Aqui Não se morre, se é matado - os Padrinhos da morte
O homem naturalmente nasce, cresce, morre; ora, por vezes existem alguns que não crescem apenas nascem e morrem. O nascer e morrer são os dois estados bases a que o homem é sujeito a sofrer em desprendimento de qualquer que seja a sua situação vital ou status social que tenha, o homem deve nascer e morrer.
São várias as vezes que acompanhamos sobre a morte, vivemos casos concretos sobre mortes de conhecidos nossos, familiares, etc., porém, para nós nunca a morte é natural, tem sempre um padrinho, aqui não se morre, se é matado. Alguém mata o outro para poder ganhar algo em herança do malogrado. Este é o padrinho da morte. Encontrava-me eu, gozando o meu período de férias em minha terra natal, quando recebi a notícia sobre o falecimento de um meu grande amigo, com quem partilhei muitas experiências da vida. Fui participar dos ritos fúnebres, desde a hora da Missa de corpo presente até a hora em que fora conduzido o corpo do malogrado à sua última morada onde os vérmenes já podiam deliciar-se dos seus lábios que em vida batiam-se falando eloquentemente, ensinando, cantando …
Tive a graça de participar dos ritos fúnebres sentado num lugar muito próximo dos familiares. Enquanto o Padre no presbitério, vestido de alva branca, estola roxa, casula roxa, acompanhado pelos acólitos que fielmente o ajudavam, vestidos de uma brilhante alva branca, e a assembleia vestida de branco e preto, simbolizando a pureza da alma e luto que se vivia naquele momento; o padre tão inteligente que era, exercia as suas funções de pastor, fazendo uma homilia na qual consolava a família do malogrado, dizendo que não morrera na totalidade, mas sim fora para junto do Pai, de quem todos nós viemos e aquém todos nós voltaremos, fora para a casa do pai eterno e lá poderá interceder por nós, terá uma nova morada junto com os santos e anjos de Deus. A assembleia atenta, escutava fielmente o padre. Eu estava perto de alguns membros da família, que durante a Missa, para além de escutarem a homilia e acompanharem a Missa, questionavam-se
- “Não terá sido o vizinho quem o matara para poder ficar com a esposa e seus bens?”; - “Só pode ser ele, pois tinha muitos ciúmes deste homem e desejava sempre a sua esposa” assim conversava um grupo. Outros porém, procuravam um outro padrinho dizendo: - “Sabe, a sua esposa está muito estranha, chora demasiadamente, só pode ser ela quem o matara para poder ficar com os bens. Essa maneira de chorar nos é muito estranha é preciso vermos bem o que está acontecendo com ela”. – “É verdade” – assim correspondiam-se nas suas conversas enquanto decorria a Missa.
Eu fiquei boquiaberto, com os ouvidos divididos, o da esquerda escutava o padre e o da direita a família que estava em concílio da procura do padrinho daquela morte, que os médicos concluíram que era natural, pois a doença se prolongara por muito tempo e o malogrado nunca se dera conta, estivera simplesmente emprenhado no seu trabalho das minas da África do Sul, e só viera a dar-se por conta que estava doente muito tempo depois. E eu vendo a posição dos médicos e da família, questionava-me: “esta família sabe mais que os médicos? Será que esta morte realmente tem padrinhos? Por que somos assim afinal?”
Ia decorrendo a Missa nas suas partes diversas, o padre incensando o corpo, aspergindo-o com água benta, fazendo orações da última encomendação, o concílio familiar já pensava em procurar um melhor curandeiro que pudesse vir depois de o padre ir-se embora, para já investigar encontrar e denunciar o padrinho daquela morte. O padre terminou a sua Missa, fomos ao cemitério, depositamos o corpo, o enterramos, pusemos flores, as regamos e voltamos a casa onde fizemos as últimas orações, tomamos chá e comemos arroz com feijão onde colocamos piri piri para dar mais sabor e gosto à nossa comida. Depois fomos apresentar as nossas condolências à família enlutada, nos despedimos e fomos embora.
O concílio familiar continuou, chamou o curandeiro. Este, fez os seus ritos, procurou o padrinho da morte. À primeira, parecia não estar a encontrar o padrinho. “Com certeza, a morte era mesmo natural e não tinha padrinho nenhum!” O curandeiro como queria dinheiro e fama de ser bom curandeiro, tinha que manipular, pois, a família queria saber quem era o padrinho daquela trágica morte. Finalmente, o curandeiro ganhou coragem, resolveu manipular e disse: “a sua esposa juntamente com a sua família, sabem dizer algo, fizeram algo aqui, queriam mesmo matá-lo para ganharem seu dinheiro, casa e tudo o que tinha este homem”. A inocente desatou chorando negando fortemente que seria capaz de fazer coisa idêntica, pois amava loucamente aquele homem e sentiria muito a sua ausência. Os familiares porém, que já estavam satisfeitos por saberem quem era o padrinho da morte, replicavam a esposa dizendo que amor sentia pelo seu filho que morrera sem despedir, amava a ele ou a seus bens!? “afinal a morte avisa para dar tempo de despedir-se!!!”
A coitada e inocente, foi escorraçada, humilhada em público, expulsa da casa apelidada feiticeira e ainda mais foi dita: «derramar-se-á muito sangue na tua família em pagamento da morte do nosso filho». Mas porquê? Eu não sei dizer qual é a razão de tudo isto, só sei afirmar o que vi, neste caso e vários outros casos semelhantes, sempre que há morte, não se descansa antes de se encontrar o padrinho, é isto mesmo o que vivemos a no nosso dia após dia. «aqui não se morre, se é matado, a morte tem sempre padrinho». Ela inocente que tanto amava o seu esposo, ganhou um grande troféu «madrinha da morte do seu próprio esposo». Realmente, aqui, não se morre, se é matado!!!
«Então, se não se morre, se é matado, quando é que haverá a morte natural? Será que existe no mundo um homem que seja eterno?» eu não sei ainda responder a estas perguntas, estou a procura de auxílio para responde-las.
Escrito por: Filipe Serafim Mapilele