomeadamente pelo Tribunal Administrativo, compõe-se o perfil de
grande corrupção (no caso de Matonse ele está a ser procurado para responder a
uma auditoria) que preenche os ficheiros do Gabinete Central de Combate a
Corrupção (GCCC): esse crime, esse desvio, acontece apenas dentro da
administração pública; o tipo de corrupção é o desvio de função e a apropriação
de fundos e bens.
Nos
últimos dias soubemos de alguns peixes-graúdos que caíram nas malhas da Justiça.
E digo peixes-graúdos com todo o respeito pela sua presunção de inocência.
Bernardo Xerinda, Cecília Candrinho, Ana Dimande e Amélia Sumbane. Todos eles
altos funcionários do Estado.
Pensar
que a corrupção acontece apenas dentro do Estado é uma grande limitação da nossa
reacção penal.
Dou-vos
apenas um exemplo para perceberem porquê. No Brasil no quadro da Lava Jacto
foram condenados governantes mas também e sobretudo actores do sector privado,
incluindo o boss da Odebrecht, Marcelo, que tem interesses em Moçambique. Na
África do Sul, os Gupta estão em debandada depois de alegações sobre o seu
envolvimento em tráfico de influências, que eventualmente teria repercussões
judiciais.
Mas
no nosso caso, há uma visão afunilada sobre o perfil dos actores da grande
corrupção. Ela apenas enxerga funcionários do Estado quando a corrupção é
essencialmente uma troca. E se é troca, essa acontece na interface entre o
público e o privado. De modo que, com essa visão afunilada, a corrupção com
origem no sector privado não é tida em conta. Mas ela é, porventura, aquela que
mais delapida o Estado, a crermos na manipulação dos concursos públicos que
penaliza o Estado na dimensão da qualidade das obras públicas.
O
controlo da corrupção tem de ser mais abrangente. E nossos magistrados que
trabalham no assunto devem aprender mais sobre o fenómeno, nomeadamente buscando
abordagens para lá dos considerandos restritos dos códigos penais. Isso lhes
dará mais luz para melhoram seu desempenho.
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