Aldina dos Santos (Diana)
ALDINA dos Santos (Diana) entrou para a história, esta semana, pelos piores motivos na vida de um ser humano. É a primeira moçambicana e cidadã da região da SADC a ser condenada à prisão perpétua por prática de crimes relacionados com o tráfico internacional de seres humanos para fins de exploração sexual.
A frieza da jovem até assustou a juíza sul-africana que presidiu o caso, com mais de duas décadas de experiência, chegando mesmo a dizer que era algo inédito e que pode merecer matéria para os escritores fazerem um livro. Segundo ela, os contornos usados pela ré, a sua frieza, o calculismo, a falta de arrependimento e o alto sentido de organização da sua rede criminosa podem fazer disto um grande livro, mas que nunca para servir de exemplo.
Exemplar tem que ser a pena de prisão perpétua, em que os agentes do crime organizado devem sentir a mão dura da justiça e quem ainda não entrou neste mundo melhor é continuar de fora. Por outro lado, segundo o tribunal, tudo o que aconteceu tem atributos para ser uma novela, ficando-se apenas pelo imaginário, e não algo real, porque é muito doloroso.
Diana conseguiu ludibriar as três menores e pô-las debaixo de uma tremenda tortura, a gerar riqueza para o seu bolso. Aliás, segundo a magistrada, ela nunca chegou a demonstrar arrependimento pela crueldade com que tratava as suas vítimas, pois o que mais lhe preocupava era o lucro fácil, desgastando o corpo de inocentes que depositaram total confiança nela em lhes proporcionar uma vida diferente da que levavam em Maputo.
Prova disso, de acordo com o tribunal, é que as jovens nem sequer tiveram tempo de se despedir das famílias quando foram interceptadas e enganadas a 6 de Janeiro de 2008, na Praia da Costa do Sol. Diana traiu a total confiança que as jovens depositaram nela, visto que nem o trabalho no salão, nem a continuidade de escolaridade foram assegurados.
Assim, quando desembarcaram na RAS e antes de iniciar com a sua exploração, Diana fez questão de levá-las para um salão cabeleireiro onde tratou de melhorar o visual das vítimas para que fossem mais atraentes aos seus clientes.
O alto sentido de preparação deste crime foi ainda descrito pelo tribunal como único, visto que Diana passou da fronteira sem qualquer documento das jovens. Pelos vistos, detinha o controlo de alguns agentes fronteiriços que permitiram que ela passasse sem qualquer problema.
Pelos contornos deste crime, o tribunal vê adequada a prisão perpétua como a pena máxima para a ré, pelos três crimes de tráfico. Os 12 meses a que foi condenada ainda por prática de crimes relacionados com a exploração sexual de menores já foram cumpridos e não têm qualquer relevância de momento.
Assim, chega ao fim esta longa história de tráfico de três menores moçambicanas para efeitos de exploração sexual na África do Sul. Diana vai cumprir a pena na Cadeia de Máxima Segurança de Pretória. De 32 anos de idade e mãe de dois menores, Diana explorou sexualmente as suas vítimas de 15 de Janeiro a 13 de Fevereiro de 2008, num condomínio de Moreleta Park, arredores de Pretória.
VÍTIMAS SÓ COMIAM DEPOIS DO ACTO SEXUAL
DIANA usava métodos condenáveis para forçar as miúdas a fazerem o que ela bem queria, como forma de o seu “negócio” não falir. Uma das formas veementemente reprovadas pelo tribunal é que a ré condicionava as refeições ao sexo. Ou seja, as vítimas só comiam alguma coisa quando fossem à cama com os clientes dela e fazerem tudo o que estes mandassem.
Assim, para que elas dominassem algumas técnicas sexuais eram obrigadas a assistir vídeos pornográficos e algumas sessões de amor entre Diana e o seu namorado. Vezes sem conta as vítimas tinham que desfilar nuas e serem fotografadas pela traficante para que as suas fotos fossem expostas na Internet, de modo que os clientes pudessem apreciar e reservar algumas sessões de sexo.
Outro método por ela usado foi de isolar as três jovens, cada uma no seu quarto. Diana deixou claro que quem tentasse fugir não teria para onde ir, pois elas não tinham dinheiro e nem documentos. Uma vez na situação de ilegais, segundo ameaçava, elas seriam mortas e jamais voltariam a ver os seus familiares. Como as jovens não sabiam falar nenhuma das línguas sul-africanas e muito menos conheciam a “terra prometida”, acabaram por se submeter às chantagens da traficante.
