"Deus criou as pessoas para amarmos e as coisas para usarmos, porque então amamos as coisas e usamos as pessoas?"



segunda-feira, 26 de maio de 2014

KERYGMA - O ANTRO DA FRUSTRAÇÃO NACIONAL

POR: Cremildo Bahule   

Normalmente, na segunda-feira, a maioria das pessoas anda desanimada. No fim-de-semana, parece-me, gasta-se mais energia do que nos dias laborais. Alguns rostos que se vêem na segunda-feira assemelham-se aos que saem de escombros. Algumas faces precisam de ser engomadas porque o seu definhamento, no primeiro dia laboral, é assustador. O álcool, para além de ser catalisador de acidentes de viação, é o motivo que gera o desânimo nas segundas-feiras.
Por causa disso o meu amigo Chau, numa conversa sobre esse assunto, dizia o seguinte: “No dia que as empresas públicas, privadas e algumas agências decidirem usar bafómetros muitas pessoas vão perder o emprego”. Particularmente, acho a ideia da utilização do bafómetro genial. Alguém consegue fazer chegar esse recado à ministra Maria Helena Taipo? Temos de aprovar a introdução de bafómetros nos locais de trabalho. (Estou consciente de que muitos amigos estarão contra esta sugestão. Mas de disciplina e produtividade precisa-se).
A parte inicial deste texto é para fazer a ponte sobre o que o meu amigo Filipão me confidenciou.
– Bahule, já percebeste que se consome muito álcool neste país? As pessoas andam frustradas.
Eu, entontecido, com aquela confissão, perguntei:
– Filipe, porque as pessoas estão frustrados e a beber muito?
– Andam frustradas por causa das coisas que estão a acontecer no dia-a-dia.
Faço-me de desentendido para chegar ao alcance da inquietação do meu amigo:
– O que está a acontecer no dia-a-dia?
– São as cenas deste país. É coisa má a acontecer e isso afecta muita gente.
De facto, admiti sem abrir a boca, são muitos acontecimentos para um povo que ainda tem a guerra no seu imaginário. Muitos enredos para um país que almeja pão, água, transporte digno e uma paz efectiva, seja ela por meio de uma paridade sem consistência ou de uma paridade alicerçada numa etnicidade que se quer forjar em nome de uma moçambicanidade genuína. O cansaço que a maioria dos moçambicanos sente já deixou de ser físico.
Tornou-se psicológico. Todos os dias somos bombardeados com notícias de instabilidade porque os que se deviam entender no lugar onde se realizam conferências, na zona da Costa do Sol, andam a brincar com as lógicas de paridade como se dois mais dois fosse igual a dez. Nunca saberemos realmente o que querem. Se todos querem vincar serem os donos do poder ou se querem todos servir o povo.
– Mano, a bebida é fácil de se ter. Até dizem que no tal de Mutxope seis cervejas custam cem meticais. O voo do meu pensamento foi quebrado com este detalhe alcoólico.
– Tens razão, Filipe. Há muito exagero nessas coisas.
– É isso. Os governantes sabem disso e não fazem nada. Querem embebedar a juventude para não perceber o que está a acontecer.
– O preço do livro é dez vezes mais elevado que uma grade de cerveja. Se a educação é essencial porque é que os manuais escolares têm preços elevados? Até o livro que é gratuito ainda não chegou aos destinatários. Um país com muita madeira, mas os alunos sentam-se no chão. Não vou falar do “my love”, o maior retrocesso deste país. Na capital do país, o lixo confunde-se com uma noite de estrelas.
Frustrado em dose dupla, o meu amigo falava com um nervosismo de derrubar o prédio mais alto de Moçambique. Eu escutava-o e não tinha o que dizer, pois também vivo os mesmos problemas.
– Sabes Bahule, enquanto essas coisas continuarem assim este país não terá um sobrevivente. Todos estaremos alcoolizados porque continuaremos a beber para não encararmos os problemas que o país vive.
Filipe respirou fundo e voltou à carga:
– Só há uma solução para isto.
– Qual seria a solução?
– Perguntei inocentemente.
– Pedirmos a Deus que faça cair um dilúvio só em Moçambique.
– !?
– Sim e entrariam na arca os que não têm nada a ver com essas coisas de política e paridade. Na arca podem admitir algumas bitolas para se garantir alguma diversão enquanto esperammos que a terra seque.
Que sugestão hilariante! Mas uma coisa é certa. O país anda frustrado e precisa de alguma cura divina. Entre o álcool e a cura divina oscilam as frustrações de muitos moçambicanos. A verdade é uma apenas – temos de saber anular, com alguma serenidade e sabedoria, os dias fortes que se aproximam.

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