"Deus criou as pessoas para amarmos e as coisas para usarmos, porque então amamos as coisas e usamos as pessoas?"



terça-feira, 3 de maio de 2016

A mentira caindo por terra?


Listen to this post. Powered by iSpeech.org
Caso da descoberta da vala comum com cadáveres
Vala1_Arsénio_Sebastião Vala2 Vala9 Vala4 Vala5 Vala6 Vala7 Vala8(Algumas imagens são chocantes. Click para ampliar))
Magazine CRV entrevistou o jornalista Arsénio Sebastião da DW que a par do colega da Lusa, André Catueira, envolveram-se numa investigação de morte denunciando a existência duma vala comum com mais de 100 cadáveres no centro do país
Fotos: Arsénio Sebastião
Beira (Magazine CRV) -- “Eu penso que, publicada a segunda verdade a uma “inverdade”, esperamos que o Governo volte a dizer uma coisa, que na verdade o que desmentimos é verdade, esperamos que isso aconteça….” -afirmou ao jornal ontem (Domingo, 1), Arsénio Sebastião, representante da Deutsche Welle (DW -Onda Alemã) a nível da região centro de Moçambique, quanto ao trabalho desenvolvido junto com o jornalista André Catueira da Lusa, sobre a primeira matéria publicada no dia 28 de Abril (Quinta-feira) [**] despoletando a existência em Gorongosa duma vala comum com corpos até já no estado de decomposição, isto pela Lusa, que viu rejeitada a sua veracidade particularmente pelo Governo da província de Sofala no dia seguinte (Sexta-feira, 29) [*].
A ENTREVISTA
Seguidamente a entrevista, sem edição, com conteúdo transcrito à letra, conforme decorreu:
MAGAZINE CRV (M-CRV): - Foi à busca, foi fazer uma investigação sobre a denunciada descoberta da vala comum com cadáveres, anunciada em primeira mão pela agência de notícias Lusa. Como e quando tomou conhecimento deste facto?
ARSÉNIO SEBASTIÃO (AS): - “Tive conhecimento da existência da alegada vala comum penso eu já a duas semanas atrás, foi numa altura em que estava na Suazilândia a fazer um trabalho que tem ver com a segurança na fronteira entre Moçambique e Suazilândia e o colega amigo da Agência Lusa, o Catueira me liga, e pediu para que pudéssemos conversar no Wataasp, queria saber se na verdade eu tinha conhecimento da existência da tal vala comum…”
M-CRV: - Isto antes da Lusa ter publicado o assunto pela primeira vez…
AS: - “Muito antes da Lusa publicar. Primeiro debatemos durante 3 a 4 dias…”
M-CRV: - …para dizer que o jornalista André Catueira que lhe trouxe essa informação?
AS: - “Ele vinha apenas para confirmar, ele teve a informação, eu também já tinha mas, eram aqueles indícios que não tinham nenhumas bases. Ele quis confrontar comigo as ideias, eu também quis fazer o mesmo com ele, ficamos na expectativa de que existindo algo, vamos saber, se não existe na verdade também vamos saber. Então ele precipitou-se, fez um contacto, eu já lhe tinha garantido que iria fazer os meus contactos cá ao nível do distrito, da província. Ele alegou que não, ‘vamos atrasar porque é um assunto que já está a explodir e o que 'eu posso fazer é contactar directamente uma pessoa que está perto de lá, lhe vou pedir para fazer uma pequena ronda’, e na verdade ele fez isso, contactou alguém…”
M-CRV: - Dizes então que o André Catueira avançou com outros contactos, conseguiu elementos bastantes…
AS: - “Sim, o Catueira fez os seus contactos lá e disseram que sim, que sabiam disso mas que eram obrigados a não falarem a ninguém, a não ser a quem seja do Governo, aliás, o Governo impõe a que a população que saiba não exteriorize o mesmo, devendo o assunto ficar apenas ai na comunidade local… mas ele foi insistindo, foi insistindo… e conseguiu alguém que pudesse se disponibilizar em ir até ao local. Na verdade, a pessoa foi descobrir primeiro os cadáveres que estavam fora da vala, isto é, os que estavam fora do buracão (a tal vala) e desceu mais, e desceu mais… até uma profundidade, fala de uma profundidade de quase 15 metros, (um buracão que era especifico para escavação de ouro pelos garimpeiros ilegais naquela zona), portanto ele desceu, chegou lá, na verdade foi ver mais de cem corpos, foi difícil contabilizar devido ao cheiro nauseabundo que lá se faz sentir (…) Então ele viu aquilo e voltou. Enquanto volta, descobre outra zona que tinha à volta de 11 corpos novos, onde os abutres sempre se dirigiam (…).”
