João Cabrita nasceu na Beira e, após a independência nacional, saiu do país, tendo vivido em Portugal, África do Sul e há mais de 30 anos vive na Suazilândia. Em 2005, aventurou-se na escrita, tendo lançado o livro “A Morte de Samora Machel”, que traz uma versão diferente da comum sobre a tragédia de Mbuzini
O que o levou a escrever sobre o assunto?
Este foi um acidente que se tornou num caso político e isso tornou o caso mais apaixonante e eu, por ter seguido todo aquele processo inicial da investigação, da polémica em torno do processo de investigação, nomeadamente, a forma como seriam extraídos os dados das caixas negras do avião e até a fase de elaboração do relatório, decidi que seria oportuno escrever sobre esse tema, uma vez que em Moçambique o tema nunca foi aprofundado. Falava-se sempre na questão de o acidente ter sido provocado por um aparelho falso, o chamado radiofarol“VOR” falso e falava-se também na implicação da África do Sul como causa fundamental deste acidente, mas não se aprofundava a questão dos factos desse acidente, factos esses apurados pelas três partes. Portanto, eu tive acesso ao relatório da comissão de inquérito sul-africana, que ao abrigo da Convenção de Chicago, que rege este tipo de acidentes, é o Estado de ocorrência do acidente que institui a comissão de inquérito e é esse Estado que publicou o relatório da Comissão de Inquérito. E tive acesso, também, ao Relatório Factual do Acidente, neste caso, foi um relatório unânime, assinado pelos três países e esse relatório, só por si, ilustra claramente o que se passou naquele voo do dia 19 de Outubro de 1986 e eu achei que esses pormenores, esses factos contidos no relatório, não eram de conhecimento geral em Moçambique.
E esses dois relatórios, o dos Factos e o da Comissão sul-africana de Inquérito, foram publicados um ano depois da tragédia de Mbuzini. Gostava que esclarecesse o que distingue um relatório do outro?
Ao abrigo da Convenção de Chicago, que também é conhecida como sendo a Convenção da ICAO, o Estado de ocorrência do acidente nomeia a comissão de inquérito e de acordo com a lei sul-africana da aviação, o Estado de ocorrência também nomeia uma equipa investigadora que vai ao terreno recolher todos os dados do acidente e é fundamental na elaboração desse inquérito o conteúdo das caixas negras. O relatório factual foi, portanto, compilado pelos investigadores de Moçambique, da União Soviética e da África do Sul. Foi um relatório unânime e que no final seria apresentado perante da comissão de Inquérito sul-africana. Ao abrigo da Convenção de Chicago, Moçambique, como país de registo da aeronave, tinha o direito de nomear observadores para estarem presentes durante a fase de inquirição propriamente dita; o mesmo direito aplicou-se à União Soviética, como país de fabrico da aeronave. Embora a Convenção de Chicago seja muito precisa nesse aspecto da nomeação de observadores, convém realçar que a Comissão de Inquérito sul-africana foi mais além dessa cláusula e conferiu ao Estado Moçambicano e à União Soviética o direito de não só nomearem observadores, como também apresentarem factos, de acarearem testemunhas perante essa comissão. Como é sabido, a União Soviética, no dia em que assinou o Relatório Factual, decidiu não participar nessa fase de inquirição; Moçambique, que inicialmente estava disposto a participar nessa fase de inquirição, acabou também por se retirar, posteriormente à decisão da União Soviética. De qualquer forma, a comissão de inquérito do país de ocorrência continuou com os trabalhos e publicou o relatório na versão preliminar, que foi enviado para Moçambique e para a União Soviética para que fizessem os comentários que achassem apropriados.
E este Relatório Factual visava trazer à superfície o que aconteceu, sob o ponto de vista prático, naquele voo…
Sim sim! Com recurso às caixas negras, uma das caixas negras é o gravador digital dos dados técnicos do voo. Com recurso a essa caixa negra reconstituiu-se toda a trajectória do voo, o comportamento do voo - o aspecto técnico. A outra caixa negra, que era o gravador da cabine de comando, permitiu extrair os últimos 30 minutos da conversa dentro da cabine e também outro elemento importante foi a gravação das comunicações entre a Torre de Controlo do Aeroporto de Maputo e o avião. Portanto, isso tudo foi integrado no Relatório Factual.
