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sábado, 26 de novembro de 2016

SISE tenta interferir na auditoria às dívidas escondidas


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Segundo o Africa Confidential
Os Serviços de Informação e Segurança do Estado (SISE) estão a exercer uma grande pressão para obrigar o Governo moçambicano e a Procuradoria-Geral da República a limitar o âmbito da auditoria internacional às chamadas dívidas escondidas, revela a mais recente análise do Africa Confidential (AC), uma publicação especializada em assuntos africanos, com sede na Inglaterra.
“Quadros seniores do SISE estão muito preocupados com a eventual publicação dos contornos das despesas anteriormente não reveladas”, diz a análise, intitulada “O peso da dívida e da guerra”, numa alusão à violência militar em curso no país e à espiral da dívida pública, que o próprio Governo moçambicano já considerou insustentável.
Recentemente, o Wall Street Journal citou António Carlos do Rosário, presidente do Conselho de Administração da Ematum, Proíndicus e MAM, as três empresas que beneficiaram dos chamados empréstimos escondidos, como tendo afirmado que “o financiamento seguiu todos os procedimentos legais” e “a natureza específica da dívida e dos detentores da mesma foi classificada por razões de segurança nacional”. Sobre as chamadas dívidas escondidas, USD622 milhões são da Proíndicus, USD535 milhões MAM e USD221 milhões são do Ministério do Interior.
As ingerências do SISE, entende o AC, sugerem que os registos de dois mil milhões de dólares de empréstimos escondidos estão arquivados nas contas das três empresas beneficiárias das dívidas, todas ligadas à secreta moçambicana, ou a companhias irmãs.
Os termos de referência da auditoria, já adjudicada à firma de detectives norte-americana Kroll, prossegue a análise, poderão ser mantidos em segredo, decorrendo negociações entre as autoridades moçambicanas, Fundo Monetário Internacional e a Kroll, no sentido de os contornos da auditoria não virem à superfície.
O AC considera que o paradeiro dos avultados montantes das dívidas escondidas e as alegadas compras de material militar pelo dinheiro dos empréstimos só serão publicamente conhecidos, caso tal cenário seja previsto e incluído nos termos de referência.
“Esta situação tem provocado críticas dos doadores e da sociedade civil, que consideram que num exercício sobre transparência, tais detalhes não devem ser mantidos em segredo. Também tem alimentado especulações de que o Governo ainda está a tentar esconder certos aspectos dos negócios suportados pelos empréstimos escondidos e poderá conseguir manter esta situação”, refere a avaliação do AC.
A publicação inglesa considera haver claros sinais de que a verba contraída à revelia da Assembleia da República e da comunidade internacional foi mal usada.
Ademais, há receios de que o Governo moçambicano pode estar a esconder mais dívidas, apesar das aparentes garantias que têm sido dadas pelo ministro da Economia e Finanças, Adriano Maleiane, de que não há mais empréstimos escondidos.
“Depois de todas as mentiras e incompetência, os doadores e investidores perderam confiança em Moçambique. Eles estão à espera de garantias do FMI, mas é pouco provável que o FMI se comprometa com um novo programa com Moçambique, antes de obter toda a informação sobre a situação financeira do país e da estabilização da dívida de Moçambique para níveis sustentáveis”, considera o AC.
O Governo, continua, o documento, levou mais de três anos a tentar esconder as dívidas e manteve-se em negação, mesmo depois de a informação sobre a existência de empréstimos escondidos ter começado a vir a lume.
O aval dado pelo anterior ministro das Finanças aos empréstimos contraídos pela Ematum, Proíndicus e
MAM é ilegal ao abrigo da lei moçambicana e foram mantidos em segredo, mesmo de ministros importantes do anterior Governo.
Elites da Frelimo na compra de armas para o Estado
O AC cita fontes da Frelimo que admitem que uma parcela dos dois mil milhões de dólares foi usada para a compra de armas. Podem não ter sido as três referidas empresas que compraram o equipamento militar, mas outras entidades a elas ligadas.
“Fontes próximas do SISE reconhecem que há um enorme pacote militar que terá de ser explicado aos auditores. Parte dos dois biliões de dólares foi usada para permitir a compra de armas pelo Estado, através de empresas a ele ligado”, indica o AC.
Recursos provenientes de empréstimos comerciais, não destinados à compra de armas, prossegue a análise, foram despendidos em equipamento militar por indivíduos com fortes ligações políticas, que tiraram grande parte destes negócios, transacionando em nome do Estado, nomeadamente membros de elites da Frelimo.
O AC argumenta que os empréstimos garantidos às três empresas serviram como “garantia colateral” para a contracção de novas dívidas. Uma das facturas avançadas é de que poderão existir mais USD900 milhões gastos em equipamento militar. O AC menciona que até agora não foi revelado com quem foi contraída a dívida de USD228 milhões do ministério do Interior, mas adiantam que tudo indica ser a R. P. da China o credor.
Ainda segundo o AC, uma avaliação das despesas suportadas pelo montante dos empréstimos revela que pelo menos um bilião de dólares evaporaram. Algumas fontes acreditam que o valor pode ser bem mais superior.
De acordo com o texto da análise, não restam dúvidas de que valores colossais dos empréstimos escondidos foram desviados das empresas supostamente beneficiárias, de forma directa ou indirecta: para enormes aquisições militares.
As compras para as Forças de Defesa e Segurança foram intermediadas através de um complexo esquema e uma estrutura envolvendo, em parte, entidades privadas, delineados para proporcionar comissões chorudas a elites da Frelimo e mascarar o uso de dívidas comerciais para fins militares.
As aquisições incluíram não apenas armas e veículos militares, dizem fontes da Frelimo citadas pelo AC, mas largas somas de dinheiro foram gastas no treinamento de Forças de Defesa e Segurança do Estado, equipamento de vigilância e injecção de enormes recursos nos serviços secretos moçambicanos.
Para corroborar a sua tese, o AC entende que a capacidade de vigilância electrónica por parte do Estado moçambicano aumentou. A crescente repressão às liberdades civis e à Renamo indica que há um recurso mais incremental a um sistema de vigilância mais sofisticado à Internet e aos emails.
Um sistema de vigilância de última geração terá sido fornecido pela companhia chinesa Zhong Xing Telecommunication Equipment Company Limited (conhecida como ‘ZTE corporation’). O jornal “Canal de Moçambique” mencionou que Mussumbuluku Guebuza, o filho do antigo presidente, esteve envolvido na compra de novo armamento e no contrato de vigilância electrónica ganho pela empresa chinesa.
Alegadamente, o sistema, gerido a partir de um centro de comando ultra-moderno em Maputo, pode interceptar e registar inúmeras comunicações, incluindo chamadas e emails, e aceder a mensagens encriptadas.
Há, por outro lado, prossegue o AC, citando fontes nas universidades moçambicanas, sinais de aumento de vagas de recrutamento por parte do SISE, e pessoal que tinha deixado a secreta moçambicana tem estado a voltar, aliciado pela melhoria de condições de trabalho.
Também têm sido notadas evidências de que a Força de Intervenção Rápida moçambicana conta na sua frota com novos veículos, como se terá visto em acções visando impedir manifestações contra a crise da dívida e há relatos de que armas de pequeno porte provenientes de Israel estão à disposição das forças de segurança.
SAVANA – 25.11.2016
NOTA: Para já não há transparência alguma enquanto não forem públicos os termos de referência para a Auditoria Internacional.
Fernando Gil

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