A nomeação de Lagos Lidimo para chefe dos Serviços de Informação e Segurança do Estado (SISE) deixou políticos e analistas perplexos e inquietados. É que ele arrasta consigo um passado militar conotado com a violência.
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O Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, anunciou a nomeação de Lagos Lidimo para o cargo de diretor-geral do SISE na segunda-feira (30.01).
O novo homem forte da secreta moçambicana substitui Gregório Leão José, cujo nome ficou associado às chamadas "dívidas ocultas" da Empresa Moçambicana de Atum (EMATUM), de que o SISE é acionista. Mas Lidimo também entra para a secreta com uma fama que não abona a seu favor, que remonta aos tempos em que foi comandante da guerrilha da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO).
"Ele foi sobretudo um operacional da guerra de guerrilha, da guerra pós-independência contra a Resistência Nacional Moçambicana", a RENAMO, recorda o jornalista e analista moçambicano Fernando Lima. O novo diretor-geral do SISE "dirigiu a contra-inteligência militar, um serviço que tinha mão dura e pesada em relação aos seus opositores do ponto de vista operacional."
Não é só o jornalista que tem más recordações associadas a Lagos Lidimo, que também foi Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas.
"A nomeação surpreendeu-nos de forma negativa, tomando em conta que o general Lagos Lidimo está ligado a todo o processo de violação dos direitos humanos a que se assistiu em Moçambique a seguir à independência; está ligado a todo o processo de violência que se viveu no país", afirma Lutero Simango, chefe da bancada parlamentar da segunda maior força da oposição, o Movimento Democrático de Moçambique (MDM).
Perfil 'não encaixa'
Simango esperava sangue jovem na liderança da secreta moçambicana: "Esperávamos que o nomeado para este cargo trouxesse ar fresco para os serviços de segurança e fosse uma pessoa capaz de acompanhar a era moderna que se vive no país", diz.
O político explica a nomeação com um certo "saudosismo do que se viveu na era passada" e encara-a como uma "ameaça aos direitos humanos".
O perfil do general não encaixa na configuração atual dos Serviços de Informação e Segurança do Estado (SISE), acrescenta Fernando Lima.
O jornalista refere que o modus operandi que caracteriza Lidimo não se coaduna com o atual sistema político moçambicano. "Hoje estamos num Estado de Direito, numa democracia multipartidária. Portanto, partilho das interrogações de muitas organizações da sociedade civil que, de algum modo, ficaram perplexas com a nomeação deste antigo militar da guerrilha contra o colonialismo português", diz Lima.
Triângulo do poder
Ao que tudo indica, três dos setores mais importantes de Moçambique passam agora a ser comandados por figuras da etnia Makonde, do norte do país, a que também pertence o Presidente Filipe Nyusi - por um lado, o setor da Segurança, mas também os setores da Defesa (com o ministro Atanásio Mtumuke) e dos Hidrocarbonetos, este último apenas na esfera privada.
Fernando Lima nota que seria muito difícil perceber toda a teia de interesses relativamente aos hidrocarbonetos. Sublinha, porém, que "seria ingénuo afastar como pura especulação o interesse que geram esses imensos recursos que existem em Cabo Delgado [norte]."
"Também seria ingénuo não tomar em consideração que existe um ressentimento forte nas elites moçambicanas, de que, para o bem e para o mal, muito do desenvolvimento e oportunidades de negócio sempre foram negadas às elites do centro e norte de Moçambique. Portanto, este é o pano de fundo para se falar de que agora os interesses estão nas mãos de pessoas de Cabo Delgado. Digamos que não há fumo sem fogo, mas é ainda peremptório fazer-se uma afirmação desta natureza", diz Lima.
O líder da bancada do MDM prefere não assumir a tendência de nomeações conotadas com a etnia Makonde como um fator orientador. Para Lutero Simango, apenas a meritocracia deve ser determinante: "Sabemos que as nomeações para esses cargos obedecem à confiança política, mas antes disso temos de olhar para as competências."
DW – 31.01.2017
"A nomeação surpreendeu-nos de forma negativa, tomando em conta que o general Lagos Lidimo está ligado a todo o processo de violação dos direitos humanos a que se assistiu em Moçambique a seguir à independência; está ligado a todo o processo de violência que se viveu no país", afirma Lutero Simango, chefe da bancada parlamentar da segunda maior força da oposição, o Movimento Democrático de Moçambique (MDM).
Perfil 'não encaixa'
Simango esperava sangue jovem na liderança da secreta moçambicana: "Esperávamos que o nomeado para este cargo trouxesse ar fresco para os serviços de segurança e fosse uma pessoa capaz de acompanhar a era moderna que se vive no país", diz.
O político explica a nomeação com um certo "saudosismo do que se viveu na era passada" e encara-a como uma "ameaça aos direitos humanos".
O perfil do general não encaixa na configuração atual dos Serviços de Informação e Segurança do Estado (SISE), acrescenta Fernando Lima.
O jornalista refere que o modus operandi que caracteriza Lidimo não se coaduna com o atual sistema político moçambicano. "Hoje estamos num Estado de Direito, numa democracia multipartidária. Portanto, partilho das interrogações de muitas organizações da sociedade civil que, de algum modo, ficaram perplexas com a nomeação deste antigo militar da guerrilha contra o colonialismo português", diz Lima.
Triângulo do poder
Ao que tudo indica, três dos setores mais importantes de Moçambique passam agora a ser comandados por figuras da etnia Makonde, do norte do país, a que também pertence o Presidente Filipe Nyusi - por um lado, o setor da Segurança, mas também os setores da Defesa (com o ministro Atanásio Mtumuke) e dos Hidrocarbonetos, este último apenas na esfera privada.
Fernando Lima nota que seria muito difícil perceber toda a teia de interesses relativamente aos hidrocarbonetos. Sublinha, porém, que "seria ingénuo afastar como pura especulação o interesse que geram esses imensos recursos que existem em Cabo Delgado [norte]."
"Também seria ingénuo não tomar em consideração que existe um ressentimento forte nas elites moçambicanas, de que, para o bem e para o mal, muito do desenvolvimento e oportunidades de negócio sempre foram negadas às elites do centro e norte de Moçambique. Portanto, este é o pano de fundo para se falar de que agora os interesses estão nas mãos de pessoas de Cabo Delgado. Digamos que não há fumo sem fogo, mas é ainda peremptório fazer-se uma afirmação desta natureza", diz Lima.
O líder da bancada do MDM prefere não assumir a tendência de nomeações conotadas com a etnia Makonde como um fator orientador. Para Lutero Simango, apenas a meritocracia deve ser determinante: "Sabemos que as nomeações para esses cargos obedecem à confiança política, mas antes disso temos de olhar para as competências."
DW – 31.01.2017
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