"Deus criou as pessoas para amarmos e as coisas para usarmos, porque então amamos as coisas e usamos as pessoas?"



segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Vice-comandante Geral da Polícia viola a Lei de Probidade Pública e comete peculato


Escrito por Centro de Integridade Pública  em 26 Outubro 2015
O vice-comandante geral da Polícia, José Weng San, cometeu ilegalidades ao permitir que uma viatura da Polícia da República de Moçambique (PRM) transportasse o seu empregado, que morreu na sua residência, na semana passada, para a terra natal do finado, em Chimoio, na província de Manica.
A atitude do vice-comandante geral da PRM viola de forma grosseira a Lei n.º 16/2012, de 14 de Agosto, conhecida também por Lei de Probidade Pública (LPP), que tem como objecto essencial estabelecer as bases e o regime jurídico relativo à moralidade pública e ao respeito pelo património público por parte do servidor público (artigo 1 da LPP). José Weng San é considerado servidor público pela referida lei, segundo o previsto na sua alínea z), n.º 3 do artigo 3.
Trata-se de uma prática recorrente por parte dos servidores públicos em Moçambique que fazem recurso aos bens públicos para satisfazerem interesses de natureza pessoal ou de terceiros, com os quais mantêm relações de vária ordem, incluindo de familiaridade ou outras de proximidade e que a LPP veio cautelar, proibindo a sua ocorrência.
A alínea a) do Artigo 28 da LPP, que tem como epígrafe – Proibição no uso de bens estabelece que é proibido ao servidor público “usar os bens materiais e equipamentos da instituição para fins pessoais”. Fica claro que, no caso em alusão, José Weng San usou um bem material da PRM e que é propriedade do Estado para a satisfação de interesses pessoais, no caso o transporte do seu antigo empregado doméstico, ora falecido.
Para reforçar ainda mais esta proibição, a alínea d) do já referido Artigo 28 da LPP enfatiza que é proibido ao servidor público “utilizar, indevidamente, os veículos, combustível, ferramentas e sobressalentes do veículo, atribuídos ao servidor público conforme as regras específicas da instituição”. Não restam dúvidas de que há uma ilegalidade cometida e que deve merecer a devida sanção.
Outrossim, e segundo o n.º 1 do Artigo 15 da LPP, José Weng San violou o dever de respeito pelo património público que refere que “O servidor público não deve usar o património público para fins pessoais, bem como praticar actos que lesem ou que sejam susceptíveis de reduzir o seu valor”. Temos aqui um exemplo típico do uso de bens públicos para fins pessoais, para além de o mesmo acto concorrer para a diminuição do valor do bem, se atendermos que a viatura em questão percorreu vários quilómetros de Maputo até Chimoio, o que claramente a desgastou.
Ademais, é obrigação de qualquer servidor público, segundo a LPP, conhecer as proibições que lhe dizem respeito, como está previsto no Artigo 18 da mesma lei. Mesmo no conceito de um “Bonus Pater Familias”, ou seja, Bom Pai de Família na língua portuguesa, utilizado como ponto de referência de conduta do agente ou do cuidado a que está obrigado, José Weng San deve saber distinguir a esfera privada da pública, evitando agir em violação dos seus deveres de probidade. A ética não deve sempre ser legislada, é uma questão de boa conduta.
Ministério Público deve accionar procedimento criminal contra José Weng San
O acto praticado por José Weng San configura um crime a que cabe ao Ministério Público proceder criminalmente. O novo Código Penal (CP) já em vigor e que foi aprovado pela Lei n.º 35/2014, de 31 de Dezembro, prevê e pune um novo tipo legal de crime tipificado como “Peculato de uso”, no seu artigo 515, que estabelece, o seguinte: “O servidor público que fizer ou permitir que outra pessoa faça uso, para fins alheios àqueles a que se destinem, de veículos ou de outras coisas móveis, públicos ou particulares, que lhe forem entregues, estiverem na sua posse ou lhe forem acessíveis em razão das sua funções, será punido com pena de prisão até um ano e multa de seis a doze salários mínimos”.
Concomitantemente, o visado não só violou a LPP, de natureza essencialmente administrativa, mas também a lei criminal.
Sendo assim, compete ao Ministério Público, como titular da acção penal, instaurar o devido procedimento criminal contra o vice-comandante geral da Polícia, responsabilizando-o pelos seus actos, conforme o prescrito na Lei Orgânica do Ministério Público e Estatuto dos Magistrados do Ministério Público, aprovado pela Lei n.º 22/2007, de 1 de Agosto, na alínea a) do Artigo 4. Aliás, tratando-se de um crime público, o Ministério Público deve agir oficiosamente e não com base em denúncia, queixa ou participação.
Mais uma vez, o Ministério Público é chamado a demonstrar que age com isenção e equidistância na defesa da legalidade, conforme o previsto na lei, concretamente na alínea b) do artigo 4 da lei orgânica do Ministério Público, que estabelece que compete ao Ministério Público “zelar pela observância da legalidade e fiscalizar o cumprimento das leis e demais normas legais”.
Esta será uma forma de resgatar a credibilidade do judiciário que tem sido visto como tendo uma acção enérgica e contundente contra os mais fracos, mas que tem pugnado por acção mais branda quando estejam envolvidas figuras ao mais alto nível na máquina administrativa do Estado e na elite política e político-económica ligada ao partido no poder.

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