M-CRV: - Então é na base dessas informações que o jornalista da Lusa faz a notícia e pública…
AS: - “…com certeza, ele não foi ao local na verdade, mas sentiu-se…”
M-CRV: - ...socorreu-se, garantiu-se nas suas fontes…
AS: - “…com certeza, aliás, ele fazia contactos telefónicos e gravando as conversas… e fez aquela primeira publicação cruzando com os dados de que eu dispunha… na verdade ele publicou, andou nas redes sociais, foi uma mentira, foi uma verdade, foi uma mentira, foi uma verdade e mais tarde, como estou na província de Sofala, a televisão portuguesa SIC me contactou uma vez que quando necessário temos colaborado, no sentido de ver se conseguíamos imagens, pequenas filmagens. Lhes disse que bastava que se criassem as condições que faria por do local trazer a verdade. (…). Na madrugada de Quinta-feira já estava eu a deixar Maputo em direcção a Gorongosa e quando…”
M-CRV: - Estavas sozinho nesta investigação?
AS: - “Na investigação não fui sozinho, como jornalistas éramos dois, eu e o Catueira…”
M-CRV: - Então onde te encontras e juntas-te ao Catueira?
AS: - “O Catueira reside em Chimoio já faz tempo… quando eu passava do Muxúngué já fazia contactos, aqueles restritos, trocando posicionamentos e o ponto do encontro seria Inchope. Ele foi o primeiro a chegar mas tínhamos que nos “camuflar” um bocadinho… acabei também chegando, eu me expus, ele saiu donde estava e seguimos no carro (providenciado pelo Órgão), tínhamos um guia local que estava na vila da Gorongosa, o pegamos… rumamos, são cerca de 70 Km da vila para o Posto Administrativo de Canda, não exactamente no Posto Administrativo mas o povoado de Canda (…) então passamos directamente para uma ponteca onde…”
M-CRV: - …portanto isto na Sexta-feira…
AS: - “…na Sexta-feira, passamos um bocadinho para ir a uma ponteca, (…) a meio quilometro, é onde está o buracão dos garimpeiros, ele disse (o guia) que o buracão dos garimpeiros onde se extraia a areia para reabilitar a estrada (…). Escondemos (a viatura) na mata, fomos até ao local, encontramos dois guardas das operadoras de telefonia móvel, conversamos com eles, todos se mostravam desinformados… mas como era numa barraca, tinha gente já com ânimos acelerados e um disse que na verdade ouvira disso e falou de estar essa informação na Internet… disse, ser na zona X, zona Y, falou do cruzamento de Macossa, dizendo que lá cheira mal, quando tu passas a pé vais sentir engasgado, quando passas de carro vais perceber que na verdade passou por um mau cheiro. Nós percebemos que já tínhamos perdido 20 e tal quilómetros para frente, significa que devíamos voltar para traz… já eram 20 horas… mas porque já estávamos decididos em fazer aquele trabalho e já tínhamos feito contactos lá no interior, não podíamos falhar naquele Sábado (seguinte), fizemos tudo por tudo para que pudéssemos pernoitar lá e voltarmos a fazer o trabalho enquanto começasse a amanhecer…”
M-CRV: - Isto na noite de Sexta-feira, …e pernoitaram então em…?