Para que nada falhasse e não corresse o risco de perder clientes, Diana dava doses excessivas de estimulantes (drogas) para que elas se sentissem capazes de executar com perfeição tudo o que havia desenhado e ao gosto do cliente. Pelo facto de tomarem drogas elas chegavam a manter relações sexuais com mais de 10 homens por dia.
“A ré nunca pensou no trauma que estava a causar às miúdas, mas sim em ganhar facilmente dinheiro, torturando compatriotas. Em nenhum momento chegou a avisá-las sobre as suas reais intenções. Apenas montou uma estrutura forte para explorá-las e fazer delas o que bem entendesse. Ficou provado que apenas se aproximou delas com objectivos maliciosos. Este tipo de crime equipara-se ao tráfico de droga, que nunca acaba porque há muito dinheiro em jogo. São crimes em que os traficantes sempre têm as pessoas em seu poder para gerar renda ao seu belo prazer. O que você fez foi tirar os direitos das crianças que, mesmo que tentem esquecer o que passaram, jamais conseguirão e viverão para o resto da vida com este trauma” – assim se pronunciou a juíza quando lia a sentença.
JUÍZA “ATIRA” CONTRA DIANA E SEU CAUSÍDICO
“No mínimo devias ter compaixão com as suas vítimas, pois tens filhas e parentes menores que um dia vão crescer e não vais gostar que alguém possa fazer a mesma coisa com elas. Este caso é sério e relevante para a sociedade, daí que esta pena adequa-se”. Foi com estas palavras que a juíza, emocionada com o caso, começou a sua longa explanação sobre os motivos que levaram à aplicação desta pena, bem como mostrar à ré o quanto errou.
Na mesma leva, o advogado de Diana, que insistia na aplicação de uma pena reduzida e que, no seu entender, as jovens abusadas sexualmente iriam recuperar com o andar de tempo, também foi visado pela juíza.
“Os interesses da defesa, sobretudo da ré, nunca se devem sobrepor aos das vítimas, dos Estados moçambicano e sul-africano, muito menos da organização mundial que luta contra o tráfico de pessoas. Nunca a ré se arrependeu do que fizera. Ademais, jamais deveria ter explorado as menores que, não só sofreram tortura psicológica, mas também física. Quantas vezes não foram violentadas por recusar crueldades? É preciso não esquecer que, por mais que elas tentem, jamais conseguirão esquecer as torturas que viveram. Diana até pode ter um baixo nível de escolaridade, mas o senhor advogado sabe que ela mostrou ter inteligência, um alto sentido de organização criminosa” – disse a juíza.
LÁGRIMAS MUITO ANTES DE CONHECER A DECISÃO
PELO que ficou provado durante os três anos que decorreu o julgamento, Diana tinha a plena consciência de que ia ser condenada. Apenas restava saber que pena lhe caberia. Aliás, esta era a preocupação de todos quantos acorreram ao tribunal e não só.
Mas, quando a representante do Ministério Público insistiu que o tribunal anuísse ao pedido para Diana ser condenada à prisão perpetua, a jovem moçambicana se apercebeu de que o assunto era sério e entrou em nervosismo.
Quando a sessão, que durou mais de três horas, caminhava para o momento decisivo e numa altura em que o MP e o tribunal iam apresentando os argumentos pelos quais a ré iria ser condenada, Diana não aguentou e começou a chorar. Já era tarde, sobretudo porque ao longo destes anos todos de julgamento não assumiu a prática de tais crimes e nunca mostrara arrependimento, deixando transparecer que as vítimas pediram para seguir com ela.
As lágrimas “choveram” até que a juíza deu por encerrada a sessão e os agentes correccionais sul-africanos a retiraram da sala de julgamento para o carro celular, do qual seguiu viagem de volta à cadeia onde entrou em 2008 e lá onde deverá cumprir o resto da sua vida.
ADVOGADO AMEAÇA JORNALISTAS
VISIVELMENTE nervoso por ter perdido a causa, o advogado de Diana tratou de abandonar o tribunal às pressas. Na tentativa de colher alguma sensibilidade dele sobre os passos a seguir com relação à apresentação do recurso sobre a sentença que recaiu à sua constituinte, o causídico não quis falar aos jornalistas do “Notícias” e da TVM, únicos órgãos que cobriram o caso desde que foi despoletado.
Perante a insistência do colega da TVM, Francisco Júnior, o advogado ameaçou com um processo ou chamar a Polícia para nos prender. Mesmo debaixo desta ameaça, lá se tentou falar com o homem que, carregado da sua maleta de processos, ficou cada vez mais bravo e foi jogando na cara dos repórteres que se não o largássemos chamaria a Polícia.
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