“Aliciar e patentear” já antes foi feito, com os resultados conhecidos.
Por Noé Nhantumbo
Depois de praticamente encerrada a EMOCHIM, aparece agora um novo capítulo da novela do aliciamento político com fins mediáticos. A adesão de dois integrantes da EMOCHIM provenientes da Renamo vale o que vale em “marketing” político.
Dá alento a quem anda à procura de sucesso que lhe foge na frente política. Em si não significa que a Renamo tenha perdido a iniciativa no que se refere aos pontos em discussão no CCJC. Foi uma manobra elaborada no mais puro secretismo que tem o seu mérito mas convém que ninguém confunda isso com vitória do executivo de FJN.
Tempos houve em que era comum a apresentação periódica de elementos da Renamo integrando-se nas fileiras da Frelimo. Ciclos de exercícios idênticos aconteceram um pouco por todo o país, mas nem isso coibiu a Renamo de existir ou de produzir os resultados eleitorais conhecidos por todos.
Informação e contra-informação têm a sua importância na luta política, mas é preciso compreender os seus limites, para se obterem os respectivos benefícios.
Enquanto se prolonga a crise, cristaliza-se imperceptivelmente uma divisão do país que os políticos dizem que não pretendem. FJN viaja um pouco por todo o país e AMMD passeia a sua classe naqueles territórios em que reivindica a vitória do seu partido nas eleições de Outubro de 2014. Cada um com os seus meios e a sua estrutura protocolar, mostram ao mundo que o país vive uma divisão que, se não é oficial, é prática quanto à sua mediatização da percepção popular.
Para quem observa a forma como AMMD é recebido e aplaudido nos seus encontros com as populações não restam dúvidas que as suas reclamações também são dos milhares que o acompanham nas suas visitas. FJN faz as suas visitas presidenciais, mas, se não fosse a força dos serviços de protocolo estatal e partidário, veríamos o chefe do Estado passando por vergonhas.
Politica e humanamente falando, isso é perceptível e nem as gravações audiovisuais deixam esconder.
Em política, quando os seus executores ou mentores se esquecem dos termos práticos a que esta deve obedecer, corre-se o risco de resvalar-se para a ilusão e para uma efémera vitória ou pseudovitória. O ministro da Informação de Saddam Hussein também fingia que não via.
Moçambique precisa de uma válvula de escape concreta que coloque os seus cidadãos de harmonia com aquilo que são os anseios das pessoas. Os malabarismos de especialistas de “marketing” e os seus associados não conferem consistência nem sustentabilidade aos projectos abraçados.
Sente-se que existe uma agenda mais ou menos secreta de assegurar que nada se altere no quadro político-económico nacional.
Somente um dos pontos da agenda do CCJC está concluído e realizado.
Agora que chegou a vez de mexer naquilo que constitui a “agenda substantiva nacional”, as partes ora divergem, ora convergem, mas não concretizam os entendimentos.
Há uma verdade vistosa no que refere às Forças Armadas e policiais que os interlocutores teimam em não abordar. A situação anormal concreta do ponto de vista de República, que é a existência de dois exércitos. Existem fórmulas diferentes para se avançar e resolver este diferendo que desestabiliza e tem potencial de desestabilizar.
Será que as partes ainda não abandonaram a chamada “solução final”? Será que alguém está à espera que o outro escorregue ou tropece para se decidir pelo “tiro final”?
Outra faceta é que existimos numa República disfuncional, na medida em que os dispositivos postos em prática para controlo e fiscalização da acção governamental estão encobertos por um manto de disciplina partidária que impede qualquer passo que o Parlamento queira dar. Adivinha-se que mais comissões de inquérito parlamentar serão solicitadas, que nenhuma será aprovada. Isso é como dizer que temos um Parlamento para aprovação do que o executivo quer, mas não o que os governados preferiam ver resolvido ou solucionado.
Sente-se que o Centro de Conferências “Joaquim Chissano” se transformou num “circo” para entreter os moçambicanos todas as segundas-feiras. Tornear assuntos e inventar razões para não implementar mesmo aquilo em que se tenha decidido não dá provas de vontade de resolver a crise pós-eleitoral em que o país mergulhou.
Não haja dúvidas de que os “dossiers” em discussão são complexos e requerem um tratamento inteligente, que os políticos na mesa não estão mostrando.
Como serão abordadas as questões económicas que são, juntamente com a constituição de um Exército nacional único, as questões nucleares? O que cada uma das partes tem na “manga do casaco”?
Depois dos atropelos grotescos à legislação aprovada e vigente, o país vive uma situação em que milhões de hectares de terra arável, florestal ou com potencial mineiro está tomada por um grupo restrito de pessoas. Estas mesmas pessoas têm fortes ligações com a elite político-governamental dominante.
Será que haverá vontade de assumir que a Lei de Terras tem de ser revisitada, ou que limitações terão que ser estabelecidas quanto à titularidade da terra?
Estes e muitos problemas apoquentam o país, e sem o seu tratamento estratégico continuará a dança das voltas sem uma saída seja encontrada.
Se a bipolarização existente não produz resultados, seria realista vermos as partes no CCJC acolhendo a participação de outros interlocutores, por interesse da nação.
A presença dos mediadores nacionais já se apresenta insuficiente, porque, ao longo do tempo, tem-se visto que eles são mais uma “capa” de isenção do que realmente isentos e imparciais. Não se pode dar palestras a uma das partes e depois assumir a posição de mediador como se nada tivesse acontecido
Seria interessante verificar o que uma pressão internacional musculada poderia significar para a retomada da seriedade no CCJC. Os interlocutores não podem pensar que possuem carta-branca para adiar soluções que o povo considera urgentes.
Quando da parte dos políticos não surgem soluções nem ideias que conduzam a soluções, entra-se num ciclo vicioso de crises como as que se vivem nos dias de hoje. (Noé Nhantumbo)
Fonte: CANALMOZ – 04.08.2015
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