AS: - “…pernoitamos numa mata que até agora, se mostrarmos as fotografias, ninguém acreditaria. Fomos às autoridades locais para ver se conseguiam dar-nos um pequeno albergue, mas quando chegamos ao regulado local percebemos que ele abandonou a sua residência já faz um mês, parece abandonou sua residência porque sofreu uma perseguição, já se dispararam dois/três tiros na sua casa por causa daquelas histórias (…) dos sequestros, desaparecimentos definitivos de pessoas… então (…) ninguém estava lá. Saímos dai, procuramos um sítio para dormir que só podia ser Nhamapaza que estava a 73 quilómetros ou podia ser Gorongosa que estava a 75 quilómetros, a nossa decisão era de levar a viatura, esconder numa mata em que não seria visível e nós abandonarmos a viatura… (…) Dormimos dispersos. Éramos o motorista, dois jornalistas e um guia local. Cada um tinha que dormir a sua maneira, estendido no chão, sem lençol sem nada… fizemos aquilo porque os contactos que já havíamos feitos indicavam que devíamos entrar (na zona) entre às 3 ou 4 horas da manhã porque a movimentação da população poderia despertar muita coisa, fizemos aquilo… mas, porque é uma zona com problemas sérios da rede, não conseguimos entrar naquela hora e só entramos ás 8:00 h…”
M-CRV: - …isto no Sábado…
AS: - “…exactamente, na manhã de Sábado. (…) Criamos condições de moto-táxi ai no mercado de batatas porque não podíamos entrar com a viatura, a viatura manteve-se escondida num sítio, pegamos moto-táxi… corremos para lá, fomos para lá… (…) por volta das 7:00 h já estávamos a encontrar com os guias directos locais, corremos, corremos aquilo tudo com coração nas mãos porque eles já alertavam-nos que lá só poderíamos entrar para uns dois minutos, tínhamos que fazer o trabalho e sair. Mas porque precisávamos de explorar mais, nós insistimos (…) disseram que não havia condições de segurança lá por ser uma zona bastante vigiada… (…)”
M-CRV: - Não é uma zona habitacional…?
AS: - “Não é muito habitacional, apenas lá se pratica o garimpo e pratica-se a agricultura, são pessoas que estão a mais de 5/6 quilómetros (…)”
M-CRV: - …então, chegados ao local?
AS: - “Chegados ao local nos perdemos porque vimos duas pessoas estranhas em frente, os guias disseram que essas pessoas não eram dai… não conhecendo, preferimos desviar entrando dum corta-mato, foi quando disse (o guia) ‘estão a ver essa trilha de carro? Este carro foi deixar novos corpos nesta semana…’ Deixamos os moto-táxis ai e seus condutores… o guia, nós os dois (jornalistas) entramos… entramos, seguimos a trilha e na verdade onde terminava a trilha se tinha deitado novos corpos, à volta de onze, fotografamos… mas aquilo de fotografar a ver se havia ou não alguém por perto… fizemos as fotografias e disse-nos o guia que não podíamos voltar à estrada porque vira pessoas lá (…) como à estiagem e não corre (muita) água, descemos para debaixo da ponte, vimos corpos, muito antes de atravessar a EN1, vimos corpos, fotografávamos, éramos obrigados a pisar os corpos para ir fotografando… enquanto aproximávamos para aquela zona onde está o grande numero de corpos (a tal vala/buracão). Então, foi quando ouvimos o som de duas motorizadas a passarem em cima da ponte (…) passaram para frente… e travaram, disseram ‘não, não, não é aqui, não é aqui, perdemo-nos, perdemo-nos’… voltaram para trás num perímetro de quase 30/40 metros, disseram que ‘não, vamos voltar para trás, perdemo-nos’… (…) dobraram, voltaram e usaram a via que nós usamos para entrar. (…) Penso eu que são as próprias pessoas que guardam aquele local… passaram a uma alta velocidade, chegaram lá, não viram a ninguém, começaram a buzinar (…) buzinaram, buzinaram… foi quando recebemos um telefonema (…) a alertar-nos que ‘amigos por favor saiam de onde estão, saiam a correr porque estão num autêntico risco, à pessoas que estão ai a vossa