Políticas públicas do partido Frelimo têm contribuído para a degradação dos solos em Moçambique |
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Escrito por Adérito Caldeira em 13 Novembro 2015 |
Um dos objectivos deste Ano Internacional dos Solos é apoiar políticas eficientes e acções com vista a garantir o uso sustentável e a protecção dos solos e dos recursos neles existentes, contudo, “(...)Toda a governação, nos últimos 30 anos pelo menos, foi completamente alheia aos fenómenos e aos problemas da agricultura e do meio rural. Nunca houve uma lei da agricultura mas em três – quatro anos tivemos uma lei de minas. Porquê? Negócio, comissão, promiscuidade, camponês não dá comissão, camponês não dá negócio, não dá sociedade. As políticas públicas em Moçambique aumentam a pobreza e aumentam as desigualdades sociais em Moçambique” afirmou o economista que é Director do Observatório do Meio Rural num seminário da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO). Mosca desmistificou a percentagem propalada pelo Governo, de que a pobreza em Moçambique está estabilizada nos 54 %, afirmando: “mas a pobreza não é percentagem é o número de pobres. Se nós introduzirmos a percentagem sobre o efeito demográfico vamos ver que temos mais um milhão e oitocentos mil pobres que em 1997. A pobreza está a aumentar em Moçambique porque as políticas públicas são favoráveis ao aumento da pobreza.” Sobre a segurança da terra, aposta do Presidente Filipe Nyusi, João Mosca disse que "antes disso deveríamos falar na segurança do território. O camponês não vive do solo, da sua parcela, vive de uma forma integrada de todo o meio ambiente do território onde ele está integrado: da floresta, da água, da agricultura, da pastagem, da piscicultura, do conjunto que conflui para um determinado modo de vida, para determinados níveis de rendimento, e para determinadas formas de vivência dos cidadãos.”
Terra (in)Segura
Ademais “dentro desses sistemas de produção também tem a ver todos os aspectos sociológicos, antropológicos dos espíritos, dos cemitérios, das relações sociais de poder nos territórios, da história das culturas e identidades dos povos que habitam um certo território, portanto muito mais importante do que falar da terra, ou da parcela agrícola, é mais importante falarmos do território”, acrescentou o académico que destacou alguns riscos da iniciativa presidencial “Terra Segura”.Ao contrário do que o Chefe de Estado afirma, que a terra não deve ser vendida, a meta de entregar cinco milhões de Direitos de Uso e Aproveitamento da Terra (DUAT) a camponeses poderá estimular o negócio da terra, que por lei não pode ser vendida mas que todos os dias é transaccionada em Moçambique. “Os cinco milhões de DUAT´s são uma coisa importante mas há riscos, uns dizem que o DUAT dá mais protecção e segurança da terra, é verdade. Mas o DUAT também permite a privatização ou a comercialização num mercado de terra que é ilegal mas que existe, e todos sabem que o mercado da terra existe em todo o lado, também permitem às pessoas com DUAT fazerem negócio”, chamou à atenção João Mosca que entende que o “Terra Segura” pode ser uma antecâmara de uma possível reforma da Lei de Terras e sugere que em vez da atribuição de parcelas a cada camponês a atribuição de DUAT´s às comunidades. “O DUAT da comunidade quer dizer que ela é dona, as parcelas podem estar dentro da comunidade e não se pode comercializar sem o consentimento da comunidade, e aí existe alguma defesa do território na integridade em termos de espaço, solo, de floresta, etc., num sistema integrado.”
“O camponês é o sacrificado da guerra”
A exploração florestal é outra das causas da degradação dos solos. O Director do Observatório do Meio Rural entende que o camponês só agride as florestas por necessidade da sua própria sobrevivência.“O corte da floresta como forma de sobrevivência, de obtenção de rendimento, considerando a ruptura provocada no sistema tradicional de produção, baseado na agricultura, na pecuária e numa harmonização nacional da floresta, as populações são forçadas a migrar e contam com outras formas de sobreviver que incluem o corte das árvores para madeira, carvão, estacas, isto acrescido da crescente demanda de factores demográficos e sobretudo factores de urbanização levam a que o camponês, educado secularmente a relacionar-se de uma forma pacífica com a floresta, ele começa a ser o agressor da floresta. Não só como uma estratégia de sobrevivência mas também porque deixou de ter em relação à floresta a sua relação antropológica, a sua relação dos ritos, dos espíritos, dos cemitérios. Quando isso acontece, essa deslocação antropológica e sociológica, a relação entre o homem e a natureza entra em ruptura e vai agredindo a floresta porque já não é sua, a sua floresta ficou lá atrás.” Para João Mosca “o camponês é o sacrificado da guerra, por causa da guerra ele emigra e é forçado a ser agressor da natureza”. O economista apontou o tipo de investimento que se faz em Moçambique como outra das causas, pois ele é intensivo e gera poucos empregos; por outro lado, as políticas públicas, apesar do discurso sobre o empreendedorismo, não têm incentivos e apoiam pouco os pequenos produtores e outras pequenas iniciativas de geração de rendimentos. “Existe um sistema equilibrado homem/natureza secular, ou milenar, sobre ele incidem instabilidades de natureza especial, política, militar, existe instabilidade e rupturas provocadas pela acumulação de capital e isso naturalmente incide sobre a pobreza pré-existente e acaba por aumentar a pobreza.”
Quase um terço do regadio do Chókwè está salinizado
Sobre o que deve ser feito para a conservação dos solos, Alfredo Nhantumbo, da Faculdade de Agronomia e Engenharia Florestal da Universidade Eduardo Mondlane, sugeriu que quem faz as políticas públicas deve começar por aproveitar os estudos e conhecimentos que existem e alertou para a necessidade de interligá-los.“Há muitos estudos que estão a ser feitos sobre solo mas são estudos muito especializados, muito específicos, temos estudos mais virados para a agricultura, ou para a conservação da biodiversidade ou então para a mitigação dos desastres. Há necessidade de combinar a conservação do solo como um aspecto transversal e abordá-la de forma institucionalmente integrada”. Alfredo Nhantumbo afirmou que a agricultura que se pratica em Moçambique não está “a produzir para um bom caminho” e deu alguns exemplos de como a produção agrária está a contribuir para a salinização dos solos na açucareira de Xinavane. “Se nós temos um sistema de rega e não há como drenar essa água nós vamos ter sérios problemas, pode ser provocado por intrusão salina e também podemos ter algumas situações em que a salinização é inactiva, tem a ver com aspectos genéticos do próprio solo”. “No Chókwè a situação é ainda pior (…) quase um terço do regadio está salinizado”, revelou o académico da Faculdade de Agronomia e Engenharia Florestal da Universidade Eduardo Mondlane que abordou ainda o impacto do Aquecimento Global. “Se nós já temos um país que é semi-árido há um risco de eventualmente de a região semi-árida aumentar, posso não estar certo mas o risco está lá”, afirmou Nhantumbo acrescentando que “as populações vão-se movimentar do interior para a costa (devido à seca) e isso a acontecer vai fazer muita pressão às terras da costa, que já estão pressionadas (pelo turismo) e aí vai-se piorar a situação”. Segundo o académico, os riscos que Moçambique tem também de enfrentar passa pela probabilidade do aumento de cheias, nas bacias do Limpopo e do Zambeze, o que poderá agravar a salinização dos solos nessas regiões. “Há maior probabilidade de ocorrência de ciclones na zona costeira, para lá onde eventualmente as pessoas vão tentar assentar-se, se nós tivermos problemas sérios de seca no interior”, concluiu o investigador moçambicano. |
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