"Deus criou as pessoas para amarmos e as coisas para usarmos, porque então amamos as coisas e usamos as pessoas?"



terça-feira, 3 de maio de 2016

Sobre o 25 de Abril

 


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CARTA A MUITOS AMIGOS
Há 42 anos atrás os militares portugueses agrupados no Movimento das Forças Armadas MFA-derrubaram o regime colonial fascista português.
Significativamente as primeiras palavras do Manifesto afirmavam:
«Após treze anos de guerra colonial de novo o governo quer fazer das Forças Armadas o bode expiatório da sua política.»
Bode expiatório e treze anos referem-se às ordens dadas por Salazar ao General Vassalo e Silva, governador de Goa e Comandante-Chefe de perto de 5.000 homens das forças portuguesas, sem armas pesadas, aviação ou marinha e cercados pelo enorme e bem armado exército indiano.
Soldados portugueses ou mortos ou vitoriosos, ordenara o ditador autista ao General Vassalo e Silva.
Nenhum comandante responsável sem meios para combater ordena o suicídio de milhares de homens.
Salazar recusou o Conselho de Guerra solicitado pelo General e despromoveu-o disciplinarmente de General para soldado raso. Castigo que o 25 de Abril removeu, restabelecendo a vítima em todos os seus direitos.
Em Abril de 1961 o General Botelho Moniz, apoiado pelos altos comandos do Exército e pelo Marechal Craveiro Lopes tentaram persuadir o Almirante Thomás, Presidente da República a reformar Salazar e substituí-lo. Todos foram demitidos e submetidos a prisão domiciliária.
Deteriou-se de ano para ano a situação, com as guerras em Angola, Guiné (B) e Moçambique. A maior parte dos portugueses em idade militar ou fugia do país ou desertava. Muito maior os números de desertores e refractários do que os dos incorporados. Nunca aconteceu tal em parte nenhuma do mundo. Anuncia-se a publicação em Portugal de um livro sobre estes desertores e refractários. Entre eles o grande poeta e dirigente socialista Manuel Alegre, o Major Ervedosa 2.º Comandante da Força Aérea em Angola, o médico militar moçambicano Hélder Martins que desertou no Reino Unido, o médico português Dr. Pádua etc.
Não o fizeram por medo ou cobardia, mas sim porque recusavam participar numa guerra ignominiosa, inglória e com derrota anunciada.
Salazar que nem dentro do país viajava senão de Lisboa para Santa Comba Dão e apenas se deslocara ao estrangeiro nos anos 20 a Bruxelas, não conhecia Portugal, o seu povo, as colónias nem o mundo. Vivia encerrado na sua soberba.
Respondendo à proposta das FPLM Nova Década Novos Combates em Junho de 72, o CC reunido em Dezembro de 72 durante 26 dias, respondeu com o texto e palavra de ordem: Ofensiva Generalizada em todas as Frentes. Não houve mensagens, ofertas, grupos culturais quando estava reunido. Isso fazia-se cá fora e após as sessões. As reuniões serviam para trabalhar e criar pensamento comum.
Pouco mais de um ano depois o CEMG das Forças Armadas portuguesas Costa Gomes visitando Moçambique constatou e afirmou que as forças armadas em Moçambique estavam à beira do colapso. Palavras textuais que transmitiu a Marcello Caetano e que me contou uns anos depois.
Caetano não fazia parte dos autistas, viajava, ouvia, lia, raciocinava e sabia mas na prática encontrava-se prisioneiro da chamada Brigada do Reumático comandada pelo Chefe do Estado, o Almirante Américo Thomas, que já havia castigado o General Botelho Moniz, o Marechal Craveiro Lopes e demais generais que viam com horror a aventura das guerras coloniais. Os generais do reumático jamais haviam combatido em qualquer guerra, mas serviam como cães de guarda do salazarismo.
Face a Costa Gomes e a Spínola que também não concordava com a guerra, Caetano demitiu o Chefe e Vice-Chefe do Estado do Maior General e designou elementos do reumático.