procura, por favor saiam dai, não me arranjem problemas, eu disse que deviam fazer esse trabalho em menos de dois minutos…’. Infelizmente, muito antes de concluirmos o nosso trabalho, já éramos obrigados a sair… tivemos que sair de lá, debaixo da ponte, a correr mas, a minha intenção era de ir até a principal vala comum… enquanto saíamos a correr ouvimos alguns disparos (…) ouvimos mais disparos já onde íamos, isto é, íamos à principal vala… ouvimos disparos, buzinas, ouvimos sons de motos a nossa trás também (…) saímos a correr, pisamos cada coisas, sobressaímos na ponte, pegamos os nossos moto-táxis e dissemos olha aqui não podemos sair em coro, juntos. Um vai para trás outro para frente… nos dispersamos ai enquanto eles ainda estavam lá dentro… corremos, um em direcção a norte de Sofala, outro correu em direcção a sul de Sofala. Passado algum tempo ninguém tinha rede, ficamos (risos) em pânico durante mais de uma hora de tempo sem saber onde cada um se encontrava e como é que estava. Isto, já ia para as 10:00 h e cada um escondeu-se num sítio que encontrou…”
M-CRV: - Agora, antes de prosseguirmos, no terreno onde estavam os corpos, consegue perceber-se se são de militares das FDS, se são corpos de cidadãos cíveis ou dos homens armados da Renamo? Conseguiu colher algum indício?
AS: - “O indicio provável não tivemos, o que mais nos interessava aquando da nossa saída era de trazer a verdade através das fotografias, mas não pudemos trazer toda verdade, até agora, penso eu que a investigação pode vir a continuar, não conseguimos a verdade porque… ao entrar encontramos corpos dispersos, na verdade estavam lá corpos (…) nus, corpos que já fazem tempo lá, mas a tendência era de provar aquilo que a nossa fonte disse antes da Quarta-feira, isto é, antes da publicação da matéria, era de provar aquilo (…) onde íamos mas não conseguimos chegar até lá por causa do mau movimento que percebemos…”
M-CRV: - …todos os corpos são do sexo masculino? Conseguiu perceber?
AS: - “Dos 17 corpos que fotografamos, apenas um é de uma mulher, destacamos apenas pelas mexas (cabelo), até agora as mexas não apodreceram (…) mas quando descíamos mais só víamos corpos de homens, corpos de homens alguns já apodrecidos, outros fresquinhos, o mais estranho é que de todos os corpos que víamos, a pessoa morria mas depois de eles despirem a roupa, não sabemos na verdade o que era, a pessoa morria de lhe tirar ou arrearem a roupa, é difícil perceber porque...”
M-CRV: - …a razão por que aparecem nus…
AS: - “…exactamente, a razão é que está um bocadinho complexa…”
M-CRV: - ...recordo-me que numa das vezes que falamos, disseste que já estavam a sair do local e que estavam a sentir alguma perseguição…
AS: - “…com certeza (…) sentimos dentro de nós que precisávamos de sair duma forma despercebida, só para saber, apenas eu é tinha pasta de costas, tinha aquela minha roupa porque estava a fazer um trabalho fora da minha casa isto é em Maputo, (…) levei duas três/quatro peças de roupas, mas para o colega que só lhe disse ‘amigo dentro de 30 minutos vamos nos encontrar vamos partir’… por isso só veio com o par de roupas no corpo e seu material de trabalho…”
M-CRV: - Mas agora, no mesmo dia, no Sábado, quando de novo voltamos a conversar, a dado momento disseste que Hanif, se não nos conseguirmos encontrar hás-de ver entre um dos Órgãos de Comunicação… quer dizer, deixaste me transparecer uma ameaça de morte, que poderiam regressar feito cadáveres, mas porque assim tanto…