Podemos considerar que isso, per si, dá uma importância maior a este relatório, até porque acabou por ser considerado no relatório da Comissão de Inquérito sul-africana. O que é que este Relatório Factual trouxe de relevante para o esclarecimento das causas do acidente de Mbuzini?
Tratando-se de um acidente eles foram detectar quais teriam sido as causas desse acidente e detectaram inúmeras falhas naquele dia, tanto no voo de partida de Maputo para Mbala, como de regresso de Mbala para Maputo. Entre as falhas que detectaram é que não foi feito o plano de voo de Mbala para Maputo – essa é uma questão obrigatória para qualquer voo. No voo de partida de Maputo para Mbala, o plano de voo foi feito cerca de 10 ou 15 minutos antes da hora de partida. Isso constitui uma violação do protocolo dos voos presidenciais em vigor na então República Popular de Moçambique, que dizia que o plano de voo de um voo presidencial devia ser feito com pelo menos 24 horas de antecedência pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros. Portanto, foi feito momentos antes da partida. No voo de regresso, que é importante, a primeira falha técnica que detectaram foi que o voo não tinha combustível regulamentar para aquele voo.
Em termos práticos significa que tinha combustível apenas para partir de Mbala para Maputo e não o suficiente para um trajecto de recurso, caso não fosse possível aterrar em Maputo?!
Exactamente isso. O regulamento da aviação civil diz que o avião tem de ter combustível para chegar ao aeroporto de destino e na eventualidade de surgir qualquer imprevisto, seja mau tempo ou motivos de segurança, o avião tem de ter combustível para desviar para o chamado aeroporto alternante e de acordo com o protocolo dos voos VIP em vigor na República Popular de Moçambique, a Beira era sempre o aeroporto alternante. O que a equipa investigadora constatou e a comissão de inquérito corroborou foi que o avião não dispunha de combustível suficiente para desviar para a Beira. Portanto, há uma expressão utilizada pelos investigadores de acidentes de viação que diz que “um acidente é sempre uma acumulação de erros”. O primeiro erro detectado aqui foi a questão do combustível, para além da falta do plano de voo e essa acumulação de erros, por vezes, tem um efeito de bola de neve e vão influenciar, como neste caso, a tripulação a cometer outro tipo de erros.
Outra questão que salta à vista é, se podemos considerar, uma negligência na comunicação entre o pessoal de cabine e a Torre de Controlo do Aeroporto de Maputo e até entre o pessoal de cabine, no momento em que já se fazia a descida por aproximação ao Aeroporto de Maputo. Estes elementos foram considerados importantes para o acidente?
As comunicações entre a Torre de Controlo de Maputo e o avião começaram por ser boas quando o avião entrou no espaço aéreo moçambicano, cerca das 21 horas de Moçambique. Eles forneceram indicações que deviam constar do plano de voo, como a hora de partida de Mbala e a previsão de chegada, o número de passageiros que levava a bordo e que a bordo ia o Número 1, que é o Presidente da República. A Torre de Controlo anotou e forneceu o Boletim Meteorológico ao avião, válido para aquela altura e também deu permissão para o avião iniciar a descida em direcção a Maputo, mas deixou claro: “desçam até aos 3 mil pés de altitude ou até quando tiverem as luzes da pista à vista”. Este é um procedimento normal, de rotina, faz parte das cartas de navegação. Portanto, decorreu tudo normal entre a Torre de Controlo e o avião, só mais tarde, quando surgiu uma complicação no momento da aproximação final é que houve uma certa dificuldade de compreensão entre ambas as partes sobre o que se passava naquele momento, nomeadamente, as dificuldades que a tripulação estava a ter para localizar a pista do aeroporto e que não foi bem entendido pela Torre de Controlo e isso gerou uma certa confusão. A dada altura a Torre de Controlo dá uma permissão para o avião aterrar numa pista que era oposta à aquele que tinha sido previamente planeada pelo comandante – queria fazer uma aterragem por aproximação directa à pista 23, que é a pista para quem, por exemplo, vem do Norte de Moçambique, é aquela que temos à nossa frente. E a dada altura a torre de controle dá autorização para o avião aterrar na pista cinco, portanto, do lado oposto e isso gera uma confusão e leva o comandante a perguntar “que pista é essa? Eu estou com a intenção de aterrar na pista 23.”