Estava assinada a sentença de morte do regime e aberto o caminho para o 25 de Abril.
Chissano que trabalhava em Inteligência no exterior, diplomata bem nato, eu que trabalhava com o falecido Odallah e o Salésio, na Contra- Inteligência e Inteligência no interior, tivemos conhecimento dos preparativos do MFA e sabíamos que o indicativo final para o golpe na segunda metade de Abril, seria dado pelo Leite de Vasconcelos na Rádio Renascença (expulso pela PIDE de Moçambique e Director da RM posteriormente, após o Maguni) com a canção Grândola Vila Morena, do Zeca Afonso também expulso pela PIDE de Moçambique,.
Todas as noites na segunda quinzena de Abril escutávamos essa emissão da Rádio Renascença, e na noite de 24 para 25 ouvimos a canção.
De imediato informei o Presidente Samora. O Governador colonial em Moçambique, Pimentel dos Santos proibiu que se difundisse a informação no nosso país.
O MFA deteve o governador e difundiu a boa nova.
A FRELIMO difundiu um comunicado, preparado pelo Jorge Rebelo, saudando a queda do regime fascista e advertindo que apenas o reconhecimento ao nosso direito à independência total, completa e imediata poria fim à guerra.
Nos primeiros dias de Maio, Mário Soares, mais tarde Ministro dos Negócios Estrangeiros do Governo de Spínola e Palma Carlos, solicitou um encontro a mando de Spínola para dois depois em Bruxelas. Samora mandou responder que datas e locais seriam objecto de acordo prévio.
Acordou-se finalmente o primeiro encontro em Lusaca a 6 de Junho de 1974. Houve fracasso total. A delegação portuguesa tinha um mandato para apenas discutir o cessar-fogo. A FRELIMO através do Presidente Samora declarou firmemente que não fazia sentindo discutir-se isso sem um acordo prévio reconhecendo os direitos do povo moçambicano, razão porque se havia iniciado a guerra de libertação.
A intensificação da guerra, as rendições sucessivas de bases portuguesas, a diplomacia da FRELIMO conduziu à saída do impasse.
Samora enviara a Portugal o saudoso Aquino de Bragança, jornalista com reputação internacional, com a missão de identificar quem detinha o poder real para negociar com seriedade. Aquino identificou o MFA.
Na Holanda Melo Antunes, dirigente do MFA encontrou-se com José Óscar Monteiro e identificaram-se os passos que deviam dar-se.
Em Agosto, vindos secretamente a Dar-es-Salam, encontraram-se com uma delegação nossa dirigida pelo Presidente Samora e integrando Chissano, Rebelo, Óscar eu e outros. Começaram por protestar contra o que apelaram a traição de Namatil. Tratava-se de uma base portuguesa perto da fronteira tanzaniana que, cercada pelas nossas forças recusou combater e rendeu-se. O General Ntumuke e Salésio dirigiram a operação. Samora mandou-me difundir a gravação da rendição e as declarações dos prisioneiros de guerra, começando pelo seu comandante um alferes miliciano. Estava claro que não houvera qualquer traição, mas sim rendição. Foi dada cópia da gravação aos portugueses, Spínola recusou ouvir.
Estava aberto o caminho para a assinatura a 7 de Setembro de 1974 do Acordo público sobre a nossa independência e cessar-fogo e o secreto sobre a troca de prisioneiros. O resto trata-se de coisas recentes, incluindo a fantochada da revolta dos ultras, comandada por Spínola. Há que repetir, porém e sempre a Luta Continua, hoje contra os gananciosos e terroristas.
P.S. Dia Feliz para os moçambicanos quando os pilhadores devolverem e forem para a cadeia. Em toda a parte soam os nomes dos super gatunos e todos esperam Justiça. Queremos que paguem tudo e cadeia com eles.
O Notícias a 21 de Abril pediu-me desculpas pela difamação que fez de mim, a mando do G40. Que o G40 e sequazes ou herdeiros saibam que não os poupo e levo-os a tribunal. Basta de nojeiras!
SV
O PAÍS – 03.05.2016

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