AS: - “…só para interrompermos o trabalho antes de concluirmos já estávamos a sentir o cheiro da morte, mas porque a vida é muito preciosa, ninguém devia insistir no que já não podia lhe dar bem, é por essa razão que eu lhe disse, olha ainda sinto-me inseguro… (…) Eu fugi para um sentido, o outro fugiu para outro, nosso condutor também desapareceu, usou seu rumo, (…) tentamos nos contactar e não conseguíamos, eu dizia e ele em mensagens, olha se tu morres eu anuncio, eu noticio, se eu morro tu noticias (…) ele conseguiu entrar numa esquina mas viu uma viatura, não vou dizer a viatura que é, a uma alta velocidade, ia para lá, aliás, ia para a direcção onde nós estávamos (…) enquanto eu já onde estava largava a motorizada, pegava um machimbombo de semi-colectivos na tentativa de localizar a ele, lhe buscar (…) naquelas correrias eu vi na verdade, me interceptei com a tal viatura com certos homens, volta de seis homens, nos cruzamos, eu voltei para o nosso ponto de partida onde a gente pernoitou (...) ele disse que não havia parado ai porque seria perigoso e fez quase 17 quilómetros (…) finalmente encontrei-me com ele, até me admirei (…) ele teve que comprar uma camisa por emergência, trocou camisa (…) já no Inchope sentamos, tomamos uma água juntos, começamos a nos contar o trajecto um do outro… apenas perguntamo-nos será que você esta seguro? Ele disse, sim, e você está seguro?, perguntou-me. Disse-lhe estou seguro mas mais seguro estarei quando publicar a matéria (…) dai nos separamos, ele para Chimoio, eu para Beira, e, instruímo-nos para que trocássemos duas ou três vezes de viaturas (Chapas). Ele fez uma vez, eu fiz umas três vezes, acabei chegando em casa por volta das 19:00 h…”
M-CRV: - Não teriam tido informações ou algum contacto em relação ao líder da Renamo, Afonso Dhlakama uma vez que estiveram em Gorongosa?
AS: - “Um contacto directo não, mas tivemos o contacto com alguns próximos dele, penso que são os que o informaram… aliás, quando chegaram disseram que o líder mandou comprimentos e deseja-vos um bom trabalho…”
M-CRV: - Então, isto supõe que o líder da Renamo encontra-se mesmo na serra da Gorongosa?
AS: - “Está na serra da Gorongosa… aliás, quando chegava em casa (na Beira) conversei com a minha editora, disse-me que viu um artigo em que diziam que o líder da Renamo está no Malawi, será verdade? Eu disse que não… pelo menos a conversa que tivemos com alguns garantem que o líder da Renamo está em Gorongosa e mandava cumprimentos…”
M-CRV: - Nessa vossa “empreitada” digamos assim, uma vez que estiveram no epicentro da situação político-militar, conseguiram perceber das populações o drama que nós estamos a viver como moçambicanos? O que é que oferece falar sobre isso?
AS: - “Lá o clima está tenso, embora, por outro lado esteja calmo. Tenso porque as populações não estão à vontade, principalmente quando vê um estranho na zona, porque, quem é? Vem de onde? Está calmo porque as populações conseguem fazer o seu dia-a-dia, vão a machamba, vão ao comércio… mas a situação não está muito boa… Confrontos, uns diziam que ainda não vimos disparos, os disparos que ouvimos são aqueles de um ou dois tiros, são disparos normais pelo menos para aquela zona, o que eles acham de anormal são aqueles tiroteios que levam tempo, aqueles estrondos que significam serem de canhões, de armas pesadas, isso dizem que à duas ou três semanas ainda não se ouviram… mas, dois/três tiros já se houve quase todos os dias… significa que confrontos podem existir mas não de grande vulto…”
M-CRV: - Uma outra coisa… vocês saíram para esta investigação de risco, qual é a garantia ou protecção que receberam dos vossos Órgãos de tutela?
AS: - “Nenhuma, nenhuma garantia, nenhuma garantia na verdade… até agora estamos inseguros porque acredito que até esta hora (…) as autoridades locais já têm toda a informação de quem passou por ai, estão a espera talvez de ouvirem o que é que que teríamos ido fazer, acho que vão saber disso através das nossas publicações…”
M-CRV: - Algum recado para o Governo da Helena Taipo, quando particularmente foi quem disse que fez uma investigação e que apurara que são inverdades, e entanto que Órgãos de Comunicação acusados de difundirem informações não verídicas…?
