26/07/2019
EUREKA por Laurindos Macuácua
Cartas ao Presidente da República (160)
Bom dia. Presidente. Como está o senhor? Aqui as dores de sempre. Principalmente a coluna. Acho que deve ser do “My Love”, os solavancos, as noites mal dormidas. E como se isto não bastasse, tenho que me levantar às quatro da manhã para apanhar o tal "My Love". Ele não espera por mim. E com este frio...acho que o senhor deve imaginar o que passamos. Mas bom, vida de moçambicano é assim mesmo. Poucos banqueteiam-se enquanto a maioria não tem nada à mesa!
Vou ser directo: não gostei dos seus pronunciamentos sobre o combate à corrupção, ditas na reunião do sábado dos camaradas. O senhor disse que caso seja reeleito, vai privilegiar o combate à corrupção. Admira-me tanto essa inocência propositada quando fala ao público. O Presidente acha que nós, o povo, acreditamos nisto?
Quem quer combater a corrupção não vocifera do alto do palanque. Eu, como moçambicano e com o privilégio de me comunicar consigo por via destas cartas, devo-lhe dizer, Presidente: estou desapontado com a escolha que a Frelimo propôs aos eleitores. O senhor esteve cá por estes cinco anos e não vi nada de palpável neste desiderato.
Presidente: a experiência histórica e internacional sugere que esforços bem-sucedidos para erradicar a corrupção sistémica têm, tipicamente, alguns ingredientes indispensáveis.
Um é o desenvolvimento de um sistema efectivo de controlos e contrapesos, que envolve especialmente Ministério Público, Judiciário e auditoria pública independentes e competentes.
Em termos mais gerais, uma cultura de profissionalismo e independência no serviço publico é essencial. Outro ingrediente é o desenvolvimento de partidos políticos estáveis organizados em torno de programas e ideologias, em lugar de lideres carismáticos ou máquinas de apadrinhamento.
O combate a corrupção exige décadas e depende de acúmulo gradual de reformas institucionais e legais, do cultivo do profissionalismo e da difusão de normas éticas.
O Presidente, pela experiência deste seu primeiro mandato, me parece hostil a instituições genuinamente independentes e efectivas de combate à corrupção, e provavelmente as solaparão.
O seu histórico de combate à corrupção, Presidente, não é bom. A Frelimo e seus partidários travaram uma campanha coordenada para lançar descrédito sobre a detenção da "estrela de momento": Manuel Chang, através de manobras dúbias e de todo reprováveis.
Devo confessar isto: o Presidente jamais falou sério sobre acabar com a corrupção. O senhor e seus asseclas fomentam a ira dos eleitores quanto à corrupção como forma de chegar ao poder e, quando mais uma vez chegarem, usarão o mesmo poder para enriquecimento individual, aliás, como sempre vem acontecendo.
Duvido que o Presidente, em algum momento, teve compromisso real de combater a corrupção. O que faz é explorar a repulsa dos eleitores por ela a fim de se eleger. Em boa verdade, depois de conquistar o poder porém, o egoísmo do novo líder, acoplado ao seu desrespeito pelas regras convencionais, manifesta-se em forma de ataques a instituições independentes de combate à corrupção, muitas vezes com insinuações de conspiração. É assim com o seu antecessor, o senhor Armando Guebuza, de quem o senhor não se difere muito. Aliás, nunca conseguiu explicar satisfatoriamente ao povo se está ou não envolvido no vergonhoso calote, mas diz que quer combater a corrupção!
DN- 26.07.2019
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