"Deus criou as pessoas para amarmos e as coisas para usarmos, porque então amamos as coisas e usamos as pessoas?"



segunda-feira, 18 de abril de 2016

Credibilidade política ferida pelos rombos financeiros

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Canal de Opinião por Noé Nhantumbo
Ou jamais houve legitimidade nos tempos do pluralismo?
Temos Governo, e sempre tivemos. Com mais ou menos credibilidade, os Governos foram acontecendo, e os que tiveram êxito terão sido os que actuaram sem ferir os direitos dos cidadãos falarem e manifestarem os seus sentimentos.
Diga-se em abono da verdade que o principal êxito terá sido criar as condições para Moçambique possuir um Governo pelo menos do ponto de vista formal.
Houve empenho e criatividade, nem sempre com sucesso, mas Moçambique existe por força do que os moçambicanos fizeram, e nesta epopeia há que contar com os da posição e os da oposição.
Um dos erros graves que se cometeram e que continua a definir a forma como se faz a política entre nós foi termos um grupo de cidadãos tomando a posição de gente “divinamente” colocada e eleita para dirigir em exclusividade os destinos do país.
Pode não parecer verdade ou relacionado, mas, a partir da altura em que AEG procurou atingir os críticos catalogando-os de “apóstolos da desgraça” e outros termos pejorativos, começou a ficar claro que se procurava esconder algo. A recusa de diálogo com AMMD e o desprezo pelas posições da Renamo, característica de dois mandatos presidenciais, estendeu-se ao desprezo pelos órgãos de consulta do PR. O Conselho de Estado e o Conselho Nacional de Defesa e Segurança, constitucionalmente previstos, quase nunca foram convocados. AEG governou como um “imperador”, e isso é inegável.
Convenhamos que os esforços foram em vão, pois o que queriam esconder, amedrontando e aterrorizando cidadãos, já é de domínio público.
A crise que se vive é um produto declarado de uma conjugação de factores que se foram acumulando.
O formalismo das declarações e moções de uma reunião partidária não são suficientes para apaziguar o país.
Falar de modo subliminar de questões contidas na proposta da Renamo sobre a autonomia provincial é como que querer “colher louros” em algo em que não se participou.
Vão dizer que estão trabalhando para a descentralização e até vão cunhar novos termos para o mesmo assunto, só que, na realidade, nem a saúde, transportes e escolas não entregam quando a autarquia é governada pela oposição. Isso é facto que pode ser desmentido senão por quem quer deliberadamente mentir em defesa de um partido que perdeu as eleições autárquicas. Onde isso acontece, inventam divisões administrativas e decepam territórios municipais para garantir a sua presença política e visibilidade. Desonestidade governativa planificada é receita para conflitos. O poder, ou se partilha através de legislação cumprida escrupulosamente, ou então as fricções não terminam.
Falar ou acusar directamente a Renamo de protagonizar assassinatos de cidadãos é objectivamente mentira, e isso é do conhecimento geral. Manuel Bissopo, secretário--geral da Renamo, escapou à morte em plena luz do dia, na Beira, mas o seu guarda-costas não teve a mesma sorte. José Manuel foi assassinado e, como se sabe, era membro sénior da Renamo e membro do CNDS, eleito pelo parlamento em representação da Renamo.
A mais recente reunião ordinária do CC da Frelimo, se trouxe algo novo, foi a menção directa do nome Renamo como causador de todas as desgraças. Foi um esforço programado com antecedência e resultado de uma táctica antiga de vender uma face diabólica da oposição. Antes disso, apareceram na comunicação social propostas nesse sentido,
Antes, já foram chamados de “bandidos armados”, e essa denominação durou longos 16 anos.
Aos outros que fazem oposição, essencialmente política, e que não possuem forças militares residuais, chamam-lhes “saudosistas” e representantes de interesses estrangeiros.
Não se pode ser oposição sem que os “esquadrões ideológicos” se lancem em seu ataque e destruição.
Um Comité Central constituído por uma maioria embrutecida, instrumentalizada, domesticada e obediente dificilmente poderá trazer novidades quando se reúne. Quem afirmou que reinava terror e medo nos corredores da “Pereira do Lago” não foram membros de outros partidos, mas sim pessoas ocupando posições relevo na Frelimo. Quando a disciplina partidária é reduzida à obediência cega aos ditames do dirigente máximo, um partido fica atrofiado e perde iniciativa e deixa de oferecer subsídios para a resolução dos problemas existentes no país.
Quando se insiste na questão “disciplina partidária” e se coloca esta questão no topo das preocupações de um partido até ser mencionado no “pronunciamento” final do presidente de um partido reunido em CC não é por acaso. É um “cavalo de batalha” para assegurar o cumprimento das instruções de voto e de posicionamento dos membros.
Não é de duvidar que existam membros da Frelimo insatisfeitos e indignados com as práticas correntes no seu partido, especialmente a tendência de “fechar os olhos” face à corrosão galopante de valores éticos e morais. Antes, era a “emulação socialista”, agora é a emulação mais ou menos generalizada e parte integral da cultura corrente da ladroagem, do nepotismo, da promoção dos “afilhados” e de pessoas convenientes servis e obedientes em nome de uma suposta confiança política. Que estão em minoria é evidente.
Que não têm, ou perderam, poder interventivo, isso tornou-se também evidente a partir do último congresso da Frelimo. Fundadores e veteranos da Frelimo receberam ordem directa para se calarem, e isso tem os seus efeitos nos que pertencem ao CC.
Abundam analistas e abundam debates com cariz pretensamente intelectual e académico visando explicar os fenómenos políticos actuais.
Há diferentes escolas de ciências políticas no país, mas o que é predominante é vermos que têm espaço e visibilidade os que comungam as teses defendendo o Governo da Frelimo, mesmo quando é o caso EMATUM e PROINDICUS.
Os canais televisivos, TVM especialmente, o jornal “Notícias” e o seu gémeo “Domingo” são exímios em trazer opiniões que parecem ter sido directamente sacadas do Comité Central da Frelimo. São órgãos públicos que se transformaram em “pivot” de uma mediatização meticulosamente desenhada pelos detentores do poder.
Os mesmos que dizem que querem dialogar afastam-se de qualquer diálogo com substância, isto é, algo que traga resultados palpáveis e com impacto na vida dos moçambicanos.
Embrulhar a questão da paz com “panos sujos” de uma constitucionalidade dúbia e pendendo para o lado de quem tem o poder tem sido feito com vigor incansável.
A reunião do CC da Frelimo mostrou, pelas declarações finais, que se tratava de organizar as defesas numa perspectiva de poder que não belisque os entendimentos existentes entre os detentores do poder.
Quem esperava por declarações radicais ou mostrando uma rotura com os que tutelam o poder actual, foi colhido por uma “sopa” igual às anteriores. Os que dizem a “montanha pariu um rato” não mentem, e até dá para dizer que as “ratazanas foram alimentadas” para saírem em defesa do “status”. Não interessa o que digam os opositores, mas aquilo que vai garantir a coesão interna e a disciplina partidária. Essa terá sido a orientação deliberada.
O sofrimento vai continuar, face à teimosia em admitir que o poder deve ser partilhado, como forma de manter-se a paz e desenhar um quadro legal que permita reduzir e eliminar as oportunidades de fraude eleitoral, que, embora alguns não aceitem, é a causa principal da actual situação.
Se as eleições são sujas e fraudulentas, é patético falar de constitucionalidade e legitimidade. (Noé Nhantumbo)
CANALMOZ – 18.04.2016

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