Canal de Opinião por Noé Nhantumbo
Nem se serve da comunicação social pública para mentir.
Os “ensaios pela paz”, assim se deveria chamar aos sucessivos convites para diálogo emitidos por diversas entidades ao Afonso Dlahkama.
E são ensaios tristes, porque continuamente não tocam no essencial.
Tudo tem sido feito de maneira a enganar o outro. Há muita falta de hombridade, e sem isso a confiança não se constrói. Há uma abundante e evidente falta de respeito entre os que devem dialogar. Há um manifesto complexo de superioridade e de infalibilidade emperrando coisas que na verdade não são assim tão complexas.
Quando houve um encontro de cavalheiros entre FJN e AMMD, parecia que as palavras pronunciadas valiam alguma. AMMD, através do seu partido, remeteu uma proposta à Assembleia da República onde apresentava um conjunto de pontos com vista a ultrapassar-se a crise pós-eleitoral numa perspectiva de estabelecimento de autarquias provinciais.
Não honrando a palavra no que parecia um “acordo de cavalheiros”, a Frelimo ignorou o seu chefe ou demonstrou que ele não mandava em coisa alguma. A Comissão Política instruiu a Bancada Parlamentar da Frelimo para chumbar liminarmente a proposta da Renamo.
Anteriormente viram-se os recuos no CCJC, que estabeleceriam um exército apartidário, e o ponto relativo às questões económicas não foi tocado entre os negociadores.
É preciso que se comece a falar sério sobre o que separa as partes e o que constitui ponto permanente de discórdia em Moçambique.
O “Empoderamento” Económico Negro em regime de exclusividade é mãe dos conflitos político-militares e das fraudes eleitorais. A existência de dois partidos armados deve ser vista como estratégia de manutenção do poder pela Frelimo e uma resposta contra isso pela Renamo.
Não haveria fraude eleitoral se existisse uma PRM republicana e não partidarizada.
Não haveria dois exércitos no país se tivesse havido vontade e coragem de desmantelá-los aquando do início da implementação do AGP de Roma.
A resposta extremista de falanges afectas ao partido no poder violentando e impedindo actividades políticas de partidos da oposição, um facto verificável em Gaza, em Inhambane, em Manica e noutros pontos do país.
As marchas supostamente da sociedade civil pela paz são exercícios caricatos e, na verdade, contra a paz, pois estes pastores de igrejas e membros das organizações sociais da Frelimo negam-se a debater as causas dos conflitos que perduram no país.
Quem quiser ver, encontra um panorama político e económico dominado e controlado por um grupo poderoso de membros da Frelimo, que não admite qualquer partilha ou cedência do “status” que sempre teve.
Em tudo o que é cargo público de relevo, os designados e nomeados são militantes, membros ou simpatizantes “seguros” da Frelimo.
Fala-se de democracia, mas o que existe é democracia medíocre, mascarada, poluída por uma mentalidade de partido único que não morreu em certas mentes.
O tipo de negociatas que inundam a praça pública feitas em nome do Estado para benefício privado atinge cúmulos jamais vistos.
Ninguém tem problemas em admitir e aceitar que as pessoas enriqueçam, mas quando o que acontece é um assalto puro e simples às potencialidades do país, convém que se diga, porque é verdade.
As meninas, senhoras, meninos e senhores com batina ou com camisete branca simbolizando a paz e marchando por ela são instrumentos concretos dos que se negam a compartilhar Moçambique.
Existe uma ofensiva permanente de enriquecimento ilícito rápido que ofusca as chamadas boas intenções de alguns segmentos políticos.
Não nos enganemos, pois está acontecendo todos os dias e em detrimento dos interesses da maioria excluída.
Tudo o que é negócio, em qualquer que seja a área em que o Estado intervenha, está tomado e distribuído entre pais, irmãos, filhos, primos, cunhados de um grupo restrito de pessoas. São as mesmas pessoas em tudo, como se elas fossem os únicos moçambicanos.
Esta nossa elite que se elevou à categoria de membros da categoria dos milionários tem interesse de que a democracia não vingue, porque, com isso, os seus privilégios e saques minguariam. A sua precedência no “procurement” deixaria de existir.
As suas acções nas “joint-ventures” seriam escrutinadas e sancionadas.
Os que cantam a música antiga do defunto DIP da Frelimo, propaganda anti-Renamo em alto volume, esquecem-se de que, aquando da guerra civil, essa música foi tocada, e deu no que deu. Por mais que ilustres historiadores e fazedores de opinião nos queiram vender a imagem de que a Renamo é uma criação dos regimes racistas e de saudosistas portugueses, isso não ganhou a tracção desejada, como o expressam os resultados eleitorais sucessivamente alcançados.
Mesmo no que se refere ao MDM, que não é partido armado, já surgiram em público figuras de relevo da Frelimo e seus analistas acompanhantes defendendo que ele constituía um perigo, pois, em caso de vitória eleitoral, enveredaria pela vingança.
A situação actual demonstra que a reconciliação nacional não aconteceu nem tem sido perseguida com vigor.
Os “pastores” e organizações da sociedade civil têm uma acção ao estilo de bombeiros no que se refere à paz e reconciliação. Surgem quando a crise rebenta, mas não trabalham todos os dias na promoção da concórdia entre compatriotas.
Este país pode ser melhor, e isso pode começar a acontecer. Mas ninguém se engane quanto às condições para que isso ocorra.
Respeito, hombridade, verticalidade, seriedade, humanismo, moral, ética, repelem a arrogância e a prepotência que reinam no país.
Aos moçambicanos não interessa conhecer os pactos que tenham sido assinados entre os “libertadores” ou entre os “combatentes pela democracia”. O que importa é que as pessoas se convençam de que o país é de todos os moçambicanos.
A força e teimosia de usufruir do país em regime de exclusividade continuará a minar o ambiente, e não há diálogo que possa surtir os efeitos ditos desejados.
É preciso trazer as pessoas para o diálogo, mas quem quer diálogo “corta as pernas” aos que cultivam o ódio, especialmente na comunicação social pública e na privada.
A pretensa infabilidade, a arrogância são contrárias à paz.
Parem as marchas pela paz, e comecemos a dialogar, cada um a seu nível, e estendamos esse movimento no país como forma concreta de pressão.
Cada deputado no seu círculo eleitoral deve ser questionado sobre a razão dos impasses em sede de Parlamento aprovar legislação que traga paz e sossego.
Afinal estes compatriotas foram eleitos para alguma coisa. (Noé Nhantumbo)
CANALMOZ – 08.03.2016
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