- Está documentado também que oito minutos antes da hora prevista, o piloto faz um desvio do avião à direita, ao mesmo tempo que a tripulação recebia uma comunicação de um VOR, que é até aqui considerado um VOR falso. Esses elementos podem ter sido determinantes para que o avião saísse da rota do aeroporto de Maputo até despenhar-se em Mbuzini?
- As pessoas, às vezes, têm a ideia de que o avião é atraído por um VOR. O VOR existe, está lá, os pilotos, neste caso o comandante ou o co-piloto, sintonizam o VOR que pretendem seguir. Portanto, é por iniciativa dos pilotos que o avião segue em direcção ao VOR, não é que o avião seja atraído. E de facto essa volta prematura à direita foi oito minutos antes da hora prevista, o que levou o comandante a questionar a razão daquela volta, porque segundos antes o navegador tinha dito que “estamos a 100 km de Maputo”. Ora, a volta que o piloto tem de efectuar à direita, em direcção à pista, é feita à metade dessa distância, mais ou menos. E o navegador diz que “o VOR indica essa direcção”. Portanto, alguém dentro do avião sintonizou a frequência do VOR. É indiscutível que o avião se orientou por um VOR. Agora surge a questão do VOR falso, como acabou de referir. Isso é uma especulação porque não há indícios claros de que se tenha tratado de um VOR falso. A teoria do VOR falso avançado pela parte soviética é que era um VOR a transmitir na mesma frequência da estação VOR do aeroporto de Maputo, mas isso é uma pura especulação porque se o comandante do avião tivesse cumprido com os procedimentos regulamentares de uma descida, em que ele tem de fazer a reverificação das listas, nomeadamente, há uma lista que consta para a descida, há uma lista para a aproximação à pista, há uma lista para a aterragem, até ao momento em que o avião estaciona na placa da terminal. É todo um processo que tem que ser cumprido. O procedimento é feito em voz alta e fica gravado na caixa negra da cabine. O piloto pergunta, por exemplo, altímetro barométrico, pergunta receptor VOR número 1, número 2. O co-piloto que está sentado à direita do comandante olha para os instrumentos, verifica se aquela frequência é a pretendida para a aterragem no aeroporto de Maputo e diz em voz alta “verificado”. E mais: o co-piloto tem os auscultadores em sintonia com a estação VOR do aeroporto que regularmente está a transmitir o respectivo indicador.
Quando os investigadores foram fazer as escutas da gravação de cabine – uma das caixas negras – verificaram uma coisa muito simples: o comandante não cumpriu com esse regulamento obrigatório, de rotina, para qualquer voo, seja de dia ou de noite, faça sol ou chuva. Ele não verificou qual a frequência que estava seleccionada no receptor VOR do avião. O co-piloto, em vez de estar em sintonia com a estação VOR do aeroporto de Maputo para ouvir o indicador em código Morse, estava a escutar, desde as 21h00 até ao momento da colisão, às 21h25, hora de Moçambique, estava em sintonia com uma estação de rádio da União Soviética, através do rádio de alta frequência de bordo. Às 21h00 estava a transmitir noticiário, depois seguiu-se um programa musical. Tudo isso ficou gravado na caixa negra. Por isso é que eu digo que quando se fala da existência de um VOR falso, está-se a especular.
- Verdade, porém, é que há um VOR do aeroporto de Matsapa, na Suazilândia, que na altura tinha uma frequência próxima a do aeroporto de Maputo que foi sintonizado pela tribulação e que provavelmente tê-los-ia induzido a seguirem por uma rota diferente da do aeroporto de Maputo. Este elemento não configura o tal VOR falso?
