"Deus criou as pessoas para amarmos e as coisas para usarmos, porque então amamos as coisas e usamos as pessoas?"



quinta-feira, 4 de outubro de 2012

“Os dois anos e meio das negociações foram muito difíceis para mim”

Afonso Dhlakama
Afonso Dhlakama diz que o balanço dos 20 anos de paz é negativo.
A partir da província da Zambézia, onde se encontra de visita, o líder da Renamo, Afonso Dhlakama, faz uma análise do Acordo Geral de Paz e reitera que à guerra não volta mais.
Como é que foi o período de negociação até chegar ao acordo de paz?
Recordo-me que foram dois anos e meio de negociações em Roma e aquilo foi muito difícil. Difícil porque, na altura, o governo moçambicano não queria reconhecer a Renamo, queria que a Renamo depusesse as armas e que Dhlakama e seus guerrilheiros fossem reintegrados, sem negociarmos uma agenda política. Em face disso, obrigámos a Frelimo para retornarmos às negociações políticas, um processo que levou dois anos e meio até à criação dos protocolos. Cada protocolo definiu a pretensão de cada uma das partes sobre os destinos de Moçambique. Nós, a Renamo, queríamos democracia multipartidária e que, depois, tivéssemos eleições livres e transparentes, justiça, direitos humanos, economia do mercado, liberdade de circulação e religiosa, entre outras. foi duro, mas valeu a pena a demora das negociações - foram dois anos e meio -, pois, por isso, até hoje temos esta paz.
Dois anos e meio de negociação da paz, porquê? Alguma coisa falhou neste processo?
Não. Em termos de negociação, nada falhou. foram dois anos e meio porque nós exigíamos que as negociações fossem sérias. Não seria bom que as negociações da paz em Moçambique fossem como acontece com os outros países, onde negociam para satisfazer a vontade de mediadores, cessam-fogo hoje e, volvidos dois dias, regressam às matas. Ora, nós queríamos que a Frelimo aceitasse o fim da guerra numa condição de entrada de multipartidarismo em Moçambique. Também queríamos que a Frelimo aceitasse a criação de um exército único, apartidário, técnico com parte dos guerrilheiros da Renamo e as tropas do governo. Queríamos que se acabasse com guia de marcha, aldeias comunais, a lei de pena de morte e tudo aquilo que fosse política de comunismo. A Frelimo acabou por aceitar porque, quando tentasse fazer manobras no interior, mandava a minha ofensiva militar, daí que ficava com medo e acelerava o processo.
Volvidos 20 anos, que balanço faz da paz em Moçambique?
 É negativo. Foram 20 anos de sacrifício e da pior vida do que a que vivemos no período da guerra dos 16 anos. Foram 16 anos de luta com armas e 20 anos de calar das armas. Entretanto, em termos de perseguição, sofrimento e escravidão, os 20 anos foram duros. Já imaginou alguém como Dhlakama a assinar acordo com Chissano para, depois, ser excluído de tudo e ser atacado fisicamente, incluindo os seus seguranças, pelas forças policiais a mando da Frelimo. Já fomos atacados em Marínguè no ano passado, e, no dia oito de Março, em Nampula. Vou contar-lhe um episódio: durante a campanha para as eleições de 2009,  quando estive em Mandimba, no Niassa, entrei num restaurante e o proprietário veio até a mim e retirou-me do seu espaço, alegando ter instruções para o efeito. Será que estamos em paz? 
Fala-se de nova ordem política na Renamo, porquê?
Eu não gostaria de assustar as pessoas, porque jurei que jamais haverá guerra iniciada pela Renamo. nós vamos fazer manifestação pacífica como forma de pressionar a Frelimo. O limite para o efeito é até ao dia 30 de Outubro. Se a Frelimo aceitar negociação para assinar acordos que ponham termo os abusos, de facto, tudo será tranquilo. Mas se até ao dia 30 não houver nenhuma indicação positiva no seio da Frelimo, vamos, efectivamente, manifestar, fechar todas as linhas-férreas, aeroportos, estradas e tudo, e ninguém pode tentar intervir. Se mandarem a Força da Intervenção rápida, vou ordenar a segurança da Renamo para esmagar todos. Não sou belicista, mas de paz. A Frelimo fala da reconciliação, unidade nacional e boa governação todos os dias, mas o que faz é um autêntico terrorismo (...).
O discurso de manifestação não é novo...
Comecei com este discurso logo após de resultados eleitorais de 2009, antes do Egipto e a Líbia, que copiaram o meu discurso. Eu cheguei à conclusão de que África não precisa de pegar em armas para matar, é só manifestar e fechar todos os pontos estratégicos. Se assim procedermos, o governo será obrigado a resolver os problemas. É por isso que já formei seis homens para negociarem com os ministros da Frelimo.
Sente que os acordos de Roma não estão a ser cumpridos?
Pelo amor de Deus, não há nenhuma coisa que está a ser cumprida.... 
Algumas correntes contestam o facto de o líder da Renamo ter homens armados, é legal a sua força?
São estas correntes que não percebem nada. sinto muito quando vejo figuras académicas a falar disso. O acordo de paz diz que a Renamo deve ter a sua segurança, que é composta por guerrilheiros que combateram durante a guerra. está escrito que o desaparecimento desta segurança vai depender do cumprimento, por parte de governo, que tinha como obrigação despartidarizar a polícia, de modo a que a Renamo e outros partidos emergentes se sentissem à vontade. mas a Frelimo, até hoje, não faz nada. Eu estou disposto a entregar a minha força para integrar uma polícia apartidária.
Sente que há falta de compromisso nos acordos de Roma?
Sim, porque a Frelimo não está cumprir nada daquilo que assinou. Se eu quisesse vingar-me já em 1994, teríamos acabado com a paz, o que não seria bom para o país, porque a guerra não faz bem a ninguém. E se eu responder, todos os investimentos vão fugir e eu não quero fazer isso.
Que tem a dizer sobre as recentes conversações que manteve com o chefe do estado, Armando Guebuza, em Nampula?
Não surtiram efeitos e espero que o desfecho seja urgente.
Para terminar, o líder da Renamo é pela paz? 
Sim, sou pela paz e não pretendo voltar a pegar em armas.

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