AS: - “Antes do recado eu gostaria, se tivesse oportunidade de um dia interagir com a Governadora, lhe perguntar afinal de contas senhora Governadora como é que de Quinta para a Sexta-feira a sua equipa trabalhou e constatou que era inverdade? Só de Quinta-feira para Sexta são dois dias, a Governadora na cidade, que está a quase a trezentos quilómetros do local já conseguiu constatar que era mentira e que podia chamar a Conferencia de Imprensa para desmentir?! Não faz sentido a investigação feita em cima do joelho em menos de 24 horas (…). O recado que fica para o Governo é para que intensifiquem mais, intensificando vão saber a verdade…”
M-CRV: - …também penso que um jornalista não seria um maluco ou suicida ao ponto de partir para publicar assuntos tão sensíveis…
AS: - “…o jornalista publicou porque julgou que já tinha subsídios suficientes para publicar e quando mais aprofundava para trazer subsídios viáveis depara-se com um desmentido, o jornalista sente-se menosprezado quando vê o desmentido do que disse ontem… A raiva era aquela de quero mais, quero trazer a verdade, a verdade que tenho há duas semanas e que já foi desmentida e eu também quero voltar a desmentir. A nossa intenção era essa, voltar com mais subsídios, eu penso que publicada a segunda verdade a uma "inverdade", esperamos que o Governo volte a dizer uma coisa que na verdade o que desmentimos é verdade, esperamos que isso aconteça….”
M-CRV: - Diz uma coisa, para se chegar ao local faz-se Inchope…
AS: - “…Inchope, Gorongosa, Canda… Aquilo está dentro de Canda, (…) mais lá para o interior, isto é, fronteira com distrito de Macossa, numa linha entre Sofala e Manica…”
M-CRV: - … da Estrada Nacional ao local, está muito para dentro? São 20Km, 30Km?
AS: - “Os vestígios, isto é, os corpos espalhados, estão a menos de um quilómetro da estrada, a ponte que usamos para aceder (ao local) atravessa a EN1, isto é, a menos de um quilómetro (…) tens vestígios (...) entrando mais para a direita é onde já podíamos ver o grande cenário…”
M-CRV: - … então não está num local inacessível?
AS: - “O local não é muito inacessível tratando-se dum cruzamento, de Macossa/Caia, Caia/Garongosa. (…) Mas porque agora ninguém circula lá, ninguém vai a Macossa, não tem meios de transporte lá … é inacessível porque ninguém pára (naquela zona)…”
M-CRV: - …portanto esta placa (conversando vendo as fotos) que estamos a ver Caia/Macossa, é daqui onde se faz…
AS: - “…sim, onde desvia-se, se tu fores a ver, à direita é a EN1, (indo) recto…, à esquerda é essa rua que dá acesso a Macossa que, se tu fores a seguir, essa rua termina e vem uma (estrada) terra batida… essa é a ponte (foto) onde em baixo estão (alguns) os corpos…”
M-CRV: - É exactamente na…
AS: - “…nesta ponteca, é nesta ponteca… aqui, se ampliares a foto, vês o nosso moto-taxista…”
M-CRV: - Então, foi daqui, desse cruzamento, que vocês entraram para o interior?
AS: - “Sim, nós entramos, fizemos quase uns 100 metros e, a partir dai, tivemos que já voltar para debaixo dessa ponte (indicando na foto), porque não podíamos descer da ponte devido ao movimento que vimos, então devíamos entrar…”
M-CRV: - … mas aqui em cima (da ponte, na estrada principal) vocês sentiram o cheiro dos corpos decompostos?...
AS: - “…em cima que se sente mais o cheiro porque junta-se com um pouco de água do rio, então o cheiro está mais nauseabundo aqui (do) que lá… Os abutres saiam de lá (onde concentra mais corpos, vala/buracão) passando a EN1 para cá, onde à novos corpos…”
M-CRV: - Nesta foto parece que o corpo tem a cabeça atada…?
AS: - “A cabeça dele está atada, os braços também estavam atados”.
M-CRV: - Mas isto é fardamento militar, não?