- Essa é a opinião expressa pela comissão de inquérito sul-africana, também pela equipe investigadora sul-africana, quando eles detectaram a célebre frase “o VOR indica essa direcção”. Quando o investigador-chefe da parte sul-africana regressou à África do Sul, ele entregou a gravação e a transcrição e também a tradução aos laboratórios competentes da África do Sul para verificarem se estava tudo em condições. Foi nos laboratórios da África do Sul que se detectaram falhas na transcrição. Portanto, foi essa frase que eles detectaram e em conversa com as delegações dos três países, em discussões numa reunião, em Joanesburgo, em finais de Dezembro de 1986, a parte sul-africana disse “a última explicação que nós vemos para esta volta prematura à direita é que este voo sintonizou por engano ou então alguém, o piloto ou o co-piloto, por uma questão de orientação, sintonizou temporariamente a frequência do VOR de Matsapa para estabelecer a posição em que se encontrava” e como o sistema soviético da tripulação quem navega o avião é o navegador, quando foi seleccionada a frequência VOR no receptor, ou por engano, dada a proximidade das frequências entre Matsapa e Maputo (o VOR de Matsapa tem a frequência 112.3 MHz e o VOR de Maputo tem a frequência 112.7 MHz), portanto, a diferença decimal. Segundo a comissão de inquérito sul-africana os algarismos do alfabeto russo, o 3 e o 7, são muito semelhantes. Pode ser que devido à fraca iluminação dentro da cabine e também, devido ao facto de o receptor VOR não ser iluminado, que a pessoa que sintonizou a frequência ter feito o erro de seleccionar o decimal errado e o avião seguiu na direcção errada. Aqui, mais uma vez, a importância da verificação das listas que não foi feita. O navegador efectuou a manobra à direita – assim se prova porque o comandante perguntou “estamos a virar?”, quer dizer, ele virou sem a permissão do comandante.
- Há um outro momento bastante crítico, documentado no relatório da comissão de inquérito da África do Sul. É que durante a descida por aproximação, o pessoal de cabine estava envolvido numa conversa banal, em que até falava da divisão de Coca-cola e cerveja que traziam da Zâmbia…
- Isso ficou gravado numa das caixas negras. Precisamente segundos depois do avião ter feito aquela volta prematura à direita, há uma fase de encomenda de bebidas para os tripulantes levarem para casa. Isso, numa fase crucial do voo, que exige que tudo que se discute dentro de uma cabine de voo seja apenas e somente, relacionado com os preparativos de uma descida, de uma aterragem. É o que na gíria da aviação é conhecido como “cabine estéril”.
Americanos não queriam colaborar nas investigações para não serem conotados
Logo após o acidente de Mbuzini, a África do Sul solicitou apoio da ICAO, da Inglaterra e dos Estados Unidos da América (EUA), através do departamento de investigação de acidentes de aviação. Entretanto, inicialmente, os EUA recusaram-se a fazer parte da investigação, tal como o fez a Inglaterra, o que abriu espaço para concluir-se que havia conspiração dos americanos.
- Qual é a explicação para essa decisão inicial dos EUA, mas que mais tarde viria mudar, ao integrarem a equipa de investigação?
- Tal como o disse na primeira edição do meu livro, eu interpretei a recusa dos Estados Unidos da América em prestar apoio/ajuda aos sul-africanos para fazer esta investigação, pelo facto de eles não quererem aparecer em público como estando a servir o regime do apartheid, que era um regime condenado, principalmente numa altura em que estava em marcha toda uma campanha a apontar o dedo à África do Sul como sendo o responsável deste acidente.
- Mas figuras como Sérgio Vieira têm uma posição diferente dessa. No caso em particular, acredita na teoria de conspiração do Regime do Apartheid. Como analisa isso?
- A única leitura diplomática que o senhor Sérgio Vieira fez relacionada com essa posição dos Estados Unidos e da Inglaterra, em não prestar a colaboração pretendida pelos sul-africanos, é uma leitura precipitada. Como sabe, nos Estados Unidos existe uma Lei de Liberdade de Informação. Ao abrigo dessa lei e no âmbito dos preparativos para a segunda edição do meu livro, eu solicitei a divulgação de documentos do Departamento do Estado (norte-americano), cobrindo o período que vai de 20 de Outubro de 1986, portanto, o dia a seguir ao acidente, até Julho de 1987 que foi o mês que a comissão de inquérito divulgou o relatório final sobre o acidente. Da leitura que fiz desses documentos, posso concluir que o senhor Sérgio Vieira fez uma leitura precipitada. Não há nada nos documentos que indique uma conspiração dos Estados Unidos, como ele diz. Se bem que ele diga e frise que esse suposto envolvimento dos Estados Unidos e da Inglaterra no acidente de Mbuzini seja de forma indirecta. Isto é, segundo o senhor Sérgio Vieira, os Estados Unidos e até possivelmente a Inglaterra – ele não esclarece qual dos dois países fez isso – teria fornecido à África do Sul ou a Israel, o célebre aparelho que provocou o desvio do avião. Aqui há mais um caso de erro de palmatória, conhecido de qualquer investigador. O investigador tem de cumprir com uma regra fundamental, elementar, que é não permitir que a percepção que ele tem de uma determinada realidade interfira com os factos. O senhor Sérgio Vieira, antes de estar na posse dos factos já estava a tirar ilações precipitadas. A leitura diplomática que ele faz surgiu depois do embaixador americano, aqui em Maputo, e também o embaixador britânico, também em Maputo, terem abordado o Sr. Sérgio Vieira a informar que não estavam interessados em participar nas investigações. Segundo depreendo da leitura dos documentos, essa abordagem foi feita no dia 23 de Outubro de 1986. Acho extraordinário que o Senhor Sérgio Vieira, quatro dias depois do acidente, quando os factos do acidente, nomeadamente, os que estavam contidos nas caixas negras do avião, ainda não haviam, sequer, sido extraídos, nem sequer havia sido alcançado o acordo quanto à forma como seria feita a leitura dos dados dessas caixas negras. Ora, a leitura desses documentos fornece outra perspectiva sobre porque é que os Estados Unidos não quiseram inicialmente participar nessa investigação.
Mas no dia 25 de Outubro de 1986, a embaixada americana em Pretória enviou um telegrama ao Departamento de Estado a recomendar que os Estados Unidos deviam participar nas investigações já e imediatamente. E diz esse telegrama que “não devemos aguardar por mais tempo porque caso contrário a União Soviética irá viciar os dados do acidente e depois será difícil aos Estados Unidos provarem que não estão envolvidos neste caso”, porque este acidente, segundo o telegrama, “reúne todas as características de mais um caso de uma vítima do capitalismo e nós vamos ser acusados de ter provocado este acidente”. E, de facto, isso veio a acontecer. O jornal Notícias, em Maputo, publicou uma reportagem da agência de notícias Novosti em que abertamente implicava os Estados Unidos no acidente.
Face a essa recomendação feita pela Embaixada americana, em Pretória – que também tem o cuidado de dizer: “nós vamos participar nestas investigações não para servir os interesses da África do Sul, porque não devemos nada à África do Sul, mas para servir os nossos interesses” – num outro telegrama do dia 31 de Outubro, do Departamento do Estado, que decide iniciar diligências para uma participação nas investigações. O que é interessante é que um outro telegrama, do dia 19 de Novembro de 1986, portanto, já depois dos três países terem assinado o acordo, em Maputo, sobre a forma como seria feita a leitura das caixas negras, o secretário de Estado (norte-americano) envia um telegrama ao embaixador americano em Maputo, para informar o Governo moçambicano de que, em conformidade com um pedido formulado pelo Governo da República Popular de Moçambique, os Estados Unidos disponibilizam um investigador para participar nas investigações. E têm o cuidado de sempre realçar, aliás, é o aspecto dominante na posição dos americanos, que eles não querem aparecer como estando ao lado da África do Sul. Eles querem prestar ajuda aos três países.
Isto levanta uma questão: Será que o Sr. Sérgio Vieira, como membro da Comissão Nacional de Inquérito e membro do Governo da República Popular de Moçambique, à altura dos factos atrás referidos, não tinha conhecimento destas diligências do governo dos Estados Unidos? Eu também posso fazer uma leitura, se bem que não necessariamente diplomática: O Sr. Sérgio Vieira, ao omitir este ponto – eu chamaria a isto não uma omissão, mas uma ocultação de provas – o Sr. Sérgio Vieira pretende apenas dar consistência à tese do VOR falso que ele defende desde o princípio.
Fonte: O País – 19.10.2016
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