AS: - “Não conseguimos ver porque traz essas calcas ‘jens’… e a camisa nem tinha… as calças estão pretas, não conseguimos ver que calças… Mais acima conseguimos ver outros corpos, todos não tinham nem sapato nem chinelos pelo que se vê… o que torna mais estranho…”
M-CRV: - …então estas fotos dos corpos, todas, são de debaixo da ponte…?
AS: - Uma parte dos corpos encontramos exactamente por baixo da ponte e há uns outros num outro lado, isto é: por onde começamos, é fora da ponte, e outros mais para o interior…”
M-CRV: - … qual é a distância?
AS: - “… mais ou menos 100 metros é onde estão… e de lá, voltando, é que descobre-se muitos já na parte inferior da ponte…”
M-CRV: - …mas, não se consegue contabilizar exactamente quantos corpos, contudo o número avançado…?
AS: - “…o número avançado é onde já alcançávamos a vista, como é uma mata um bocadinho fechada, tu consegues ver isto, aquilo, mas um pouco fechadinho… os corpos que estão espalhados… os que consegues contabilizar são esses que vimos por fora, mas lá para a profundidade já é difícil, era preciso abraçar uma árvore para poderes espreitar, foi lá onde já não tivemos acesso…”
M-CRV: - …então, nestas fotografias aqui (as presentes, exibidas) não existe (a tal vala/buracão)?
AS: - “…não, a foto de lá não existe, não existe porque foi já quando tivemos o alerta de nos retirarmos com urgência…”
M-CRV: - …então, aqui não podemos dizer que são corpos que estão numa vala comum?
AS: - “Corpos numa vala comum infelizmente não temos provas, não temos provas… Soubemos que iríamos chegar até lá mas não conseguimos chegar (lá)…”
M-CRV: - Depois desta descoberta documentada tiveram algum contacto com alguém da autoridade?
AS: - “Anda não, ainda não porque estávamos num clima tenso entre nós, mas esperamos com tempo podemos trazer a reacção das autoridades locais, das autoridades governamentais…”
M-CRV: - E em caso duma solicitação…?
AS: - “…solicitação em que sentido mais ou menos…?”
M-CRV: - …facultar algumas informações sobre o caso…
AS: - “…é preciso solicitar-nos com um objectivo concreto, é preciso solicitar-nos com objectivo concreto…”.
O NOSSO COMENTÁRIO
- A mentira caindo por terra?
Portanto, depois de desmentidos organizados pelo Governo do distrito da Gorongosa e da província de Sofala surgem evidências no terreno de que afinal houve cidadãos assassinados e abandonados na zona do rio Muera na Gorongosa. É uma situação embaraçosa para o Governo de Moçambique já que seus desmentidos anteriores quanto a existência de refugiados no Malawi também caíram por terra após denuncias consistentes da imprensa internacional e nacional.
Uma coisa é gerir informação salvaguardando os interesses nacionais e outra coisa é encobrir violência e abusos aos direitos humanos e sobretudo à vida.
Moçambique precisa com urgência de ver o Governo e os partidos políticos encarando os factos e impedindo que a espiral de violência aumente.
É preciso que as armas se calem e que se elimine a sensação de que existem esquadrões da morte. É preciso que se pare com os ataques mútuos e também os de cariz racista e tribal que começam a circular nas redes sociais.
Neste momento grave é preciso que haja responsabilidade e contenção. A vida humana tem valor independentemente de quem seja.
Os assassinatos não esclarecidos de cidadãos devem deixar de ser a prática comum. A responsabilidade inalienável é do Governo e dos partidos políticos armados e desarmados. (MHM // Magazine CRV)
.
[*] Pode ler aqui: https://www.facebook.com/CRVmagazine/posts/1030053300411667
[**] Pode ler aqui: https://www.facebook.com/CRVmagazine/posts/1029467587136905
In https://www.facebook.com/unai.kambumamatsangaisse
NOTA: Porque esperam a LDH, a CNDH e outros para se meterem a caminho, com jornalistas e irem ao local? Certamente que os não matarão se forem de cara aberta e desempenhando as vossas funções e responsabilidades.
Fernando Gil
MACUA DE MOÇAMBIQUE

Sem comentários:

Enviar um comentário